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O Conselheiro Jefferson Kravchychyn, representante da OAB no Conselho Nacional de Justiça – CNJ e coordenador do Grupo de Trabalho, responsável pela elaboração de estudos e propostas sobre o regime de cobrança de custas no Poder Judiciário em geral, acompanhado pelo também Conselheiro do CNJ, Desembargador Milton Nobre e Felipe Loc, Conselheiro e representante do Ministério Público, conversou no final da tarde de ontem com os advogados para colher sugestões sobre a matéria.
O Conselheiro veio a Belém cumprir um cronograma de visitas que estão sendo realizadas em várias Unidades Federativas do país, como parte de um estudo sobre a matéria.
Reunido com os advogados no Plenário Aldebaro Klautau, Kravchychyn iniciou sua fala afirmando que “o CNJ não é a panaceia curadora dos males do poder judiciário” e destacou a importância de ousar para mudar o sistema judicial em óbito. “Nós termos que ter a coragem de fazer a desconstrução do sistema judicial brasileiro e após isso, iniciarmos um processo de reconstrução”.
Segundo Kravchychyn os problemas no judiciário brasileiro são inúmeros: o Brasil tem mais faculdades de direito do que o resto do mundo. “É um país de litigantes, guerreiros, treinado para a guerra e que acham que o poder judiciário pode resolver todos os problemas que existem”, disse o Conselheiro. O Brasil, de acordo com as informações de Kravchychyn, é o país onde 16 mil juízes julgaram 26 milhões de processo. Onde tramitam 86 milhões de processo e onde os estado com maior índice de desenvolvimento humano - IDH, tem as custas processuais mais baratas, ou menos caras.
Kravchychyn criticou o acesso à justiça. “O acesso é um funil, onde você entra e não sai mais”. Esse problema, para Jefferson, é consequência da grande distorção da utilização da Lei 1.060 - de 05 de Fevereiro de 1950, que trata das normas para a concessão de assistência judiciária aos necessitados judiciária. Onde o que era para ser exceção hoje é a regra geral. “Nós precisamos ter a coragem de mexer nessa lei. Precisamos dar a cara à tapa e parar de brincarmos que estamos fazendo justiça”.
Essa origem do problema, que para o conselheiro começa na 1.060, tornou as custas mais caras. Além disso, nunca se fez uma legislação concorrente em cada Unidade federativa para atender o sistema de custas brasileiro – prevista na Constituição. O legislador ficou inerte e os tribunais acossados – após a Constituição de 88, quando aumentou o volume de processo, iniciaram a criação de fundos a trabalhar em cima das custas e das taxas para instrumentalizar o sistema, a fim de devolver ao jurisdicionado aquilo que ele pede.
“Se tirarmos as custas do poder judiciário ele quebra. Nós temos que manter essa arrecadação e aumentá-lo”, disse Kravichychyn. Para ele, a forma simples de fazermos isso é diminuir as custas em primeiro grau, facilitar o acesso a justiça, ampliar a base da arrecadação e acabar com a farra dos recursos. “É necessário melhorar o acesso à justiça, trazer mais renda para os tribunais, para entrarmos nos tribunais e percebermos que o ar condicionado está funcionando e acabarmos com as portas ordinárias que existem nos tribunais daqui”, finalizou Jefferson referindo-se as portas rotatórias que descriminalizam os advogados na hora do acesso aos fóruns.
Reinventar foi o termo usado por Felipe Loc como a saída para resolver o problema da “justiça falida em nosso país”. A verdade para Loc é que não há justiça no país. “O país que tem 91 tribunais e um sistema maluco que não funciona e que dificulta o acesso à justiça”. Segundo Loc, dos processos que tramitam hoje mais de 50% são do Estado.
Para ele, a solução dos problemas, mesmo correndo o risco de receber críticas, na verdade nós precisamos de um sistema onde o Estado fosse verdadeiramente único. “Não é possível ter o estado litigando, empacando o desenvolvimento do país”.
O Estado brigando contra a União, a União brigando com o município, gera um desgaste do sistema, que não consegue pagar as custas porque é inaceitável o Estado pagar para o Estado.
Mas para isso precisamos ouvir a sociedade. “Estamos aqui para isso. Ouvir a todos, sentir o problema in loco, para que possamos mudar a cultura do país, para tornar o acesso à justiça efetivo, para que a justiça seja séria e que tenha resultado”, finalizou Felipe dizendo ainda que essa “é uma luta coletiva e que o CNJ quer ser o instrumento para viabilizar essa luta coletiva para uma sociedade mais justa, melhor e acessível”.
O último a se manifestar foi o Conselheiro Milton Nobre. Ex-presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Pará e ex-presidente da OAB-PA, Milton afirmou que o CNJ tem planos para o judiciário brasileiro. “Nós plantamos a semente das custas e o nosso ponto de apoio é a advocacia”. Para ele, somente um trabalho conjunto poderá trazer bons frutos para melhorar o acesso à justiça e fortalecer o poder judiciário brasileiro.
