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Dia 18 de maio de 2020 (amanhã), entrará em vigor a Portaria Conjunta do TJE/PA n. 10/2020-GP/VP/CJRMB/CJCI que regulamenta os procedimentos a serem adotados na tramitação dos processos físicos criminais com réus presos cautelarmente e nas audiências por videoconferência das varas criminais e da infância e juventude que possuam réus presos ou adolescentes internados provisoriamente, durante o período de Regime Diferenciado de Trabalho, em razão da pandemia do novo coronavírus.
Por tais razões, a OAB-PA, no intuito de contribuir para o aperfeiçoamento da justiça, tem o dever de manifestar sua preocupação com alguns aspectos importantes estabelecidos no novo instrumento que, se mantidos, apostrofarão frontalmente princípios e regras basilares do direito brasileiro. Destaque-se a possibilidade de realização de audiências de instrução e julgamento por meio virtual, que põem em risco a regra que garante a incomunicabilidade das testemunhas (CPP, 210, par. único), já que em ambiente virtual, Magistrados e Serventuários da Justiça não terão meios de garantir ou impedir que os testigos ou a vítima(quando individualizada) estejam imunes a contatos externos e irregulares ou mesmo que recebam informações orais ou escritas sobre os fatos discutidos no caso penal.
A regra da incomunicabilidade é de fundamental importância ao devido processo legal, sendo que a impossibilidade de ser assegurada, ter-se-á desvirtuada a produção probatória, bem como a própria natureza reconstitutiva do processo penal. A portaria, ao dispor que o defensor terá direito de entrevistar-se prévia e isoladamente com seu assistido/constituinte, silencia quanto a possibilidade de comunicarem-se, reservadamente, no decorrer da audiência de instrução, impedindo que o acusado e seu defensor possam, em conjunto, analisar os fatos apresentados durante o ato processual para que possam direcionar os questionamentos que se seguirão, revelando clarividente ofensa aos princípios do Contraditório e da Ampla Defesa, na medida em que se esvai o núcleo essencial da dialética processual. Também se manifestam como preocupantes as possibilidades alargadas de intimação previstas no instrumento normativo que, aliás, divergem sobremaneira do que está estampado na legislação processual penal.
Ao estabelecer a “intimação por qualquer meio idôneo” indiscriminadamente, além de ferir o que estabelece o Código de Processo Penal acerca da forma adequada de realização deste ato, cria uma enorme insegurança jurídica, impondo ao jurisdicionado uma vulnerabilidade em que não se admite no processo penal, vez que fere a isonomia e a paridade de armas, razão pela qual qualquer intimação, pela própria relevância inconteste do ato, deve ser realizada na forma preconizada pelo Título X, Capítulo II da legislação de regência.
Ademais de tudo isso, remanesce, ainda, uma preocupação relevante: a viabilidade da aplicação de ferramentas eletrônicas no âmbito do judiciário paraense, pois, como já é ressabido, o Estado do Pará possui graves deficiências de cobertura e velocidade dos serviços de internet, o que, por certo, impactará profundamente no acesso e na prestação jurisdicional, sobretudo no interior do Estado, onde esses desníveis são ainda mais graves. Importa destacar, também, o fato de que parte considerável dos profissionais da advocacia, por exemplo, para conseguirem acessar os meios eletrônicos já implantados nos processos virtuais no Estado, dependem, absolutamente, das estruturas fornecidas pela OAB, distribuídas nas mais diversas comarcas. Por óbvio, estas estruturas estão impedidas de funcionarem em razão das restrições sanitárias impostas, alijando, desta feita, uma gama enorme de advogados e advogadas que não gozarão da estrutura adequada para o exercício do seu labor.
É com base nesses pressupostos que a OAB-PA, imbuída do sentimento de contribuir para o aperfeiçoamento da Justiça, sugere que as disposições normativas constantes da Portaria Conjunta n. 10/2020-GP/VP/CJRMB/CJCI não sejam aplicadas às audiências de instrução e julgamento; que sejam resguardadas as regras de intimação pessoal por oficial de justiça, tal qual previsto no Código de Processo Penal, tudo consubstanciado nos argumentos trazidos ao norte, com o singular desígnio de preservação dos princípios da Legalidade, do Contraditório, da Ampla defesa, resguardando incólume, mesmo em momento de excepcionalidade causado pela pandemia, o devido processo legal.