Home / Notícias
DILSON PIMENTEL
Da Redação
O Liberal
Entre 1995 e 2005 a população carcerária do Brasil passou de 148 mil para 361 mil presos, um crescimento de 143,91% em uma década. A taxa anual de crescimento oscilava, até então, entre 10% e 12%. A partir de 2005, a taxa de crescimento anual caiu em torno de 5% a 7% ao ano. Mas, entre dezembro de 2005 e dezembro de 2009, a população carcerária aumentou de 361 mil para 473 mil detentos, um crescimento, em quatro anos, de 31,05%.
Essas informações são do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), do Ministério da Justiça. Segundo o Depen, muitos fatores podem ser atribuídos à desaceleração verificada de 2005 a 2009 nas taxas de pessoas encarceradas. A expansão da aplicação, por parte do poder Judiciário, de medidas e penas alternativas; a realização de mutirões carcerários pelo Conselho Nacional de Justiça; a melhoria no aparato preventivo das corporações policiais e a melhoria das condições sociais da população são fatores significativos na diminuição da taxa. Apesar da redução da taxa anual de encarceramento, apontada pelo Depen, o Brasil ainda apresenta um déficit de aproximadamente 195 mil vagas.
Ao analisar as estatísticas que a entidade recebe mensalmente da Superintendência do Sistema Penitenciário do Pará (Susipe), o presidente da Comissão do Sistema Penal da Ordem dos Advogados do Brasil, seção Pará, Jânio Siqueira, diz que no Pará, infelizmente, não se observa a desejada "redução da população carcerária". Segundo ele, essa população, há algum tempo, está estabilizada em torno de 10 mil a 11 mil presos em todo o Estado, incluindo-se, aí, não somente os detidos no Sistema Penitenciário, mas aqueles que se encontram custodiados em delegacias da Polícia Civil.
De qualquer maneira, diz o advogado, essa "estabilidade" no número de presos não deixa de ser algo positivo, até mesmo como "prêmio" à atual administração da Susipe, que tem se preocupado em "abrir" novas vagas no "sistema", apesar da crônica carência de recursos. Como exemplo dessa postura, ele cita a construção da Central de Triagem Metropolitana, que tende a "desafogar" as carceragens das delegacias da Região Metropolitana com relação àqueles presos provisórios que ali "apodreciam", esperando "transferência" para uma das casas penais. "Sem dúvida, isso foi algo de positivo feito pela Susipe, que temos o dever de reconhecer. Igualmente, temos de meritório a ‘reconstrução’ do presídio feminino, cujas obras irão desativar aqueles contêineres onde ficavam ‘depositadas’ as presidiárias, como se fosse uma espécie de ‘lixo humano’", diz Jânio Siqueira, representante da OAB-Pa no Conselho Penitenciário do Estado.
Ele afirma que a população carcerária somente sofrerá redução quando diminuir a quantidade de presos provisórios, que hoje representam cerca de 60% do universo de detentos. Nesse ranking, o Pará perde apenas, e proporcionalmente, para os Estados de Espírito Santo e Minas Gerais. "E, insisto, essa redução no número de presos provisórios só ocorrerá aqui no nosso Estado quando os juízes da Justiça paraense perderem um pouco da ‘cultura prisional’ de que ainda estão possuídos, convencendo-se de que a prisão deve ser a exceção, e não a regra, tal qual já deixou claro o STF (Supremo Tribunal Federal) em repetidas decisões", diz o advogado.
Mas os presos que ainda estão encarcerados são, de fato, os que cometeram os delitos mais graves? "Não podemos afirmar, peremptoriamente, se, de fato, os que se acham presos são efetivamente os mais perigosos. Mas, inegavelmente, há inúmeros presos provisórios que fazem jus à liberdade, até mesmo pela natureza do crime cometido", explica Jânio Siqueira. E acrescenta: "O que temos visto na prática são os juízes praticamente ‘homologarem’ os pedidos de prisão feitos por delegados e promotores sem uma análise mais acurada quanto à real necessidade daquela prisão".
Brasil tem a 3ª maior marca do mundo
O Brasil possui a terceira maior população carcerária do mundo. Com 494.598 presos, fica atrás, apenas, dos Estados Unidos e da China. Divulgada mês passado, a informação é do coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário (DMF) do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Luciano Losekann. O juiz criticou a forma como a Justiça Criminal é tratada dentro do Judiciário brasileiro, "como o primo pobre da jurisdição". "É uma área negligenciada, sobretudo pela Justiça Estadual. Os tribunais precisam planejar de forma mais efetiva o funcionamento da Justiça Criminal", afirmou, em notícia divulgada pela Agência CNJ de Notícias.
Nos últimos cinco anos, o número de pessoas presas no Brasil aumentou 37%, o que representa 133.196 pessoas a mais nas penitenciárias. Losekann chamou atenção para o elevado número de presos provisórios existentes no País, 44% no total, segundo dados do Ministério da Justiça. Isso significa que 219.274 pessoas aguardam na prisão o julgamento de seus processos. "O uso excessivo da prisão provisória no Brasil como uma espécie de antecipação da pena é uma realidade que nos preocupa. Os juízes precisam ser mais criteriosos no uso da prisão provisória", afirmou o coordenador do DMF, ainda de acordo com aquela agência.
