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A desconsideração da pessoa jurídica e os seus reflexos na Ordem Tributária - José Augusto Delgado

image0021. ASPECTOS GERAIS. AS PESSOAS NATURAL E JURÍDICA NO CÓDIGO CIVIL DE 2002. AS TEORIAS SOBRE O SURGIMENTO DAS PESSOAS JURÍDICAS.

Há de se partir, segundo o nosso entendimento, do que o nosso ordenamento jurídico doutrinário entende por pessoa jurídica e por pessoa natural, o estudo referente à origem da entidade ‘desconsideração da pessoa jurídica’ e sobre a sua evolução conceitual.

Seguindo essa diretriz, lembramos ser relevante invocar, primeiramente, a disciplina que o Código Civil de 2002 impõe às pessoas naturais e jurídicas.

Sintetizamos essa regulação, no tocante às pessoas naturais, na apresentação do quadro a seguir elaborado:

a) a atribuição da capacidade de direitos e deveres na ordem civil é outorgada a qualquer ser humano (art 1º do NCC1);

b) o nascimento com vida é marca inicial da caracterização da personalidade civil (primeira parte do art. 2º do NCC);

c) é assegurado ao nascituro ser sujeito de direito desde o momento da concepção (segunda parte do art. 2º do NCC);

d) os menores de dezesseis anos que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem discernimento para a prática desses atos; os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade são absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil (art. 3º do NCC);

e) os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos, os ébrios habituais; os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido; os excepcionais sem desenvolvimento mental completo e os pródigos são considerados, de modo relativo, incapazes para a prática de certos atos, ou à maneira de exercer (art. 4º do NCC);

f) legislação especial definirá a capacidade dos índios (art. 5º do NCC em combinação com a Lei n. 6.001, de 19.12.73);

g) a pessoa física só fica habilitada a praticar, sem representação ou assistência, todos os atos da vida civil quando completar dezoito anos (art. 5º do NCC);

h) a incapacidade relativa cessará para os menores quando:

h.1 – por instrumento público, independentemente de homologação judicial, os pais, ou de um deles na falta do outro, houver concessão em tal sentido (art. 5º, inciso I, do NCC);

h.2 – contraírem casamento válido (art. 5º, inciso II, do NCC);

h.3 – colarem grau em curso de ensino superior regularmente autorizado a funcionar (art. 5º, inciso IV do NCC);

h.4 – assumirem e exercerem emprego público efetivo (art. 5º, inciso III do NCC);

h.5 – com dezesseis anos completos, com economia própria, fundarem estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego;

i) a pessoa natural tem sua existência reconhecida até a hora da sua morte (art. 6º, parte inicial, do NCC);

j) a morte da pessoa natural pode ser presumida, quanto aos ausentes, nos casos em que a lei autoriza a abertura de sucessão definitiva (art. 6º do NCC);

k) a morte presumida da pessoa natural pode ser declarada, sem decretação de ausência, em duas situações:

k.1 – se for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida (art. 7, I, NCC);

k.2 – se alguém, desaparecido em campanha ou feito prisioneiro, não for encontrado até dois após o término da guerra (art. 7º, II);

l) a sentença, em caso de declaração de morte presumida, deve fixar a data da sua ocorrência (parágrafo único, do art. 7º, NCC);

m) serão considerados como simultaneamente mortos, quando dois indivíduos falecerem na mesma ocasião, sem que se possa averiguar se algum dos comorientes precedeu aos outros (art. 8º do NCC).

Esse é o principal disciplinamento das pessoas naturais em nosso Código Civil. A seguir o Código preocupa-se em dispor sobre os DIREITOS DA PERSONALIDADE e sobre a ausência, encerrando o ciclo legal sobre tais pessoas.

No referente às pessoas jurídicas, o Código Civil de 2002 estabelece as regras seguintes:

a) as pessoas jurídicas são classificadas em duas categorias: as de direito público, interno (União, Estados, Distrito Federal, Territórios, Municípios, autarquias e demais entidades de caráter público criadas por lei) ou externo (Estados estrangeiros e todas as pessoas que forem regidas pelo direito internacional público), e de direito privado ( as associações; as sociedades, as fundações ) (art. 40 a 44 do NCC);

b) as pessoas jurídicas de direito público, a que se tenha dado estrutura de direito privado, regem-se, no que couber, quanto ao seu funcionamento, pelas normas deste Código, salvo disposição em sentido contrário (parágrafo único do art. 41 do NCC);

c) as pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis por atos dos seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros, ressalvado direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo (art. 43 do NCC);

d) a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado começa com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo, averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato constitutivo (art. 45 do NCC);

e) é de três anos (prazo decadencial) o prazo para se anular a  constituição das pessoas jurídicas de direito privado, por defeito do ato respectivo, contado o prazo da publicação de sua inscrição no registro (art. 45, parágrafo único do NCC);

f) o registro da pessoa jurídica é ato formal que deverá conter:

I - a denominação, os fins, a sede, o tempo de duração e o fundo social, quando houver;

II - o nome e a individualização dos fundadores ou instituidores, e dos diretores;

III - o modo por que se administra e representa, ativa e passivamente, judicial e extrajudicialmente;

IV - se o ato constitutivo é reformável no tocante à administração, e de que modo;

V - se os membros respondem, ou não, subsidiariamente, pelas obrigações sociais;

VI - as condições de extinção da pessoa jurídica e o destino do seu patrimônio, nesse caso; (art. 46);

g) os atos dos administradores obrigam a pessoa jurídica, desde que exercidos nos limites de seus poderes definidos no ato constitutivo (art. 47 do NCC);

h) se a pessoa jurídica tiver administração coletiva, as decisões se tomarão pela maioria de votos dos presentes, salvo se o ato constitutivo dispuser de modo diverso (art. 48 do NCC);

i) é, também de três anos (decadência) o prazo que concede o direito de anular as decisões a que se refere este artigo, quando violarem a lei ou estatuto, ou forem eivadas de erro, dolo, simulação ou fraude (art. 49 do NCC);

j) no caso de a administração da pessoa jurídica vier a faltar, o juiz, a requerimento de qualquer interessado, nomear-lhe-á administrador provisório (art. 49 do NCC);

k) a pessoa jurídica pode ser desconsiderada, em caso de seu uso abusivo, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, situação em que pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica (desconsideração da pessoa jurídica – art. 50 do NCC);

l) nos casos de dissolução da pessoa jurídica ou cassada a autorização para seu funcionamento, ela subsistirá para os fins de liquidação, até que esta se conclua (art. 51 do NCC);

m) as pessoas jurídicas denominadas de associações são as que se constituem para fins não econômicos (art. 53 do NCC);

n) o estatuto das associações, sob pena de nulidade, deverá conter:

I - a denominação, os fins e a sede da associação;

II - os requisitos para a admissão, demissão e exclusão dos associados;

III - os direitos e deveres dos associados;

IV - as fontes de recursos para sua manutenção;

V - o modo de constituição e funcionamento dos órgãos deliberativos e administrativos;

