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LICENÇA DE SERVIDOR PÚBLICO PARA CUMPRIR MANDATO EM ENTIDADE DA CLASSE
Edilson Oliveira e Silva*
A competência para regulamentar as profissões e instituir os respectivos conselhos é privativa da União; logo, somente a União define o que seja entidade fiscalizadora da profissão.
Mas por ser o Brasil uma república federativa, a competência para instituir o regime jurídico único dos servidores pertence a cada entidade - União, Estados, DF e Municípios -, todas autônomas (CF/88, art. 18).
Pela lei n°. 8.112/1990, a União, ao instituir o seu Regime Jurídico Único do Servidor Civil, dispôs no caput do art. 92:
“É assegurado ao servidor o direito a licença para o desempenho de mandato em confederação, federação, associação de classe de âmbito nacional, sindicato representativo da categoria, ou entidade fiscalizadora da profissão, com a remuneração do cargo efetivo, observado o disposto na alínea “c” do inciso VIII do art. 102 desta lei”. (grifo nosso)
Nesse dispositivo ela impôs reconhecer que entidade fiscalizadora da profissão não se confunde com as demais ali enumeradas, - todas com representatividade e objetivos próprios -. A confederação, a federação e os sindicatos constituem espécies de organismos sindicais regulados pela CLT, que tipifica a confederação e a Federação como entidades sindicais de grau superior, - a primeira, compõe-se de federações (no mínimo três), e a segunda, de sindicatos (no mínimo cinco)- ; por sua vez, o sindicato é composto por empregados, autônomos ou empregadores.
A associação de classe não se confunde com o sindicato; este é regulado pela CLT, e aquela ação pela lei civil.
No que tange à entidade fiscalizadora da profissão, ela é criada e regulada por lei federal específica; dela é exemplo, a OAB, hoje regulada pela Lei 8.906, de 04 de julho de 1994 (Estatuto da Advocacia e Ordem dos Advogados do Brasil).
No Estado do Pará o RJU dos Servidores Civis foi instituído pela lei n°. 5.810 de 24.01.1994; sobre a matéria, dispõe no art. 95, in vebis:
“É assegurado ao servidor o direito à LICENÇA PARA DESEMPENHO DE MANDATO em confederação, federação, sindicato da categoria, associação de classe de âmbito local e/ou nacional, sem prejuízo da remuneração do cargo efetivo.
(- --)
Parágrafo 2°: “A licença terá a duração igual à do mandato, podendo ser prorrogada, no caso de reeleição, e por uma única vez”.(grifo nosso)
Pela simples leitura deste artigo comprova-se que diferentemente do que ocorre na União, no Estado do Pará o servidor público não possui direito a licença para desempenhar mandato em entidade fiscalizadora da profissão.
Na União, com as alterações introduzidas pela lei n° 9.527 de 10.12.1997 (uma das alterações: a licença passou a ser sem remuneração) e pela a lei no. 11.094/2005, o art. 92 da Lei 8.112/1990, passou a ter a seguinte redação:
“Art. 92. É assegurado ao servidor o direito a LICENÇA SEM REMUNRAÇÃO para o desempenho de mandato em confederação, federação, associação de classe de âmbito nacional, sindicato representativo da categoria ou entidade fiscalizadora da profissão ou, ainda, para participar de gerência ou administração em sociedade cooperativa constituída por servidores públicos para prestar serviços a seus membros, observado o disposto na alínea c do inciso VIII do art. 102 desta Lei, conforme disposto em regulamento e observados os seguintes limites:
I – para entidades com até 5.000 associados, um servidor;
II – para entidades com 5.001 a 30.000 associados, dois servidores;
III – para entidades com mais de 30.000 associados, três servidores.
