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O advogado Raul Fonseca Filho chegou hoje (18) em Belém. Antes de ir à Cametá acompanhar o julgamento de quatro acusados de envolvimento no assassinato do advogado Fábio Teles, ele proferirá a palestra "Prerrogativas: criação e funcionamento da Procuradoria Nacional de Defesa das Prerrogativas". Em entrevista, o procurador esclarece um pouco mais acerca das funções da instância da qual é componente.
Natural do Rio de Janeiro, Raul acumula também a experiência de militar e professor. Atua na OAB desde 1998. Foi conselheiro seccional até 2000. Na gestão seguinte, foi vice-presidente seccional, entre 2001 e 2003, além de presidente da Comissão de Defesa das Prerrogativas. Aliás, Raul foi um dos pioneiros na montagem de plantão pelo celular e a fazer escala de serviço e desenvolver algumas estratégias de enfrentamento.
O que a procuradoria representa dentro do sistema OAB?
Na minha avaliação, isso foi um marco na história da Ordem, um divisor de águas, porque defesa das prerrogativas era feito basicamente pelas seccionais de forma isolada, não havia ligações entre elas. Quantas decisões das comissões de prerrogativas e da comissão nacional eram tomadas e não havia efetividade no cumprimento dessas decisões. A comissão nacional passou para a diretoria, mas não tinha nenhum órgão dentro da Ordem encarregado do cumprimento dessas decisões, encarregado da efetividade, que executasse tanto pendências oriundas, que chegassem às seccionais, que chegassem à Brasília como decisão da própria condição do Conselho Nacional, É essa a nossa função: dar efetividade a todas as decisões, a todas as demandas que a Ordem tem hoje com as suas prerrogativas.
Nossa procuradoria é formada por procurador nacional, procurador nacional adjunto e três advogadas contratadas para tratar exclusivamente de defesa das prerrogativas. E o que isso importa? Importa que nós não precisamos nomear advogados que, na maioria nós somos profissionais liberais, temos nossos escritórios e, muitas vezes, havia uma demora na preparação de peças. Não havia condições para sustentação oral no CNJ ou no CMP ou no caso de judicialização que envolvesse questão de prerrogativa de advogado. Não havia essa disponibilidade. Mas hoje, tudo isso nós fazemos. Antes, tudo que passava pela comissão era debatido e isso demandava tempo e perdia o efeito. Justiça tardia não é justiça. E eu digo que defesa da prerrogativa tardia não é defesa da prerrogativa. Essa nova estrutura está permitindo isso. De maio pra cá, nós já tivemos mais de 200 procuradorias, porque nós não demandamos muito pra ficar esperando decisões e o projeto Marcus Vinicius nos concedeu, a mim e ao Vagner (Procurador Nacional) a liberdade nessa nova gestão. Não podemos continuar como nós estamos.
A Procuradoria tem uma reação mais pró-ativa e de prevenção ou reação mais imediata, que era necessário para as próprias comissões?
Nós temos uma ação preventiva e repressiva. Uma coisa caminha com a outra, porque só a necessidade de repressão. Se nós não assumíssemos as posturas preventivas, então o que acontece? Na questão do trânsito: a faixa de pedestre ninguém respeita. Mas se botar um guarda de trânsito, com certeza que as pessoas vão começar a respeitar. Então, com a minha experiência militar, todo o tenente no exército quer ser general. E todo o juiz substituto quer ser desembargador e, se possível, ministro. Todo o procurador substituto quer ser procurador de Justiça. Então, aonde a procuradoria age? Nesse segmento. Os agentes públicos no Brasil sabem da nossa lei, tem consciência dos nossos direitos e, ainda assim, eles infringem o artigo 7° do nosso estatuto. Por quê? Essa é a coisa de impunidade. No momento que nós - quero dizer OAB, estruturar esse sistema nacional de defesa de prerrogativa, colocar pra funcionar a procuradoria nacional junto com as procuradorias regionais e as comissões de defesas das prerrogativas, que tem o papel executivo nas seccionais. No momento que nós conseguirmos fazer essa ligação funcional começar a funcionar, quebrar atualmente esses que nós temos atualmente de ilhas, nós vamos começar a achar respostas efetivas, restando à punição dos agentes públicos e creio que todo mundo tem carreira.
Onde é que existe a separação do papel das comissões, do papel da procuradoria? Onde elas se fundem e onde elas se separam?
