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#IGUALDADE
Começa amanhã, 27, na capital paraense, o maior evento que discutirá Direitos Humanos no Brasil, realizado pelo Conselho Federal da OAB - VI Conferência Interncaional dos Direitos Humanos. O evento, que reunirá personalidade de renome nacional e internacional da área jurídica, especialistas e militantes dos direitos humanos do país e do mundo, trará para o debate cases de violções desses direitos, bem como se propõe a apresentar uma plataforma de açõs para enfrentamento dessa violações, a fim de promover a efetiva igualdade de direitos.
O presidente da OAB-PA, Jarbas Vasconcelos, conversou com a assessoria de comunicação da instituição sobre o conferência. Ele falou sobre a importância da realização de um evento como este na Amazônia e fez uma análise do tema escolhido “Efetivação dos Direitos da Igualdade”. Confira a entrevista:
O que levou o Pará a ser escolhido para sediar a VI Conferência Internacional dos Direitos Humanos da OAB
Jarbas - De cada dez violações dos direitos humanos registradas no Brasil, pelo menos oito ocorrem dentro das fronteiras da Amazônia, a maior parte dentro do Pará. Eu me refiro a crimes contra o meio ambiente, crimes contra advogados, contra as mulheres, contra as crianças, conflitos de terras, agrários, conflitos socioambientais, conflitos em torno das construções das hidrelétricas, dos grandes projetos, dos grandes empreendimentos.
Não poderia haver no Brasil, neste momento, outro palco melhor para fazer a maior Conferência dos Direitos Humanos da história da nossa instituição que não fosse a Amazônia e o Pará, na metrópole da Amazônia, Belém.
Na região amazônica, quais as principais violações dos direitos humanos e maiores dificuldades para combatê-las. E de que forma a OAB desenvolve um trabalho para assegurar a defesa desses direitos?
Jarbas - A maior dificuldade que nós encontramos na Amazônia para combater a violação dos direitos humanos é a insuficiência do sistema de justiça. Nós temos forças de seguranças publicas que precisam ser pelo menos triplicadas. Nós temos um poder judiciário que não consegue ter capacidade de atender sequer a demanda posta nas capitais, quanto mais nos interiores. Na Amazônia, os grandes conflitos estão no interior, onde é o motor do nosso desenvolvimento econômico. Então, aqui no Pará, nós não temos juízes para atender a todas as comarcas. Temos uma das piores relações “juiz/população” do Brasil. Nós sempre nos situamos entre o último ou penúltimo lugar. Evidente que o poder judiciário que não consegue assegurar os cumprimentos dos contratos, assegurar os cumprimentos dos direitos, não consegue aplicar a lei penal de forma célere e imediata, de modo a condenar os culpados, é um poder judiciário que falha na dimensão civil dos contratos e também na dimensão penal de combate à violência. Portanto, pela insuficiência do poder judiciário, nós temos um poder judiciário que funciona estimulando a violência e violação dos direitos humanos.
O que a OAB tem feito?
Jarbas - A OAB tem lutado junto ao poder judiciário, com juízes, promotores, defensores e a sociedade, para que o nosso sistema de justiça e de segurança pública melhore. E nós temos tido melhoras, porém, as melhoras ainda são insuficientes. Lamentavelmente, nós precisávamos ter uma forma de recrutamento da magistratura que pudesse com que ela fixasse no local. Mas isso implica em mexer no ordenamento jurídico e na Constituição Federal. E nós não conseguimos estabelecer um consenso a esse patamar que permita que nos concursos públicos da magistratura, ao ser aprovado, o magistrado permaneça obrigatoriamente por um período de tempo fixado no estado em que foi aprovado. Nós aqui temos uma realidade em que nós fazemos concursos para 100 vagas na magistratura, mas um ano depois mais de 50% desses magistrados foi para outro estado, outro ente da federação. Com isso, o estado do Pará vive um déficit crônico de justiça, de falta de delegados, promotores, defensores e juízes. Este é um fator que estimula a violação dos direitos humanos. É um desafio que está posto, que exige uma mudança não só na legislação do estado do Pará, mas, sobretudo, na legislação nacional. E nós esperamos que essa VI Conferência ajude a debater este problema que atinge à toda a Amazônia, particularmente o estado do Pará.