VI - as condições para a alteração das disposições estatutárias e para a dissolução;

o) os associados devem ter iguais direitos, mas o estatuto poderá instituir categorias com vantagens especiais (art. 55 do NCC)), sendo que a qualidade de associado é intransmissível, se o estatuto não dispuser o contrário (art. 56 do NCC);

p ) se o associado for titular de quota ou fração ideal do patrimônio da associação, a transferência daquela não importará, de per si, na atribuição da qualidade de associado ao adquirente ou ao herdeiro, salvo disposição diversa do estatuto (art. 56 do NCC);

q) a exclusão do associado só é admissível havendo justa causa, obedecido o disposto no estatuto; sendo este omisso, poderá também ocorrer se for reconhecida a existência de motivos graves, em deliberação fundamentada, pela maioria absoluta dos presentes à assembléia geral especialmente convocada para esse fim (art. 57 do NCC);

r) nenhum associado poderá ser impedido de exercer direito ou função que lhe tenha sido legitimamente conferido, a não ser nos casos e pela forma previstos na lei ou no estatuto (58 do NCC);

s) é da competência privativa da assembléia geral: I - eleger os administradores; II - destituir os administradores; III - aprovar as contas; IV - alterar o estatuto (art. 59 do NCC);

t) as deliberações a que se referem os incisos II e IV do artigo 60 só poderão ser tomadas pelo voto concorde de dois terços dos presentes à assembléia especialmente convocada para esse fim, não podendo ela deliberar, em primeira convocação, sem a maioria absoluta dos associados, ou com menos de um terço nas convocações seguintes (art. 59, parágrafo único, do NCC);

u) dissolvida a associação, o remanescente do seu patrimônio líquido, depois de deduzidas, se for o caso, as quotas ou frações ideais referidas no parágrafo único do art. 56, será destinado à entidade de fins não econômicos designada no estatuto, ou, omisso este, por deliberação dos associados, à instituição municipal, estadual ou federal, de fins idênticos ou semelhantes (art. 61 do NCC), sendo que por cláusula do estatuto ou, no seu silêncio, por deliberação dos associados, podem estes, antes da destinação do remanescente referida neste artigo, receber em restituição, atualizado o respectivo valor, as contribuições que tiverem prestado ao patrimônio da associação (art. 61, parágrafo primeiro);

v) não existindo no Município, no Estado, no Distrito Federal ou no Território, em que a associação tiver sede, instituição nas condições indicadas neste artigo, o que remanescer do seu patrimônio se devolverá à Fazenda do Estado, do Distrito Federal ou da União.

As fundações de direito privado são criados por escritura pública ou testamento, pelo seu instituidor, que determinará dotação especial de bens livres, especificando o fim a que se destina, e declarando, se quiser, a maneira de administrá-la (art. 62 do NCC), só podendo ser constituída para fins religiosos, morais, culturais ou de assistência.

A elas se aplicam a disciplina seguinte:

a) quando insuficientes para constituir a fundação, os bens a ela destinados serão, se de outro modo não dispuser o instituidor, incorporados em outra fundação que se proponha a fim igual ou semelhante (art. 63 do NCC);

b) quando constituída uma fundação por negócio jurídico entre vivos, o instituidor é obrigado a transferir-lhe a propriedade, ou outro direito real, sobre os bens dotados, e, se não o fizer, serão registrados, em nome dela, por mandado judicial (art. 64 do NCC);

c) aqueles a quem o instituidor cometer a aplicação do patrimônio, em tendo ciência do encargo, formularão logo, de acordo com as suas bases (art. 62), o estatuto da fundação projetada, submetendo-o, em seguida, à aprovação da autoridade competente, com recurso ao juiz (art. 65 do NCC), passando essa incumbência ao Ministério Público se o estatuto não for elaborado no prazo assinado pelo instituidor, ou, não havendo prazo, em cento e oitenta dias, a incumbência caberá ao Ministério Público (art. 65, parágrafo único, do NCC);

d) o Ministério Público do Estado onde estão situadas as fundações velará pelo seu funcionamento,sendo que: I) se funcionarem no Distrito Federal, ou em Território, caberá o encargo ao Ministério Público Federal; II) se estenderem a atividade por mais de um Estado, caberá o encargo, em cada um deles, ao respectivo Ministério Público (art. 66 do NCC);

e) é necessário para que se possa alterar o  estatuto da fundação que a reforma: I - seja deliberada por dois terços dos competentes para gerir e representar a fundação; II - não contrarie ou desvirtue o fim desta; III - seja aprovada pelo órgão do Ministério Público, e, caso este a denegue, poderá o juiz supri-la, a requerimento do interessado (art. 67 do NCC);

f) quando a alteração não houver sido aprovada por votação unânime, os administradores da fundação, ao submeterem o estatuto ao órgão do Ministério Público, requererão que se dê ciência à minoria vencida para impugná-la, se quiser, em dez dias (art. 68 do NCC);

g) tornando-se ilícita, impossível ou inútil a finalidade a que visa a fundação, ou vencido o prazo de sua existência, o órgão do Ministério Público, ou qualquer interessado, lhe promoverá a extinção, incorporando-se o seu patrimônio, salvo disposição em contrário no ato constitutivo, ou no estatuto, em outra fundação, designada pelo juiz, que se proponha a fim igual ou semelhante (art. 69 do NCC).

As pessoas naturais e jurídicas exercem os seus direitos e cumprem as suas obrigações, no campo dos negócios jurídicos (unilaterais e bilaterais), de modo normal, envolvidos pelos ditames de ordem geral que acima foram, resumidamente, apresentados.

Em se tratando de obrigação de direito tributário, as pessoas naturais e jurídicas são contribuintes e responsáveis desde que estejam direta ou indiretamente envolvidas com o fato gerador do tributo, pouco importando a sua regular ou irregular capacidade presencial no mundo jurídico. Obrigam-se de acordo com as normas de Direito Tributário que não afastam o dever do recolhimento do tributo quando a ação de origem tributária é praticada por incapaz ou pessoa jurídica irregularmente constituída.

Tratando-se especificamente da pessoa jurídica, ocorre que, em situações anormais previstas no art. 50 do Código Civil de 2002 , a pessoa jurídica pode ser desconsiderada no referente ao cumprimento de suas obrigações, assumindo o seu lugar, independentemente da vontade das partes, qualquer pessoa natural que a integre e que tenha agido, em nome da pessoa jurídica, com abuso de poder ou desvio da função exercida.

Esse fenômeno é denominado pela doutrina de desconsideração da pessoa jurídica e que passa a ser o centro das nossas atenções, após o estudo preliminar acima apresentado.

Antes de enfrentarmos a origem e a evolução conceitual da denominada “desconsideração da pessoa jurídica” no campo do Direito, convém que se faça o registro de que a doutrina continua a discutir qual a teoria, entre as que já foram criadas, que deve ser aplicada para definir pessoa jurídica.

Heleno Torres, em sua magnífica obra “Direito Tributário e Direito Privado”, São Paulo: RT 2003, p. 436, lembra que, basicamente, quatro teorias existem tentando explicar, cientificamente, o que deve ser entendido por pessoa jurídica. Essas teorias são:

a) a da ficção;

b) a da equiparação;

c) a orgânica ou da realidade objetiva; e

d) a da realidade das instituições jurídicas.