A procuradoria terá que ser um braço das comissões e, mesmo com o plano nacional, é preciso esse cuidado para não avançar sobre competências da comissão. E nós temos que ter muito cuidado nisso. É questão política. A comissão nacional funciona desde que foi criada a OAB. Tudo que nós fazemos na procuradoria é em conjunto com a comissão. Aqui na seccional Pará tem uma comissão de prerrogativas e o Jarbas está pensando em estruturar a procuradoria. A procuradoria é executivo, mas a seccional e a comissão também. Quando um juiz ou delegado comete um erro, a comissão está lá presente pra combater. Mas não é o caso da comissão nacional, que faz um papel meio legislativo, meio parlamentar, e é por força de sua formação. Lá, nos está sendo dada uma liberdade, uma condição, mas isso de acordo com a comissão de defesa das prerrogativas. Aqueles casos que nos demanda grandes estudos, grande aprofundamento, por exemplo: um advogado que sofre uma coação qualquer de uma autoridade e chega à representação, está fundamentada, está documentada. Nós temos liberdade já de imediato. E isso não da pra reunir a comissão nacional, que reunimos de dois em dois meses, não tem como gerar dinheiro pra pedir habeas corpus. Então, esse tipo de situação nós entramos imediatamente, mas comunicamos à comissão. Agora mesmo, estamos na luta contra agências reguladoras. Em Brasília, é um inferno. Advogado não tem acesso aos processos das agências. O que é a procuradoria em resumo? É uma tropa de pronta resposta da Ordem, porque defesa das prerrogativas é luta, é guerra, é combate, é todo dia as pessoas tentando tirar, fingir que nós não temos direito elencados em lei e tentando esquecer o artigo 133 do Constituição Federal. Diz que o advogado é dispersado do Estatuto da Justiça e, de todo modo, esqueceram disso.
Aqui no Pará, estamos, infelizmente, atingindo índices muito altos de violência contra advogados, que custa a vida dos advogados. O Conselho Federal, desde o início dos primeiros casos que a própria OAB apresentou, ele tem acompanhado o caso por meio da Comissão de Defesa das Prerrogativas, por meio da própria diretoria e da presidência do Conselho Federal. Qual papel da procuradoria dentro desse cenário que se encontra aqui no Estado?
Na verdade, é o seguinte: nós temos que pensar o que é a OAB. Nós temos o Conselho Federal, nós temos a federação. Então, quando nós atuamos - enquanto procuradoria - nós precisamos ter muito cuidado para o nosso trabalho não ser encarado como caráter de intervenção. Nós temos que ter esse respeito da autonomia da seccional. E essa é uma discussão que nós temos levado muito a sério, de não intervir em algo que não fomos chamados. Pra nós, ter uma atuação específica e direta nas seccionais é muito difícil, até por ser uma estrutura pequena, com dois procuradores e três advogados e que vai aumentar à medida que a demanda aumente. Ainda estamos limitados, até porque nós estamos nos estruturando. A Procuradoria Nacional de Defesa das Prerrogativas e o Sistema Nacional de Defesa das Prerrogativas foi criada pela resolução nº 1, de 03 de fevereiro de 2013, que é composto pela comissão nacional, pela procuradoria e seus congêneres nas seccionais. Isso é um sinal que a nova gestão da Ordem quer resgatar o papel da defesa das prerrogativas e está nos dando condições para isso. E em todos os eventos estamos presentes. A caravana das prerrogativas já esteve no Piauí, Tocantins, e vamos fazer agora aqui em Belém. E essas caravanas são muito importantes. A importância que a OAB está sinalizando para os tribunais, ministérios públicos e nós vamos buscar a criminalização. E é uma diretriz do presidente da Ordem, e nós vamos cumprir isso. E a caravana serve para visitar os tribunais de uma forma muito solidária, mas a nossa mensagem é clara: solidariedade se paga com solidariedade.
Como o senhor avalia essa onda de violência aqui?
Altamente difícil e complicado. Rondônia é um estado do Norte, mas muito próximo ao centro-oeste. É um estado muito oxigenado de vários lugares do país. E lá não tem. A nossa percepção daqui do Pará pode ser destorcida algumas vezes, mas o que eu vejo é que uma estrutura instalada de violência e não vejo grandes esforços pra resolver isso. A investigação deveria passar para a Polícia Federal. Eu não conheço o trabalho da Polícia Civil do Estado. Então, seria leviano da minha parte. Mas se ela está no contexto que as outras polícias civis estão no Brasil: sucateadas, mal treinadas, me parece que não tem condição. Apesar desse julgamento - talvez emblemático de Cametá, que foi preso o mandante e o pistoleiro, e isso é trabalho dela. Mas é um dado positivo em relação à Policia Civil daqui do Pará. O que a gente vê é que o estado do Pará é diferenciado em relação a problemas agrários. E é um problema já antigo. Aqui, nós já tivemos Guerrilha do Araguaia. Já tivemos massacre. E não é que nos outros estados esteja tudo perfeito. No meu estado também, nós tivemos um massacre de sem terras, que morreu muita gente num confronto com a Polícia Militar.
