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Os casais homossexuais têm os mesmos direitos e deveres que a legislação brasileira estabelece para os casais heterossexuais. E a decisão unânime de quinta-feira (5) do Supremo Tribunal Federal (STF) - dez votos a favor e nenhum contra (o ministro Dias Toffoli declarou-se impedido de votar) - abre caminho para que o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo seja permitido e as uniões homoafetivas passem a ser tratadas como um novo tipo de família.
O julgamento do Supremo torna praticamente automáticos os direitos que hoje são obtidos com dificuldades na Justiça e põe fim à discriminação legal dos homossexuais. “O reconhecimento, portanto, pelo tribunal, hoje (quinta-feira, 05), desses direitos, responde a um grupo de pessoas que durante longo tempo foram humilhadas, cujos direitos foram ignorados, cuja dignidade foi ofendida, cuja identidade foi denegada e cuja liberdade foi oprimida”, afirmou a ministra Ellen Gracie.
Pela decisão do STF, os homossexuais passam a ter reconhecido o direito de receber pensão alimentícia, ter acesso à herança de seu companheiro em caso de morte e podem ser incluídos como dependentes nos planos de saúde. Poderão adotar filhos e registrá-los em seus nomes, dentre outros direitos.
As uniões homoafetivas serão colocadas, com a decisão do tribunal, ao lado dos três tipos de família já reconhecidos pela Constituição: a família convencional formada com o casamento, a família decorrente da união estável e a família formada, por exemplo, pela mãe solteira e seus filhos. E, como entidade familiar, as uniões de pessoas do mesmo sexo passam a merecer a mesma proteção do Estado.
FACILIDADE
A decisão do STF deve simplificar a extensão desses direitos. Por ser uma decisão em duas ações diretas de inconstitucionalidade - uma de autoria do governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB), e outra pela vice-procuradora-geral da República, Deborah Duprat -, o entendimento do STF deve ser seguido por todos os tribunais do País. Os casais homossexuais estarão submetidos às mesmas obrigações e cautelas impostas para os casais heterossexuais. Por exemplo: para ter direito à pensão por morte, terá de comprovar que mantinha com o companheiro que morreu uma união em regime estável.
Os casos de pensão e partilha de bens
Pela legislação atual e por decisões de alguns tribunais, as uniões de pessoas de mesmo sexo eram tratadas como uma sociedade de fato, como se fosse um negócio. Assim, em caso de separação, não havia direito a pensão, por exemplo. E a partilha de bens era feita com a medida do esforço de cada um para a formação do patrimônio.
Parte da razão para o não reconhecimento das uniões homoafetivas tinha base na Constituição (artigo 226) e no Código Civil (artigo 1723). Os dois textos reconheciam que a união estável ocorre entre o homem e a mulher. Os ministros do STF entenderam que a legislação não deveria ser interpretada de forma a proibir a união de pessoas do mesmo sexo.
Impedir o acesso a direitos por parte dos casais gays com base na interpretação de que somente os casais heterossexuais estariam protegidos, conforme os ministros, seria violar princípios constitucionais, como da igualdade e da não discriminação. Além disso, até hoje, o Congresso não aprovou uma legislação específica para regular a união entre pessoas do mesmo sexo. Na ausência dessa lei, afirmaram os ministros, o STF teria de garantir a essa minoria direitos considerados fundamentais.
“A solução, de qualquer sorte, independe do legislador, porque (os direitos das uniões homoafetivas) decorrem dos direitos fundamentais”, acrescentou o ministro Marco Aurélio Mello.
Pará tem 1.700 casais homoafetivos
A aprovação da união homoafetiva pelo Supremo Tribunal Federal (STF) vai provocar um “boom” de legalização dessas uniões no Pará, segundo, o coordenador do Movimento LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais) do Estado, Roberto (Beto) Paes. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), existem cerca de 1.700 casais homoafetivos no Estado e 60 mil em todo o país.
“É um marco na conquista do direito à igualdade”, afirma Beto. Segundo ele, uma das principais consequências da decisão do STF é a garantia e preservação do patrimônio dos casais formados por pessoas que muitas vezes foram abandonadas pela família por preconceito, mas quando um dos parceiros morre os parentes voltam para se apropriar dos bens adquiridos por eles com o respaldo da lei.
O administrador Paulo Lessa, 32, depois de três anos vivendo junto com o promotor de eventos Erick Campelo, 28, teve sua situação legalizada por meio de um casamento coletivo inédito, promovido pelo Grupo de Combate à Homofobia da Defensoria Pública do Estado do Pará, no ano passado, junto com outros 14 casais. Ele lembra do caso da cantora Cássia Eller que foi expulsa de casa pelo pai que queria adotar a filha adotiva da filha depois da morte da cantora, “só para se apropriar dos bens dela”. Fundador da ong Apolo Grupo pela Livre Orientação Sexual, ele diz que quer “andar de mãos dadas e beijar o meu companheiro. Eu pago o mesmo imposto que os heterossexuais”
Samuel Sardinha, da Coordenadoria pela Livre Orientação Sexual da Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos, diz que acompanha na Justiça casos de pessoas que viveram 30 anos juntas, discriminadas pelas famílias, e que depois da morte de um dos parceiros, foram ameaçadas de perder todos os bens constituídos pelo casal.
A luta do Movimento LGBT não é só contra a discriminação, mas também contra a homofobia. Só no ano passado, segundo levantamento do Grupo Gay da Bahia, dirigido pelo antropólogo Luiz Mott, 260 homossexuais foram mortos no ano passado, no Brasil, dez deles no Pará, por crimes que tiveram como motivação a discriminação e o preconceito.
O Movimento LGBT do Pará vai promover uma manifestação na Praça da República, em Belém, na manhã do próximo dia 15, de onde partirão em caravana para participar, no dia 17, do Dia Nacional de Combate à Homofobia, com manifestações no Congresso Nacional, e no dia seguinte de uma Marcha Nacional Contra a Homofobia, em Brasília. (Diário do Pará/AE).