Com base nos ensinamentos de Heleno Torres, ob. cit., p. 457, afirmamos:

a) segundo a teoria da ficção, a pessoa jurídica “seria algo irreal, portanto, imaginária, desprovida de objetividade existencial”;

b) a teoria da equiparação defende que a pessoa jurídica não tem personalidade própria, surgindo em razão de “certas massas de bens, certos patrimônios equiparados, no seu tratamento, às pessoas naturais”;

c) a teoria orgânica, ou da realidade objetiva, tem seu fundamento assentado em um “critério mais racional, considerando que pode haver, sim, em paralelo às pessoas físicas, sujeitos que, apesar de não serem constituídos pelo direito são reconhecidos por este, declarando-os como existentes, para os fins de atribuir-lhes personalidade jurídica, porquanto reconheça que estas possam fazer emanar vontade própria”;

d) a teoria da realidade das instituições jurídicas defende que o “direito pode criar as suas próprias instituições e entes personificados”.

A última teoria recebe a adesão de Heleno Torres e de grande número de juristas.

Postas as considerações acima, passamos ao exame da origem e da evolução do conceito dessa entidade denominada de “desconsideração da pessoa jurídica”.

2. – DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA. ORIGEM E EVOLUÇÃO CONCEITUAL.

Os doutrinadores informam que os primeiros sinais do surgimento da teoria da desconsideração da pessoa jurídica podem ser encontrados no direito da Antigüidade. Nesta fase das relações negociais praticadas pelos seres humanos, a cultura que vigorava era voltada para a necessidade de ser cumprida a obrigação assumida. O descumprimento de um ajuste contratual era tido como um ato atentatório aos direitos da cidadania, que redundava a sua consumação em fazer com que o inadimplente sofresse a pena de ser reduzido à condição de coisa, isto é, passava ao estado de escravo.

O devedor inadimplente, transformado em escravo, perdia o direito de casar, de promover qualquer ação em juízo e de adquirir bens.

A conseqüência desse fenômeno fazia nascer um direito para o credor: o de receber o escravo (até então cidadão devedor) como pagamento da dívida e, por ser coisa, podia vendê-lo.

Havia, portanto, uma posição do direito voltada para garantir o cumprimento das obrigações decorrentes dos contratos firmados, mesmo que sacrificando-se, caso fosse necessário, o “status” de cidadão, que, por ter sido considerado devedor, o homem perdia esse direito.

Esse cenário perdurou durante muitos anos. Só começou a sofrer modificações quando mecanismos jurídicos foram criados para proteger a dignidade humana, assegurando, por outros meios, que o cumprimento das obrigações ficasse restrito à constrição, apenas, dos bens do devedor.

A pessoa jurídica surgiu nesse contexto com as características de pessoa de direito privado que já foram acentuadas. No âmbito do seu desenvolvimento, a pessoa do sócio passou a ser examinada quanto aos limites da responsabilidade assumida em face dos negócios jurídicos bilaterais por aquela confirmados.

Aos sócios das pessoas jurídicas de direito privado foram atribuídas, dependendo da forma de direito escolhida, responsabilidades de várias categorias: solidária, subsidiária, limitada ao capital realizado, limitada ao capital subscrito da entidade, penal, administrativa e tributária.

Essas espécies de responsabilidade não resolveram, contudo, as situações decorrentes de atos de administração praticados pelos sócios, na gerência da pessoa jurídica,  com abuso de poder, fraude e simulação.

Em conseqüência, abriu-se espaço para o surgimento da teoria da desconsideração da pessoa jurídica, passando a responsabilidade, em tais situações, a ser atribuída, integralmente, ao sócio.

Aponta-se o final do século XIX como tendo sido o momento em que nasceu a teoria da desconsideração da pessoa jurídica. Esse entendimento é o manifestado, entre outros, por João Celso Neto (“Desconsideração da Pessoa Jurídica – Conceito e Considerações”, artigo publicado no site: http://jus.com.br, acessado em 23 de junho de 2005), nos termos seguintes:

“Trata-se de uma teoria surgida na Inglaterra. A primeira aplicação de que se tem registro foi ainda no século XIX (1897), pela justiça inglesa, quando um empresário constituiu uma company, atendendo aos requisitos para estar legalmente constituída (sete sócios), ficando ele com vinte mil ações e os demais seis – todos de sua família – cada qual com uma única ação. A sociedade logo sem seguida se revelou insolvente, com um ativo insuficiente para satisfazer as obrigações por ela contraídas, nada sobrando para os credores. O liquidante afirmou que a atividade da company era, na verdade, do empresário, que usara daquele artifício para limitar sua responsabilidade pessoal”.

O mencionado autor indica que colheu essas informações sobre a origem do instituto da obra “Curso de Direito Comercial”, da autoria de Rubens Requião, 1º volume, 18a. edição, Editora Saraiva, São Paulo, 1988, pp 283/284.

Por outro ângulo, Maria Lúcia Bressane Cruz, em artigo intitulado “Desconsideração da Pessoa Jurídica”, publicado no site: http://www.kpluscosmo.com.br, informa que a teoria em destaque “teve origem na jurisprudência norte-americana, lá denominada disregard of leal entity ou lifting the corporate veil, expressões que, traduzidas para o vernáculo, significam, respectivamente, desconsideração da personalidade jurídica ou o levantamento do véu da personalidade jurídica”.

Osmar Vieira da Silva, Doutorando da PUC e Coordenador do Curso de Direito da UNIFIL – Centro Universitário Filadélfia, em Londrina, em obra que tenho como clássica sobre o assunto, denominada “Desconsideração da Personalidade Jurídica – Aspectos Processuais”, editada pela Renovar, 2002, pp. 95 e 96, enfatiza sobre a origem histórica da entidade em exame:

“A doutrina da desconsideração da personalidade jurídica desenvolveu-se e foi amplamente difundida na common law, principalmente no Estados Unidos da América. Entretanto, a maioria dos doutrinadores acredita que essa doutrina teve sua origem na Inglaterra, no célebre caso Salomon v. Salomon & Co. Ltd., julgado pela House of Lords – última instância em 1897.

Trata-se do caso de um comerciante de couros e calçados, Aaron Salomon, que fundou, em 1892, a Salamon & Co. Ltd. Tendo como sócios fundadores ele mesmo, sua mulher, sua filha e seus quatro filhos. A sociedade foi constituída com 20.007 ações, sendo que a mulher e os cinco filhos tornaram-se proprietários de uma ação cada um, e as restantes 20.001 foram atribuídos a Aaron Salomon, da quais 20.000 foram integralizadas com a transferência para a sociedade, do fundo de comércio que Aaron já possuía, como detentor único , a título individual.

Aparentemente, de acordo com as narrativas dos fatos existentes em várias obras que tratam do assunto, o preço da transferência desse fundo seria superior ao valor das ações subscritas: pela diferença, Aaron Salomon, era ainda credor da Salomon & Co. Ltd., com garantia real em seu favor constituída. Com a sociedade, entretanto, vindo a entrar em insolvência e a ser dissolvida, estabeleceu-se o litígio judicial entre o próprio Aaron Salomon e ela. Tanto a High Court quanto, em grau de recurso, a Court of Appeal deram ganho de causa à sociedade, condenando Aaron Salomon a pagar-lhe certa soma em dinheiro, ressaltando as decisões de que a sociedade seria apenas um outro nome para designar o próprio Aaron Salomon.