O Pará é um grande estado brasileiro, mas que, infelizmente, não me parece que estar controlando essa situação, especialmente na questão que desrespeito ao meio agrário. A pistolagem é muito forte. É um dado muito feio e eu acredito que uma forma de ajudar - não sei se com exclusividade ou em conjunto - assumir a Polícia Federal, que ela dispõe meios que as policias civis - não só no Pará, não dispõem. No meu estado, por exemplo, é uma dificuldade a Policia Civil trabalhar. Então, talvez pedir não uma intervenção do Estado, mas um esclarecimento. Rondônia é um estado diferente, mas lá morre muito advogado. Nós temos um advogado nosso que foi morto uns anos atrás, um ex-conselheiro da Ordem. Ou seja, não era um advogado desconhecido e, até hoje, não foi esclarecido. Dizem que foi por causa de terra, de boi. Mas a nossa polícia tem poucos meios de esclarecer e, até hoje, estamos sem solução. No que demanda a estruturação no nosso sistema de segurança pública no país inteiro, me parece muito deficiente.
Qual o encaminhamento que o Conselho Federal está dando em relação a essas procuradorias regionais?
O presidente Marcus Vinicius não quer. Há um respeito muito grande pela seccional. Está sendo recomendado pela diretoria da Ordem que as seccionais estruturem suas procuradorias. Já existe a procuradoria do Tocantins nomeada. Estamos esperando para nomear a nossa em Rondônia. Nós estamos com uma promessa do Marcus Vinicius, do Conselho Federal pagar um advogado para ser nosso procurador, pois nós não temos condição de pagar. Prerrogativa tem o bônus e tem o ônus. O defensor da prerrogativa tem que ser bravo, mas nós temos o bônus que é o reconhecimento da nossa categoria. E é isso que impulsiona a gente, o respeito, sempre ser bem recebido principalmente no nosso estado de origem.
O que existe hoje no sentido de prevenir, além da própria caravana?
Como tem pouco tempo que nós estamos atuando, não tem nem seis meses e a demanda é tão forte que não tivemos tempo ainda de entender uma série de situações que nós entendemos importante. Na questão de prevenção, por exemplo, nós temos a ideia de encaminhar às seccionais uma discussão, mas conseguir uma tese pra vincular relacionada à prerrogativa. Não sei se a ética tem, mas prerrogativa não tem. Nas faculdades é o seguinte: meu exemplo é lógico. Que eu sabia do artigo 7 do nosso estatuto. Eu já tinha lido. Mas até eu começar a mexer com prerrogativas em 1998, eu já tinha 8 anos de formado e nunca tinha lido com profundidade. E como eu, boa parte dos advogados faz isso. Desconhecem, não sabem, se intimidam diante do poder. Todo mundo acha que a prerrogativa começa na comissão, mas o primeiro a usar a prerrogativa deve ser o advogado ofendido. Ele tem que tomar a primeira providência. A comissão tem que vim em apoio. Um problema é que boa parte dos nossos professores das faculdades são juízes e promotores. Pouquíssimos são advogados. E o advogado tem que trabalhar pela sobrevivência. Por isso nós temos poucos advogados nas universidades.
Gostaria que o senhor deixasse uma mensagem para os advogados daqui do Estado.
O que eu quero deixar para advocacia paraense é que vai deixar a procuradoria: a obediência ao artigo 7 do nosso estatuto e, se necessário for, ter a necessidade da seccional representar algum agente público nos tribunais superiores, nas corregedorias dos tribunais, nós estaremos firmes para dar todo o apoio necessário. A busca da punição desses agentes tendo como novo tempo de defesa das prerrogativas na OAB. O nosso presidente nacional está empenhado nessa luta. A prova disso é que ele criou o sistema nacional de defesa das prerrogativas e, mais que isso, toda a liberdade de atuação para nós, tanto da procuradoria quanto da comissão nacional. Então é uma mensagem de apoio e de fortalecimento, porque eu entendo que nós temos os agentes públicos, que tem o poder do Estado por trás deles. E nós advogados, temos a nossa constituição, temos nosso estatuto e nós temos a nós mesmos. Então, nós temos que nos unir cada vez mais. E eu espero que a gente consiga levar essa tarefa adiante de estruturar efetivamente o sistema nacional de prerrogativas e que ele renda bons frutos e, tenho certeza, que a nossa ação será pedagógica.
Fotos: Paula Lourinho