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A Ordem dos Advogados do Brasil - Seção Pará, vem manifestar seu repúdio à denúncia oferecida contra o advogado José Vargas Sobrinho Junior e, para além das razões evidenciadas que justificam o trancamento da Ação Penal por intermédio do Habeas Corpus 0804265-16.2021.8.14.0000, ressalta que o julgamento do referido Habeas Corpus constitui um marco contra as reiteradas violações ao devido processo legal e boa fé processual.
O caso que os desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado do Pará estão na iminência de julgar, além de inúmeras violações de prerrogativas da advocacia como a realização de busca e apreensão sem acompanhamento de representante da OAB-PA, caracteriza-se por grave violação ao dever de probidade na produção probatória.
O advogado foi preso preventivamente e posteriormente denunciado, acusado de ter colaborado para o sequestro e homicídio de Cícero José Rodrigues de Souza, candidato a vereador em Redenção/PA. A prisão preventiva e denúncia contra o advogado José Vargas Junior têm como acervo probatório 12 (doze) mensagens de texto e áudio trocadas entre o advogado e seu colega de escritório. Todavia, essas 12 (doze) mensagens foram extraídas e descontextualizadas de um universo de mais de 2 (duas) mil mensagens.
Dentre as mensagens que não foram expostas, havia inúmeras mensagens em que o advogado criticava a inércia da autoridade responsável pelas investigações, questionava o desprezo da autoridade policial por linhas de investigação relevantes e informava seu colega de escritório de que o ora paciente estava comunicando outras autoridades e instituições para que estas passassem a acompanhar e pressionar a autoridade policial pelo esclarecimento do desaparecimento de Cícero José Rodrigues de Souza.
Além disso, ressalta-se que o membro do Ministério Público do Estado do Pará que promove a Ação Penal havia se declarado suspeito para atuar em causas em que estivesse presente a vítima, Cícero José Rodrigues de Souza, tendo em vista que este havia realizado denúncias sobre malversação de recursos públicos da saúde de maneira combativa e a suspeição adveio de animosidade entre o Representante Ministerial e Cícero Rodrigues.
O Ministério Público e a autoridade policial estão dificultando as defesas de terem acesso às provas produzidas no inquérito policial e utilizadas na denúncia a ponto de tanger um descumprimento de decisão de 1º grau, bem como do próprio STF, que em Reclamação Constitucional (RCL 47153/PA) determinou que “seja assegurado ao reclamante e aos seus procuradores amplo acesso a todos elementos de prova já produzidos e documentados nos autos de investigação relacionados à ação penal em curso”.
Além da única prova contra o advogado ter sido 12 mensagens descontextualizadas, referida prova é nula, pois foi captada diretamente do aparelho celular do colega de escritório do paciente, violando a cadeia de custódia e gerando a nulidade de referida prova.
Sobre a inépcia, o renomado jurista Lênio Streck em artigo sobre o caso assim se posicionou:
No caso da prisão do advogado Vargas, a denúncia lhe imputa o crime de homicídio — mas sequer narra o fato (quanto mais um fato típico) — e não diz como a sua conduta se amolda aos crimes que lhe são imputados — ineficiência, infelizmente, comum em muitas peças acusatórias em um processo penal por vezes mais estratégico do que técnico-penal.[1]
O caso posto para os desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado do Pará apreciarem é, de tal maneira, paradigmático para a reafirmação da harmonia democrática que está sendo publicamente acompanhado por dezenas de instituições ao redor do mundo, do qual a OAB-PA tomou a liberdade de evidenciar algumas notas e compartilha o porquê da escolha destas notas em detrimento de outras:
- Faculdade de Direito de Columbia e Fundação Clooney para Justiça (Columbia Law School e Clooney Foundation For Justice): A Faculdade de Direito de Columbia é uma das mais tradicionais e renomadas faculdades de Direito do mundo e juntamente com a Fundação Clooney possui um projeto denominado TrialWatch em que monitora processos penais em todo o mundo, avaliando a justiça e defendendo indivíduos detidos injustamente. O caso do advogado José Vargas Junior é o primeiro caso publicamente acompanhado pelo projeto no Brasil.
- ONU: O Alto Comissariado das Nações Unidas cobrou publicamente as autoridades brasileiras para prestarem esclarecimentos acerca da detenção de José Vargas Junior e anunciou que está acompanhando o caso.
- Parlamento Europeu: A representação máxima da União Europeia, o Parlamento Europeu conjuntamente com o ACNUDH, anunciou publicamente que monitora com preocupação a detenção e criminalização do advogado.
- CCBE (Conselho da Ordem de Advogados da União Europeia), que congrega os conselhos de classe da advocacia dos 45 países que compõe a União Europeia, enviou correspondência para o Presidente Jair Bolsonaro e, igualmente, acompanham a detenção e o processo criminal contra o advogado.
- FrontlineDefenders: Fundação Internacional para a Proteção de Defensores (as) de Direitos Humanos; organização-líder do ProtectDefenders.eu, mecanismo de proteção da União Europeia, criado para proteger defensores e defensoras em risco, acompanha o advogado desde o massacre de Pau D’Arco quando passou a ser vítima de inúmeras ameaças.
- Artigo 19: Organização presente em nove países e uma das organizações internacionais mais relevantes na defesa e promoção do direito à liberdade de expressão e de acesso à informação em todo o mundo. Publicou nota condenando a criminalização do advogado e a impropriedade da produção de provas.
Além disso, Comissão Pastoral da Terra – CPT; Global Witness; Anistia Internacional; Rede Nacional de Advogadas e Advogados Populares – RENAP; Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos – SDDH; Terra de Direitos; Movimento Humanos Direitos – MHuD; Associação Brasileira de Juristas pela Democracia – ABJD; Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra – MST Pará; Geledés Instituto da Mulher Negra; Articulação dos Povos Indígenas no Brasil (APIB); Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ); Justiça Global; Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST); Sociedade Maranhense de Direitos Humanos e inúmeras outras organizações da sociedade civil brasileiras e internacional já manifestaram sua preocupação com a criminalização do advogado e/ou com os arbítrios da denúncia.
Este é o ponto e, com ele, a OAB-PA encerra a presente nota reafirmando seu clamor para que seja trancada a Ação Penal contra o referido advogado, por ser questão de justiça.
Belém, 08 de julho de 2021
Alberto Campos
Presidente da OAB-PA
Cristina Lourenço
Vice-Presidente da OAB-PA
Eduardo Imbiriba
Secretário-Geral da OAB-PA e Presidente da Comissão de Defesa de Direitos e Prerrogativas da OAB-PA
Marcelo Mendanha
Presidente da Subseção da OAB em Redenção