A High Court acreditava ser um estratagema de que Aaron se serviu para ter lucro de uma atividade econômica sem os riscos e a responsabilidade pelas dívidas. A sociedade seria um representante (agent) de Aaron Salomon e teria direito, como todo representante, a obter do representado a soma necessária à satisfação dos débitos contraídos no interesse do representado”.

Após essas linhas gerais sobre a origem histórica da desconsideração da pessoa jurídica, passamos a analisar a sua natureza jurídica e o seu conceito.

Não tem sido fácil o caminho percorrido pela doutrina para fixar a natureza jurídica e o conceito da “desconsideração da pessoa jurídica”.

Luciano Amaro, em “Desconsideração da Pessoa Jurídica no Código de Defesa do Consumidor”, p. 74, considera que ela é uma “....uma técnica casuística (e, portanto, de construção pretoriana) de solução de desvios de função da pessoa jurídica....”.

Para Domingos Afonso Krieger Filho, em “Aspectos da Desconsideração da Personalidade Societária na Lei do Consumidor”, p. 21, “a desconsideração da pessoa jurídica significa tornar ineficaz, para o caso concreto, a personificação societária, atribuindo-se ao sócio ou sociedade condutas que, se não fosse a superação, seriam imputadas à sociedade ou ao sócio respectivamente. Afasta a regra geral não por inexistir determinação legal, mas porque a subsunção do concreto ao abstrato, previsto em lei, resultaria indesejável ou pernicioso aos olhos da sociedade”.

José Carlos Fortes, ao examinar o tema em artigo de sua autoria publicado no site http://www.fortesadvogados.com.br, assinala com muita propriedade:

“A aplicação da desconsideração da pessoa jurídica deve ser motivada por meios das seguintes situações: a) utilização de forma abusiva da pessoa jurídica, com a intenção de escapar da obrigação legal ou contratual, ou mesmo fraudar terceiros credores; b) evitar a violação de normas de direitos societários; e c) impedir que a pessoa física pratique atos em proveito próprio utilizando a pessoa jurídica”.

Acrescenta: “É bom observar que o simples fato do credor não conseguir receber seu crédito não implica necessariamente na possibilidade da desconsideração da pessoa jurídica Tem que ficar devidamente comprovado a questão da má-fé ou atos enquadrados dentro dos pontos citados. É fundamental analisar com cuidado cada caso, haja vista a importância de se proteger os direitos da personalidade jurídica, como forma de que ela possa contribuir e atender ao fim para o qual foi criada e cumpra a sua função econômica-social, gerando emprego e renda, sem contudo, se distanciar da preocupação de que esta proteção à personalidade jurídica não venha a ser utilizada como escudo ou obstáculo ao pagamento do credor”.

Encerrando esse ciclo relativo às origens e ao conceito da desconsideração da pessoa jurídica, invocamos os ensinamentos de Heleno Torres sobre o tema. O renomado jurista, após identificar que a desconsideração da pessoa jurídica da sociedade pode funcionar como sanção específica (“quando aplicada para atribuir aos sócios regime jurídico que, não fosse o uso indevido ou abusivo da sociedade, a eles já seria aplicável) ou como instrumento subsidiário à aplicação daquel’outras sanções (administrativas ou penais) (“hipótese em que se presta como modo de agir visando a alcançar diretamente os sócios, com aplicação daquelas outras modalidades sancionadoras”), passa a examinar os efeitos dessas duas funções. Em síntese, prega o referido autor:

a) a teoria da desconsideração da pessoa jurídica tem duas funções: uma de natureza substantiva; outra de natureza instrumental;

b) a função substantiva é utilizada diretamente como meio sancionatório; a função instrumental visa desconstituir “atos e negócios jurídicos, quando serve de meio para alcançar diretamente aos sócios, visando a aplicar-lhes sanções de ordem administrativa ou penal, ou mesmo atribuir-lhes o cumprimento de ordem judicial, com responsabilidade patrimonial e pessoal em todos os casos”.

A seguir, explica Heleno Torres, ob. cit., p. 465:

“Para uma precisa qualificação dos seus limites e possibilidades, mister demarcarmos suas particularidades. Na função substantiva, o dolo precisa ficar evidenciado, pelo intuito manifesto de causar prejuízo a terceiro mediante o uso da forma ou tipo societário, para que se possa qualificar o desvio de finalidade ou a confusão patrimonial entre bens dos sócios e bens da pessoa jurídica como algo que permita justificar sua superação. Na função instrumental, como a desconsideração da personalidade jurídica da sociedade não o é, per si, uma sanção, ela somente poderá sr aplicada em face de fundadas suspeitas de cometimento de ilícitos típicos ou atípicos, encobertos pelo tipo societário, os quais deverão servir de motivo para a decisão, com direito ao contraditório e ampla defesa, como meio para ulterior aplicação de sanções aos ilícitos descobertos”.

O conceito da desconsideração da pessoa jurídica foi estudado, em profundidade, por Osmar Vieira da Silva, ob. cit., pp. 83 e segs, e outros autores. Apoiado em tais ensinamentos, apresentamos, a seguir, as formulações que já foram concebidas pela doutrina:

a) Na doutrina estrangeira ela é conhecida pelas designações seguintes:

- Direito inglês e americano: disregard of legal entity; disregard of corporate entity, lifting the corporate veil, piercing the corporate veil, cfacking open the corporate shell.

- Direito italiano: superamento della personalitá giuridica.

- Direito  alemão: Durchgriff der juristichen Person.

- Direito argentino: teoria de la penetración o desestimación de la personalidad.

- Direito francês: mise à l’écart de la personnalité morale.

b) Para Marçal Justen Filho, em “Desconsideração da personalidade societária no Direito  brasileiro”, obra editada pela Revista dos Tribunais, São Paulo, em 1987, pp.55-57, citada por Osmar Vieira da Silva, obra já referida, pp.88e 89, a conceituação da desconsideração da pessoa jurídica deve ser vista com base nos cinco elementos seguintes:

“a) existência de uma ou mais sociedades personificadas - ....”;

b) ignorância dos efeitos da personificação - ....”;

c) “ignorância de tais efeitos para o caso concreto - .....”;

d) “manutenção da validade de atos jurídicos - .....”;

e) “finalidade de evitar o perecimento de um interesse (função) - ...”.

Com base na conceituação acima firmada, a doutrina e a jurisprudência têm afirmado que pode ser aplicada a teoria da desconsideração da pessoa jurídica, entre outros casos, nas situações seguintes:

a) quando o sócio, utilizando-se do nome da pessoa jurídica, pratica, em seu benefício, fraude à lei, causando prejuízo a outrem;

b) idem abuso de direito;

c) idem simulação de negócio jurídico;

d) idem, quando age por meio de interposição de terceira pessoa;

e) quando, na execução dos contratos, o sócio comete fraude em seu benefício;

f) quando o sócio desvia, em seu benefício, a finalidade da sociedade;

g) quando há extinção irregular da sociedade, sem restar patrimônio, em face de gestão fraudulenta, abusiva ou simulada do sócio administrador;

h) quando os sócios se valerem da sociedade para isenção de responsabilidade pelo pagamento de obrigações de negócios jurídicos que a eles causaram vantagens diretas e pessoais.