Par. 1o. Somente poderão ser licenciados servidores eleitos para cargos de direção ou representação nas entidades, desde que cadastradas no Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado.[1]
Par. 2o. A licença terá duração igual à do mandato, podendo ser prorrogada, no caso de reeleição, e por uma única vez”. (grifo nosso)
No âmbito federal é certo que o servidor tem direito a licença para desempenhar mandato em entidade fiscalizadora da profissão, desde que a entidade seja cadastrada no MARE, hoje, Ministério de Orçamento e Gestão.[2]
No Estado do Pará este direito não existe! A lei 5.810/1994 excluiu a entidade fiscalizadora da profissão; limitou o direito a licença para desempenho de mandato somente em entidades representativas de servidor público. Portanto, é vedado à Administração estadual alongar este direito para alcançar entidade fiscalizadora da profissão. E como a lei n. 5.810/1994 não cogitou sequer dessa entidade, é vedado ao Administrador do Estado do Pará, por ferir o princípio da legalidade, conceder licença remunerada ao servidor público para desempenhar mandato em entidade tais como CRECI, OAB, CRA, etc. Pois, em qualquer hipótese, a concessão de licença remunerada do servidor público civil do Estado do Pará somente atenderá ao princípio constitucional da legalidade se estiver prevista em preceito expresso da lei 5.810/1994; - neste aspecto a atividade do agente público é vinculada, haja vista que a Administração Pública só pode fazer aquilo que a lei permite -.
Por outro lado, assim como os direitos assegurados ao servidor público civil do Estado do Pará não serão obrigatoriamente os mesmos assegurados pelo RJU ou pelo Estatuto de todo e qualquer Estado brasileiro a seus servidores, qualquer direito assegurado em RJU ou Estatuto de servidor de outro qualquer Estado, não terá de ser também assegurado pelo RJU do servidor civil do Estado do Pará (Lei 5.810/1994); e isto ocorre exatamente pelo fato de existirem Estados que adotaram integralmente a redação da lei n. 8112/1990, e estenderam aos seus servidores civis todos os direitos reconhecidos, aos seus, pela União, e Estados que dela divergem em parte, não assegurando nos seus RJU ou Estatutos, todos os direitos existentes no RJU da União, como é o caso do Pará; e assim por diante.
É impossível pretender-se direito cuja existência prescinda de previsão legal. Não há direito sem que a lei o institua. Por isto, para assegurar aos magistrados licença para dirigir as associações de classe, a lei complementar n. 60, de 06 de outubro de 1989, acrescentou ao art. 73, da lei complementar n. 35, de 14.03.1979 (LOMAN), o inciso III, para dispor:
“Art. 73. Conceder-se-á afastamento:
(......)
III- para exercer a presidência de associação de classe”.
Por todo o exposto, não será correto alguém afirmar, de modo generalizado, a legalidade da concessão de licença a servidor público estadual para desempenhar mandato em entidade fiscalizadora da profissão, tendo por base apenas jurisprudência dos Tribunais, inclusive do STF, sem indicar e especificar o caso concreto e a lei que tenha sido aplicada, haja vista não haver uniformidade legal sobre a matéria, e portanto, existir tratamento diferenciado tanto no âmbito dos Estados entre si, quanto entre a União e Estados. O que é decorrência da autonomia política que, na República Federativa do Brasil, estas entidades possuem, e que torna imprescindível a leitura do regime jurídico único do Estado em que tal licença haja sido concedida.
Mas é possível afirmar-se, com segurança, que no Pará, o Regime Jurídico Único do Servidor Civil (lei 5.810/1994) não dá ao servidor estadual direito a licença remunerada para desempenhar mandato em entidade fiscalizadora da profissão. A sua concessão viola o princípio constitucional da legalidade. Sobre isto não há controvérsia!
* Advogado –Professor de Direito Constitucional.
Dez.2011.
[1] A MPV n. 1.795 de 01.01.1999 extinguiu este Ministério (MARE) e o Decreto n. 2.923, de 01.01.1999 transfere a área de competência do MARA para o Ministério de Orçamento e Gestão.
[2] Porque se o servidor permanecer constando na folha de pagamento, a entidade na qual ele desempenhará o mandato ressarcirá mensalmente os valores pagos pela União; se retirado da folha de pagamento, a entidade em tela será responsável pela remuneração do servidor e respectivas contribuições previdenciárias.