A superlotação nas unidades prisionais foi outro ponto destacado pelo juiz. A taxa de ocupação dos presídios brasileiros é de 1,65 preso por vaga, o que deixa o País atrás apenas da Bolívia, cuja taxa é de 1,66. "A situação nos presídios levou o Brasil a ser denunciado em organismos internacionais. Falta uma política penitenciária séria", disse Losekann. São Paulo é o Estado com maior quantidade de encarcerados, seguido de Minas Gerais, Paraná, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro. Diante da insuficiência de vagas nas unidades prisionais, 57.195 pessoas estão cumprindo pena em delegacias, que não contam com infraestrutura adequada. Uma das ações prioritárias estabelecidas este ano para o Judiciário pelos 91 presidentes de tribunais é a de reduzir a zero o número de presos em delegacias. Ao traçar o perfil dos detentos brasileiros, Losekann destacou o tráfico de drogas responde por 22% dos crimes cometidos pelos presidiários. Entre as mulheres esse índice sobre para 60%.
Preso é gente e precisa de comida, educação e trabalho, diz advogado
Ao analisar essa questão, Jânio Siqueira faz a seguinte análise. "Comecemos pelo óbvio: preso é gente. E gente precisa de alimento, educação e trabalho. No Brasil, porém, a realidade às vezes consegue revogar até o óbvio. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) constatou aquilo que a OAB vem denunciando anos a fio: que, no Brasil, os presídios não são ‘casas correcionais’ ressocializadoras, mas simples depósitos de seres humanos. Os mutirões carcerários patrocinados pelo CNJ constataram um déficit de mais de 170 mil vagas no sistema prisional brasileiro, que cresce numa média de 7% a 8% ao ano - isto sem falar nos milhares de mandados de prisão que ainda não foram cumpridos", acrescenta.
Jânio Siqueira diz que a OAB no Pará, a partir da atual administração, tem demonstrado uma preocupação permanente com a questão penitenciária a ponto de criar uma Comissão voltada exclusivamente para o tema. E essa Comissão do Sistema Penal, afirma, tem tido atuação permanente junto à Susipe, fazendo inspeções ocasionais aos presídios e delegacias de polícia. "A construção da Central de Triagem Metroplitana, sem dúvida, foi fruto das denúncias e ‘cobranças’ por parte da OAB-PA, que nunca tolerou presos provisórios amontoados nas delegacias à espera de vagas nos Presídios. Constatamos, nas nossas visitas, presos em condições degradantes, sem direito à alimentação, banho de sol, sem condições de higiene, saúde, em verdadeiros depósitos de ‘restos humanos’, em condições degradantes, em celas imundas até mesmo para animais. E, assim temos atuado, permanentemente, junto ao sistema penitenciário, exigindo e denunciando urgentes e saneadores providências com relação à população carcerária do nosso Estado", diz.
Mutirão carcerário reavaliará processos da região metropolitana
Há poucos dias, foi realizado, no Pará, o mutirão carcerário. Juízes, promotores e defensores públicos auxiliados por técnicos desses órgãos e da Superintendência do Sistema Penal receberam dezenas de processos de sentenciados da Região Metropolitana de Belém. Cada processo será reexaminado pelos juízes e demais operadores do direito designados para cumprir a missão, prevista para durar trinta dias. A realização do mutirão foi determinada através de resoluções baixadas pelo Tribunal de Justiça e Conselho Nacional de Justiça. O objetivo é identificar os problemas e apontar soluções para agilização dos procedimentos judiciais, que envolve um universo de 11 mil presos, em todo o Estado.
A operacionalização dos trabalhos está sendo realizada em quatro comarcas polos, instalados desde quarta-feira, 15 de setembro, tendo à frente juízes enviados do CNJ: em Belém, está o juiz Vinicius Paz Leão (TJRS); em Santarém, a juíza Sanáli da Cruz Zluhan (TJRS); em Marabá, o juiz Sério Willian Domingues Teixeira (TJRR); e, em Castanhal, o juiz Renato Magalhães Marques (TJDF). Cada magistrado trouxe um técnico para auxiliá-lo.
Os primeiros blocos de processos de presos sentenciados recebidos no pólo da Região Metropolitana de Belém vieram das comarcas de Abaetetuba, Mocajuba e Cametá, ainda segundo a assessoria de imprensa do Tribunal de Justiça do Estado. Órgãos do Sistema de Justiça do Estado, tais como Ministério Público do Estado, Defensoria Pública, Superintendência do Sistema Penal e Ordem dos Advogados/Seção Pará, participam do mutirão, aberto no último dia 15.
Fonte: O Liberal (04/10/2010) - Caderno Policia
Foto: Yan Fernandes - ASCOM OAB