3. A TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA E O DIREITO TRIBUTÁRIO

 

No campo do Direito Tributário há possibilidade de ser aplicada a teoria da desconsideração da pessoa jurídica?

A respeito, duas correntes estão formadas. Uma está a defender que a desconsideração da pessoa jurídica, para fins de ser aplicada nas relações jurídicas tributárias, só deve ser admitida quando existir leis especiais a prevendo ou com base em uma regra jurídica positiva de cunho geral que a autorize. Em qualquer das situações, há da norma positiva estabelecer os seus pressupostos de existência. A outra corrente entende que a desconsideração da pessoa jurídica, para fins tributários, pode ser adotada, mesmo inexistindo lei específica, bastando entendimento jurisprudencial.

Heleno Taveira Torres, em obra já citada, p. 470, declara a vinculação do seu entendimento à primeira corrente. Explicita:

“A desconsideração da personalidade jurídica, para os fins de aplicação da legislação tributária, poderá ser praticada tanto quando se esteja em presença de leis especiais quanto na hipótese de aplicação de uma regra geral que a autorize, à luz de determinados pressupostos. Por esse motivo, em lei específica que a previna, quanto ao cabimento de desconsideração em certo caso concreto, ou regra geral seus pressupostos, mediante prova da ausência de causa (dolo) e demais elementos suficientes para isolar a conduta elisiva, nenhuma desconsideração poderá ser admitida como instrumento válido para imputar aos sócios efeitos que se deveriam atribuir diretamente à pessoa jurídica”.

Prossegue o autor:

“Se é certo que não se tem qualquer dúvida sobre a aplicação de leis especiais que assim possam dispor em determinado caso específico, as chamadas regras gerais antielusivas, que trazem a previsão de um dado pressuposto (abuso de direito, fraude à lei, abuso de formas ou equivalente), para obter o efeito de lifiting the corporate veil ou disregard of the legal antity, sofrem muitas resistências e precisam respeitar limites que o próprio ordenamento contempla, mormente no direito brasileiro, em vista da analiticidade da Constituição em matéria tributária”.

Osmar Vieira da Silva segue essa linha de pensar. Leciona:

“O direito tributário tem como princípio fundamental o da legalidade, de tal modo que a desconsideração somente seria admitida nos casos em que a lei tributária expressamente a autorizasse, ao contrário da aplicação da teoria em outros ramos do direito” (ob. cit., p. 137).

Mais adiante, tratando da disfunção da sociedade:

“O legislador tributário necessita, assim, prever a hipótese da disfunção, tipificá-la (através de modelos fechados) e determinar a desconsideração. Caberá a lei autorizar a desconsideração, como, também, definir os pressupostos de sua incidência” (ob. cit. P. 138).

Ao lado desse entendimento, há quem defenda que “a desconsideração da pessoa jurídica não poderia ser aplicada nas lindes tributárias, em razão de não provir de lei complementar” (José Eduardo Soares de Melo, in “A Desconsideração da Pessoa Jurídica no Código Civil e o Reflexo no Direito Tributário”, capítulo da obra coletiva “Direito Tributário e o Novo Código Civil”, coordenada por Betina Treiger Crupenmacher, Edit. Quartier Latin, p. 166.

Essa reflexão conclusiva de José Eduardo Soares de Melo, conforme exposição desenvolvida no trabalho citado, decorre do exame que fez dos efeitos do art. 50 do Código Civil de 2002 no Direito Tributário.

O autor citado acrescenta ao afirmado:

“Mesmo que se entenda que o CTN não oferecera tratamento específico à mencionada desconsideração, e que seria possível a sua integração à sistemática tributária, o agente fazendário – ao apurar desvio de finalidade (desvirtuamento dos objetivos societários), ou confusão patrimonial (utilização distinta do patrimônio dos sócios e da Sociedade) -, somente poderia imputar a responsabilidade aos bens particulares, após decisão judicial específica”(ob. cit., pg. 166).

Sacha Calmon Navarro Coelho & André Mendes Moreira (autores de Reflexos do NCC no Direito Tributário, capítulo da obra coletiva “Direito Tributário e o NCC” , coordenada por Betina Treiger, citada), ao examinarem a responsabilidade dos administradores no Código Tributário Nacional, concluem:

“Isto posto, pode-se concluir que:

a) o art. 134 do CTN, que prevê a responsabilidade subsidiária dos terceiros, é inaplicável ao administrador de empresa;

b) a responsabilização pessoal e ilimitada do administrador pelas dívidas tributárias da sociedade (incluindo juros e multas de qualquer espécie) é possível desde  que ocorra uma das hipóteses previstas no art. 135, III, do CTN, a saber:

(b. 1) a atuação dolosa do administrador, cumulativamente com

(b. 2) infração à lei, estatuto ou contrato social, e

(b. 3) prejuízo ao Erário Público e á empresa.

Por fim, cumpre-nos anotar que o NCC trouxe nova disposição que evita fraudes no meio societário e permite, para tanto, a punição do administrador, com a desconsideração da personalidade jurídica da empresa e a persecução dos bens pessoais do sócio, gerente ou diretor que de algum modo se locupletou ilicitamente às custas da sociedade”.

Nenhuma restrição os autores acima mencionados apresentam sobre o reconhecimento da desconsideração da pessoa jurídica no campo do Direito Tributário.

O assunto foi motivo de preocupação por parte de Maria Dionne de Araújo Felipo. Analisou-o em artigo de sua autoria “Aspectos relativos às responsabilidades do Administrador no novo Código Civil”, inserido na obra coletiva “Direito Tributário e o Novo Código Civil”, já citada, pp. 434/435. Na oportunidade, considerou o art. 50 do Código Civil de 2002 como sendo uma das mais importantes inovações introduzidas em nosso ordenamento de direito, por facilitar a aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica.

Afirma:

“Por essa teoria, desconsidera-se a existência da sociedade comercial e o patrimônio do Administrador passar a ser responsabilizado pela sua gestão. Não tem como objetivo, contudo, a anulação da personalidade jurídica da sociedade, mas apenas desconsiderar, dentro das regras estabelecidas na legislação, a pessoa jurídica, para atingir pessoas ou  bens que estejam se ocultando sob o manto da empresa.

O aperfeiçoamento da definição traz grande influência para o direito tributário, uma vez que a construção doutrinária e jurisprudencial ainda oscilava, sendo aplicada sob critérios materiais e formais diversos, dependendo do julgador.

Com efeito, até mesmo no campo doutrinário, a responsabilidade do sócio-gerente por atos de má gestão, inserida no art. 135 do CTN seria uma forma particularizada de responsabilização, não se confundindo com a teoria da desconsideração”.