A programação da conferência está repleta de fóruns, audiência e palestras que abordarão diversos temas. O que o presidente poderia destacar?
Jarbas - Esta conferência parte da concepção de que nos 25 anos da Constituição, nós avançamos muito nos direitos de liberdade. E precisamos avançar nos próximos 25 anos nos direitos de igualdade, sem parar de avançar também nos direitos de liberdade. Então, esta conferência vai discutir todas as temáticas dos direitos humanos a partir dessa consideração. Para nossa região, vamos discutir problemas como da água. Nós estamos na maior bacia de água doce do mundo, e São Paulo vive uma seca. E nós queremos debater essa matéria. Está se falando da transposição do rio amazonas, levar o rio amazonas para o sul. E nós queremos perguntar se essa é a forma jurídica, política e federativa de explorar mais um dos nossos recursos, talvez o mais importante, que é a água. Quanto será revertido em benefício do crescimento econômico, social e educacional do homem da Amazônia com a exploração da água, que hoje é motivo de tráfico internacional para levar para os países do oriente médio? Será que também vamos começar a traficar água para levar para São Paulo? A que custo?
Evidente que esse é um tema importante, como é importante o tema aqui do trabalho digno, do trabalho descente, do combate ao trabalho infantil, do combate ao trabalho escravo, de garantir o direito das nossas mulheres de poderem viver sem o assédio da exploração sexual, do tráfico. A conferência vai discutir a questão carcerária, a questão dramática que está posta neste momento, apoiada, segundo pesquisas, pela maioria da população, que é a redução da maioridade penal, mas que a OAB é radicalmente contra a redução da maioridade penal, que é um discurso populista, reacionário, de direita, que não leva a nenhuma consequência a não ser ao “voto fácil” a esses políticos populistas que procuram manipular a opinião pública, anunciando medidas desumanas, violentas contra as nossas crianças, que já estão condenadas e têm suas vidas arrastadas pelo crime. A maioria das nossas crianças, hoje, não tem educação e são alvos fáceis, soldados do tráfico e são os ocupantes preferenciais das nossas penitenciárias.
De que forma a sociedade civil, o Estado e as entidades podem trabalhar conjuntamente para aprimorar cada vez mais o debate sobre a efetivação dos direitos de igualdades, especialmente aqui na Amazônia?
Jarbas - A luta pelos direitos humanos é uma luta por civilização, é uma luta por desenvolvimento e crescimento da pessoa humana. Toda mudança começa a partir de nós mesmos, de dentro pra fora, do individuo para a sociedade, e se contamina pelo corpo social. A luta por solidariedade, por uma sociedade que se preocupa com o outro, que valoriza o outro, que acolhe o outro, que respeita as diferenças, que respeita as opções de sexo, que respeita as opções religiosas. A luta por uma sociedade tolerante, uma sociedade que tenha pavor e repugnância ao ódio e à violência. Portanto, a luta por uma sociedade desenvolvida, cultural e politicamente. Essa é a luta por direitos humanos. Nada é mais importante do que a luta por direitos humanos. Há um preconceito contra a luta pelos dos direitos humanos. Porém, o que tenciona o nosso crescimento como homens e como sociedade é a luta por direitos, por direitos de liberdade, por direitos de igualdade, por direitos de nós todos sermos iguais e sermos objetos do respeito de todos, nos reconhecer como titulares de direito, como titulares da atenção do Estado, a atenção da sociedade, a atenção do outro. Essa sociedade fraterna, justa, igualitária, que respeita a vida e valoriza o crescimento humano é o objeto maior que nós vamos debater nessa conferência. Nós pensamos que só debater questões tão importantes para a vida de todos nós, para o futuro de todos nós, em si, já é um acontecimento que certamente marcará - e espero que marque mesmo - a consciência de cada paraense e cada um de nós que quer um mundo melhor.
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Entrevista: Sheila Faro
Foto: Eugênio Novaes