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Organizações da sociedade civil, voluntários e parceiros no atendimento à população migrante e refugiada na cidade de Belém, Pará, vêm por meio desta manifestar seu repúdio à certificação da Fundação Papa Leão XXIII (FUNPAPA) com selo MigraCidades 2020. O “MigraCidades: aprimorando a governança migratória no Brasil” é um processo de certificação das políticas migratórias locais, fruto de parceria entre a Organização Internacional para as Migrações (OIM), a agência da ONU para as migrações, e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
O repúdio se dá pelo histórico de omissão e descaso da FUNPAPA para com a população migrante e refugiada em Belém – a cidade brasileira que concentra o maior número de mortes entre os indígenas migrantes e refugiados da etnia Warao. Como é comprovado no levantamento do Ministério Público Federal (MPF)1, até o dia 28 de julho de 2020, foram registradas 83 mortes de indígenas Warao no Brasil, sendo 26 delas - ou seja, 31% - só na cidade de Belém; 14 dessas mortes ocorreram no ano de 2020 - que, na ocasião da pesquisa, ainda estava no sétimo mês. Boa Vista (Roraima), mesmo sendo área de fronteira terrestre e com número superior de migrantes e refugiados, registrava 16 mortes. As mortes causadas por COVID-19 somam 10 casos entre os Warao. Deste quantitativo, 4 delas foram em Belém.
Espaços de acolhimento precarizados e inúmeros relatos de violência institucional marcam a gestão da FUNPAPA no acompanhamento de migrantes e refugiados na capital paraense. Outra situação delicada refere-se à ausência de diálogo com a sociedade civil e o próprio respeito à Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre a necessidade de consulta prévia para garantir o protagonismo dos povos originários na condução das políticas de atenção aos indígenas no Brasil. Há cartas escritas pelos próprios indígenas relatando situações vivenciadas no espaço de acolhimento, bem como reportagens que denunciam a precaridade do local.
O relatório de diagnóstico do MigraCidades referente à Belém cita iniciativas que sequer existem na prática, a exemplo das iniciativas de acesso à educação pela gestão municipal e de acesso ao mercado de trabalho. Isso nos mostra que a OIM e seus critérios de certificação desconsidera o agravamento da situação dramática no espaço de acolhimento gerenciado pela FUNPAPA, além de instituir tal reconhecimento de forma unilateral, desconsiderando a escuta e participação dos próprios sujeitos de direitos do processo.
Mais do que apenas reconhecer que existe ações pontuais, assimilatórias e colonialistas na condução do atendimento de migrantes e refugiados em Belém é preciso avaliar qualitativamente essas ações e sua capacidade de tornar o processo transparente, participativo e respeitoso às especificidades socioculturais dos sujeitos envolvidos. A certificação do município de Belém, em nome da FUNPAPA, é um ato de desrespeito para com os migrantes e refugiados que vivem em condição de vulnerabilidade social na cidade, para com os indígenas que não têm seus direitos efetivados e para com as gestões e instituições sérias que, de fato, têm compromisso político com o atendimento da população migrante e refugiada. Além disso, não há em Belém uma política migratória, de modo que não se justifique a certificação da OIM.
Sociedade de Defesa dos Direitos Sexuais na Amazônia- SODIREITOS
Comissão de Relações Internacionais OAB-PA
Comissão de Combate ao Trabalho Forçado da OAB-PA