Convém que se registre a existência de harmonização entre o que prega Maria Dionne de Araújo Felipe e os ensinamentos de Heleno Taveira Torres, no sentido de que o art. 135 do CTN não tem qualquer semelhança com a desconsideração da pessoa jurídica.

Heleno Taveira Torres, em “Substituição Tributária – Regime Constitucional, Classificação e Relações Jurídicas e Processuais”, artigo publicado na Revista Dialética de Direito Tributário, n. 70, São Paulo: Dialética, 2001, citado por Maria Dionne, afirma, tratando do art. 135 do CTN, que:

“Este artigo é regra que se aplica à relação jurídica formada entre as pessoas indicadas e os que sofrem qualquer conseqüência patrimonial decorrente de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos. Ou seja, assiste direito aos lesados de agirem regressivamente contra aqueles que lhe causarem danos com a constituição de obrigações tributárias decorrentes de ‘atos praticados com excesso de poderes ou infração à lei, contrato social ou estatutos’, cabendo, aos que alegarem tais atos, a devida prova em juízo. Nada tem que ver com ‘desconsideração da personalidade jurídica’, ‘substituição tributária’ e quejandos”.

Heleno Taveira Torres confirma esse entendimento na sua obra “Direito Tributário e Direito Privado”, citada, p. 472.

Os posicionamentos de Maria Dionne e Heleno Taveira Torres são seguidos por Osmar Vieira da Silva, ob. cit., p. 139, afirmando:

“O artigo 135 do Código Tributário Nacional não teve origem nas concepções da teoria da desconsideração, dizendo respeito apenas aos atos ilícitos praticados por representante, cujas condutas lhes serão imputadas pessoalmente”.

De igual modo, registra Osmar Vieira da Silva, ob. cit., p. 139, é a posição de José Lamartine Correa de Oliveira, autor de “A dupla crise da pessoa jurídica”. São Paulo: Saraiva, 1979. Este autor defende, pg. 520, conforme cita Osmar Vieira da Silva, que:

“....não tem sentido o Direito brasileiro enxergar em dispositivos como o do art. 134, VII e 135, III, do Código Tributário (que responsabiliza, verificados determinados pressupostos, os sócios pelas obrigações tributárias da sociedade) indícios que revelem a presença entre nos das teses da desconsideração. Tal dispositivo significa apenas que, em determinadas circunstâncias, os sócios são responsáveis por dívida alheia – no caso, dívida da sociedade. Não envolve qualquer quebra ao princípio da separação entre o ser da pessoa jurídica e o ser da pessoa membro. Com maior razão, também não há qualquer desestimação do princípio da autonomia ontológica da pessoa jurídica na circunstância de admitirem determinados dispositivos de lei responsabilidade dos diretores em caso de comportamento doloso ou culposo ou que viole diretamente a lei ou os estatutos sociais (ou contrato social). Em tal caso, há simplesmente uma questão de imputação. Quando o diretor ou o gerente agiu com desobediência a determinadas normas legais ou estatutárias, pode seu ato, em determinadas circunstâncias, ser inimputável à pessoa jurídica, pois não agiu como órgão (salvo problema de aparência) a responsabilidade será sua, por ato seu. Da mesma forma, quando pratique ato ilícito, doloso ou culposo: responderá por ilícitos seu, por fato próprio”.

Eduardo Domingos Bottallo, em “Alguns Reflexos do Código Civil no Direito Tributário”, capítulo da obra coletiva “Direito Tributário e o novo Código Civil”, coordenação de Betina Treiger Grupenmacher, Editora Quartier Latin, pp. 191 e 192, pensa um pouco diferente dos autores acima referidos. Defende que há um “ponto de aproximação e confronto entre o novo Código e a legislação tributária”, no que diz respeito “à hipótese prevista no artigo 135, III, do Código Tributário Nacional”.

Explica:

“Consta do dispositivo que os diretores, gerentes ou representantes das pessoas jurídicas são pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de ‘atos praticados com excesso de poderes ou infração da lei, contrato social ou estatutos’. Trata-se de modalidade de responsabilidade pessoal (e não solidária com a própria pessoa jurídica), tendo como destinatários os representantes ou gestores do contribuinte, quer se revistam da condição de sócios, quer não”.

A seguir, doutrina:

“Em se tratando, como assinalado, de responsabilidade pessoal, ela não admite benefício de ordem, nem enseja o exercício do direito de regresso.

Portanto, à luz do dispositivo, a Fazenda pode ignorar a própria existência da pessoa jurídica e aparelhar sua pretensão creditícia diretamente contra o diretor, gerente ou representante.

Como se vê, está-se diante de situação onde fica evidenciada, com notável clareza, a acolhida de fundamentos simétricos aos que se fazem presentes no princípio da desconsideração da personalidade jurídica, objeto do artigo 50 do Código Civil..”.

Afirma, ainda, o mencionado autor:

“Então, embora cuidem de figurar distintas, tanto a norma civil (o artigo 50 retro transcrito, como a tributária (o artigo 135, III, do Código Tributário Nacional) estão voltadas para a consecução das mesmas finalidades, o que autoriza reconhecer-se pontos de convergência entre ambas”.

Com base nessa interpretação, conclui Eduardo Domingos Botallo, ob. cit., p. 193, que:

“............, somente quando demonstrada, pelo fisco, que a obrigação tributária a cargo da sociedade decorreu de alguma das causas apontadas na lei civil (art. 50) é que o art. 135, III, do Código Tributário Nacional poderá validamente ser acionado”.

Apresenta-se muito amplo e diversificado o questionamento, na época contemporânea, sobre a aplicação da teoria da desconsideração da pessoa jurídica no Direito Tributário, conforme estamos a demonstrar.

Na tentativa de explorar o máximo o assunto em questão, passamos a registrar outros pronunciamentos sobre o tema, sem enfoque a um campo específico.

Ricardo Lobo Torres, em capítulo  da obra coletiva “Direito Tributário e o Novo Código Civil”, coordenação de Betina Treiger Grupenmacher, Editora Quartier Latin,  intitulado “O Abuso do Direito no Código Tributário Nacional e no Novo Código Civil”, p. 46, lembra que “na Argentina as normas que autorizam o Fisco a desconsiderar a personalidade do contribuinte para atingir as relações econômicas efetivamente realizadas constituem autênticas regras antielisivas. Procuram normatizar a teoria do ‘disregard of legal entity’ ou do ‘lifting the corporate veil’, isto é, autorizam o levantamento do véu da personalidade da empresa para que se possam atingir a substância do negócio jurídico e a responsabilidade dos sócios. Assim pode ser classificado o art. 2º da Lei 11.683, na ordenação dada pelos Decretos 821/98 e 1.334/98 (antes aparecia como art. 12).