A questão das custas
Considerando que o Brasil é uma Federação formada por diversos Estados que possuem autonomia constitucional na definição de suas organizações judiciárias, a cobrança de custas no país tornou-se algo muito complexo.
As Unidades da Federação (UFs) convivem atualmente com legislações sobre custas judiciais que apresentam grandes discrepâncias, sobretudo, na fixação de valores. Além disso, não existem normas ou padrões nacionais que estabeleçam princípios lógicos e uniformes para a fixação desses valores nas UFs. Nesse contexto, o grande prejudicado é o usuário dos serviços judiciais, que poderia contar com maior transparência, racionalidade e organicidade na cobrança de custas judiciais. O que não acontece na maioria dos casos.
Por conta desses problemas o acesso à justiça, em muitos estados da Federação é algo praticamente impraticável. O próprio custo do acesso ao judiciário é, sem sombra de dúvida, um dos principais entraves à universalização da prestação jurisdicional. A questão passou então a ser objeto de grande preocupação social.
A pesquisa do CNJ
No ano passado, o CNJ iniciou a pesquisa, para atender à deliberação do Plenário do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que forneceu o quadro sobre a cobrança de custas judiciais no Brasil, com foco na Justiça Estadual. A pesquisa analisou os seguintes pontos principais: o perfil da cobrança de custas na Justiça Estadual na primeira e segunda instâncias (a partir de um comparativo dos valores praticados nas unidades federativas); a previsão legal e as controvérsias conceituais referentes ao tema; correlações dos valores de custas encontrados nas UFs com alguns indicadores socioeconômicos; a importância das custas para o financiamento dos fundos de reaparelhamento dos tribunais de justiça; e o panorama internacional da cobrança de custas (com foco na Europa).
Como não existem normas ou padrões nacionais que estabeleçam princípios lógicos e uniformes para a fixação das custas nas UFs, o grande prejudicado é o usuário dos serviços judiciais, que poderia contar com maior transparência, racionalidade e organicidade na cobrança de custas judiciais.
Resultados encontrados no Brasil
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Quando se realiza o agrupamento dos valores médios de custas no âmbito das cinco regiões geográficas do Brasil, observa-se que os valores médios mais altos são encontrados na região Nordeste e que os valores mais baixos são encontrados na região Sul.
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Unidades da federação relativamente mais ricas e desenvolvidas em comparação com as demais praticam valores de custas mais baixos. Estados relativamente mais pobres, ao contrário, impõem custas e taxas judiciais mais altas.
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Observou-se que o Distrito Federal, Santa Catarina e São Paulo são as três unidades da federação que possuem os índices de desenvolvimento humano (IDHs) mais elevados e, coincidentemente, são as três UFs que adotam os valores médios mais baixos para as custas. Já dentre as cinco unidades da federação com Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) mais baixo, três estados – Piauí, Maranhão e Paraíba – estão entre os que praticam valores médios mais altos para as custas.
Conclusões
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A despeito dos programas de assistência judiciária gratuita e das possibilidades de concessão de justiça gratuita, não há como negar que o recolhimento de custas, mesmo por aqueles que podem suportá-las, constitui fator de inibição à atuação dos litigantes perante a justiça. Há que se pensar em modelos de custas no Brasil que não cheguem a constituir óbices ao acesso à justiça.
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Em linhas gerais, pode-se dizer que a política de fixação de custas na justiça estadual brasileira: Carece de uniformidade no que concerne a conceitos, modelos e critérios; Apresenta grandes discrepâncias entre os valores cobrados pelas diversas unidades da federação; As legislações sobre custas são freqüentemente pouco transparentes; A cobrança de custas em alguns casos se revela bastante regressiva; Distorções entre os valores de custas praticados entre a 1ª e a 2ª instância
Proposições
Uma revisão e uniformização dos modelos de cobrança existentes se fazem urgentes e necessárias. Tendo em vista o atual elevado grau de disparidades observado nas vinte e sete unidades da federação, o Conselho Nacional de Justiça poderia atuar no que concerne no estabelecimento de linhas gerais de modo a orientar que os Estados passem a adotar modelos de cobrança de custas mais razoáveis e facilitando o acesso à justiça. Desse modo, de forma propositiva, poder-se ia pensar em duas frentes de atuação prioritárias: elaboração e encaminhamento de anteprojeto de lei ao Congresso Nacional e elaboração de Resolução ou Recomendação contendo minuta de projetos de leis para os Tribunais de Justiça e Assembleias Legislativas no sentido de alterar as legislações estaduais sobre custas judiciais, com vistas à diminuição das custas onde os valores são altos e incompatíveis com a realidade social de cada UF.