No tocante ao ponto de divergência que já anotamos sobre se o art. 135 do CTN alberga ou não a teoria da desconsideração da pessoa jurídica, citamos esclarecedor artigo de Lais Vieira Cardoso, advogada em Ribeirão Preto (SP), especialista em Direito Tributário pela PUC/Campinas, mestranda em Direito das Obrigações Público e Privado pela UNESP de Franca, intitulado “As doutrinas de prevalência da substância sobre a forma diante do parágrafo único do art. 116 do Código Tributário Nacional”, publicado via internet, disponível em : <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3684>. Acesso em: 19 jul. 2005, de onde destacamos o trecho que, embora longo, merece ser citado:

“IV – A possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica no Código Tributário Nacional

Dentre as teorias de prevalência da substância sobre a forma, merece destaque a doutrina da desconsideração da personalidade jurídica. Conforme iremos explicar, é necessária a análise de sua aplicação no direito tributário, o que já esclarece alguns equívocos referentes à inserção destas teorias no direito tributário pátrio. Bem disse Alfredo Becker, diante das normas tributárias alteradas a cada dia e dos conflitos entre as teorias interpretativas tratar-se, o nosso ordenamento jurídico tributário, de um manicômio jurídico. Mas, sejamos mais um a adentrar com uma lanterna nesta escuridão.

No que se refere à teoria da desconsideração, o que ocorre é que o nosso ordenamento jurídico reconhece a autonomia da pessoa jurídica, mas, para que esta ficção não seja desviada em proveito pessoal daqueles que detenham poderes de mando ou gestão na sociedade, existe em nosso ordenamento jurídico privado mecanismos legais que expressam a assunção de responsabilidade em defesa dos credores das pessoas jurídicas.

A aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica devido ao mau uso, abuso do poder ou desvio do seu objeto social, com a conseqüência de se ignorar a distinção do patrimônio desta pessoa daquele que possuam os seus sócios-gerentes, caracteriza a figura da disregard doctrine, com possível precedente na Alemanha, com "a chamada teoria da soberania, elaborada pelo alemão HAUSSMANN e desenvolvida da Itália por MOSSA" (22). As teorias que apóiam a desconsideração da personalidade jurídica são:

a)teoria do ultra vires, caracterizando a ocorrência de ato de gestão fora dos limites impostos à sociedade pelas cláusulas do objeto social. Esta teoria é criticada no sentido de vincular os atos negociais da empresa apenas ao objeto social estipulado no contrato, sendo que são comuns as possibilidades de necessidade de alterações daquele objeto anteriormente fixado, muitas vezes percebidas quando do momento de realização do próprio ato negocial.

b)doutrina dos atos próprios, segundo a qual haverá responsabilidade da empresa por dívida alheia somente no caso de insolvência do devedor originário, observando-se que "não se reconhece a desconsideração quando envolver imputação de atos jurídicos e seus efeitos. E isso pela concepção de que a personificação nenhuma pertinência tem com a imputação de direitos e deveres" (23). Observa-se aqui que não se pode confundir a imputação de atos a determinada pessoa com o reconhecimento de existência de uma nova pessoa no lugar daquela que existia apenas aparentemente.

c)teoria da aparência que explica que se pode desconsiderar a pessoa jurídica mesmo quando esta não existe realmente, sendo apenas uma fachada ou aparência. Neste sentido, Lamartine discorda da aplicação da citada teoria, por entender que "a atribuição de atos e efeitos jurídicos a outrem não é uma desconsideração, porquanto, só é possível "desconsiderar" aquilo que existe" (24).

Nas relações entre o ente tributante, sujeito ativo da relação jurídica tributária e o contribuinte, sujeito passivo, alguns juristas entendem que, quando ocorrer a hipótese do artigo 135 do CTN, ou seja, quando forem detectados atos dos representantes com abuso de poder ou infração à lei, ao estatuto ou ao contrato social em prejuízo dos créditos referentes às obrigações tributárias, estar-se-ia diante de uma hipótese de desconsideração da personalidade jurídica aplicável ao direito tributário.

Mas, vejamos o que diz o artigo 135 do CTN:

"São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poder ou infração à lei, contrato social ou estatutos:

"I – as pessoas referidas no artigo anterior;" (pais, tutores, curadores, administradores de bens de terceiros, inventariantes, síndicos, tabeliães e outros ali especificados)

"II – os mandatários, prepostos e empregados;

"III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado."

Como dissemos outrora, este ramo do direito é regido, dentre outros, pelo princípio da estrita legalidade, ramificado pelos princípios da tipicidade e da segurança jurídica e que garantem ao contribuinte que somente haverá o sacrifício de parcela de sua riqueza individual em prol do Estado caso haja previsão legal, prevendo todos os aspectos desta relação, dentre eles a determinação do sujeito passivo (contribuinte ou responsável legal) obrigado a efetuar respectivo recolhimento pecuniário.

A doutrina da desconsideração da personalidade jurídica possui os contornos próprios já explicados e a sua aplicação no direito tributário pátrio é severamente questionada.

A hipótese de se confundir os patrimônios da empresa com os dos sócios deve ocorrer apenas nos casos em que, além da expressa previsão legal, se configure efetivamente a fuga da obrigação tributária de forma irregular e ilegal, observados o tipo empresarial, o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório e somente na hipótese de, com a responsabilização pessoal e patrimonial dos membros das empresas, haver a possibilidade de correção dos desvios encontrados.

Porém, os nossos juristas, por várias vezes, citam a teoria da desconsideração da personalidade jurídica como sendo aplicável ao direito tributário e com fundamento legal no citado artigo 135, como podemos ver nas seguintes ementas:

"EXECUÇÃO FISCAL-SOCIEDADE POR QUOTAS DE RESPONSABILIDADE LIMITADA-PENHORA DE BENS DE PATRIMÔNIO PESSOAL DE SÓCIO QUE NÃO EXERCEU FUNÇÃO DE DIREÇÃO - ART. 135, III DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL. I - A teoria da desconsideração da personalidade jurídica para coibir a fraude a credores há de ser utilizada, no direito brasileiro, de acordo com os precisos termos dos arts. 16 do Decreto lei 3.708 e 135 do Código Tributário Nacional. Vale dizer, somente os sócios que tenham deliberado contra as regras contratuais ou legais, com excesso de poderes, podem ser responsabilizados pessoal e ilimitadamente pelas obrigações sociais e tributárias. II- É impossível a penhora dos bens do sócio que jamais exerceu a gerência, a diretoria ou mesmo representasse a empresa executada.

"DECISÃO: Dar provimento ao recurso do primeiro apelante julgar prejudicado o recurso do segundo apelante." (grifos nossos) (Ref. Apelação cível n.º 3675195/DF – Acórdão n.º 81247 – 3.ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal. Julg. Em 24/11/1995. Rel. Des. Nancy Andrighi. Publ. DJ/DF 19/12/1995, p. 19.351).

"TRIBUTARIO - MANDADO DE SEGURANCA - AGENTE DE RENDAS QUE SE NEGA A FORNECER CERTIFICADO DE REGULARIDADE CADASTRAL - EMPRESA SUPERLATIVAMENTE MAJORITARIA DA IMPETRANTE (99,98% DAS COTAS SOCIAIS) COM DEBITOS TRIBUTARIOS PENDENTES - DESCONSIDERACAO DA PESSOA JURIDICA - ORDEM DENEGADA - APELO DESPROVIDO.

"I- A doutrina da disregard of legal entity tem acentuada aplicação no terreno no direito tributário, para coartar a sonegação e evasão de impostos, quando se usa a personalidade da sociedade comercial como anteparo.

"II- Se a empresa devedora do fisco continua a existir apenas como cotista da impetrante, que passou a operar em seu lugar; se a ligação entre ambas é tão estreita e visceral, que não se pode fugir a suspeita de que se trata de um único organismo, provido de duas faces: uma real, outra aparente ou simulada; se o que a segunda apresenta de novo é apenas a denominação social, isto e, face postiça com que se pretende dissimular a fisionomia real da primeira; se o que os acionistas da empresa devedora pretendem não é criar nova forma de atividade, mas um aparência ou simulacro, a cuja sombra possa mover-se o organismo real, então, o ato administrativo que procura resguardar os interesses da fazenda pública, negando o certificado de regularidade cadastral, para impedir a participação dissimulada da inadimplente em licitações públicas, com base em instruções normativas, nada tem de abusivo ou lesivo.

"Decisão: unânime." (Ref. Apelação cível – Acórdão n.º 12.735 – Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná – Rel. Juiz Munir Karam – Publ. 09/09/1996)

Uma vez detectada a tentativa, por parte do contribuinte, em se furtar à obrigação de recolher o crédito tributário legalmente constituído, deve-se observar que, na hipótese do artigo 135, o que se prevê é tão somente a responsabilização pelos atos praticados com excesso de poder ou infração à lei, ao contrato social ou ao estatuto e dentro dos lindes das conseqüências de referidos atos, não tratando, ainda, de aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica que levanta o véu da pessoa jurídica para atingir, de forma ilimitada, o patrimônio dos sócios-gerentes ou administradores até a quitação total do débito.

Para melhor esclarecer, Marçal Justen Filho explica que: "a regra do artigo 135 do Código Tributário Nacional não teve origem nas concepções indicadas como ‘teoria da desconsideração da personalidade jurídica" (25). Segundo o autor, esta regra de direito tributário não dispõe apenas das sociedades personificadas, abrangendo outras situações distintas como o caso dos mandatários e sendo, portanto, um gênero de condutas abusivas e não a espécie prevista em lei de desconsideração da personalidade jurídica em virtude, fundamentalmente, de um resultado fraudulento. Acrescenta ainda que "A tipicidade característica do direito tributário excluí a incidência da desconsideração, quando inexista expressa previsão normativa" (26), do que podemos concluir pela inaplicabilidade da teoria da desconsideração da personalidade jurídica no direito tributário pátrio por inexistência de lei específica, prevendo os seus aspectos.

A inclusão desta doutrina no direito tributário pátrio demandaria, além de expressa previsão legal, que os seus elementos fossem definidos na norma, bem como os conceitos do que seria excesso de poder, infração à lei ou ao estatuto no âmbito tributário ou a adoção destes institutos do direito privado com interpretação literal, isentando do aplicador a discricionariedade.

Observando agora a regra inserida no Código Tributário Nacional por intermédio da Lei Complementar n.º 104, de 10 de janeiro de 2001 que diz:

"Artigo 116.(...)

"Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os elementos a serem estabelecidos em lei ordinária".

Podemos perceber que referido dispositivo também não trata da figura da desconsideração da personalidade jurídica no direito tributário, pois não insere na legislação tributária os elementos ou aspectos necessários para que se levante o véu da pessoa jurídica adentrando no patrimônio dos sócios e, sim, a possibilidade de não serem consideradas, para fins de subsunção à norma jurídica tributária, as formas com as quais foram realizados pelo contribuinte atos e negócios em virtude das razões referentes à substância destes atos e negócios a serem delimitadas por meio de lei específica.

Esta hipótese que, tanto quanto o citado artigo 135 não é caso de desconsideração da pessoa jurídica pode, porém, tomar os contornos de outra teoria de prevalência da substância sobre a forma, o business purpose test, o que veremos no capítulo seguinte”.

José Antônio Francisco (Auditor-fiscal da Receita Federal, Instrutor da Escola de Administração Fazendária e Suplente de Conselheiro junto à 1a. Câmara do 2º Conselho de Contribuintes – 2004), em seu site : http://jaf.tripode.com.br/monografias/desconsideração.htm, acessado em 19.07.2005, publica artigo intitulado “Desconsideração da personalidade jurídica das empresas”, onde, após analisar a origem e a evolução dessa entidade jurídica, afirma:

“A personalidade jurídica da empresa, dessa forma, não teria aplicação absoluta, podendo, excepcionalmente, ser desconsiderada, nos casos de aplicação das teorias de fraude contra credores e abuso de direito (vi).

Esclarece Luciano Amaro (vii) que a doutrina geralmente considera duas espécies de desconsideração: a feita pelo legislador e a feita pelo juiz.

Como anteriormente esclarecido, na teoria original, somente poderia ser feita a desconsideração pelo juiz, pois se tratava de direito anglo-saxônico. No Brasil, parte da doutrina sustenta que a lei pode expressamente determinar a desconsideração.

Para o autor, entretanto, que se respalda na doutrina de Gilberto de Ulhôa Canto, as normas que prevêem responsabilidade do sócio, subsidiária ou solidária (viii), não se confundem com a desconsideração da pessoa jurídica.

Os pressupostos são diversos e as conseqüências também. Na primeira hipótese, a responsabilidade é desviada da pessoa jurídica, que, assim, não é "desconsiderada", mas protegida das conseqüências de ato do sócio.

Na segunda, o abuso protegido pelo princípio da separação patrimonial é contestado. Se o patrimônio da sociedade, que também responde pela dívida no caso, não é suficiente para satisfazer os credores, desconsidera-se a sua personalidade, para considerar o ato abusivo como ato do sócio, sendo esse responsável pelas dívidas.

Como esclareceu Fábio Ulhôa Coelho (ix), não se pode confundir responsabilidade legal dos sócios por obrigações da sociedade com a desconsideração da pessoa jurídica.

A primeira hipótese refere-se à disposição legal expressa de responsabilidade. Ocorre, por exemplo, no direito tributário, nos casos dos arts. 134, VII, e 135 do Código Tributário Nacional.

Se o sócio agir em desconformidade com o estatuto social, por exemplo, a responsabilidade pelo crédito tributário derivado da operação passa a ser dele. Protege-se, portanto, a pessoa jurídica, imputando a responsabilidade ao sócio.

A segunda hipótese tem também como pressuposto o "mau uso da regra da separação patrimonial" (x), mas não se baseia em responsabilidade específica predefinida em lei. A aplicação do preceito deve ser cuidadosa e deve seguir o devido processo legal.

Para Luciano Amaro, a teoria da desconsideração da pessoa jurídica não pode ser aplicada ao direito tributário, pois esse ramo do direito é regido pelo princípio da estrita legalidade, e há, na lei, disposições expressas a respeito da responsabilidade dos sócios”.

As citações referentes aos autores acima mencionados demonstram como a desconsideração da pessoa jurídica, no campo do direito tributário, apresenta-se, ainda, controvertida, o que exige que os debates a seu respeito sejam intensificados.

 

4. A JURISPRUDÊNCIA ASSENTADA SOBRE A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NAS RELAÇÕES JURÍDICAS TRIBUTÁRIAS

 

Registramos, neste espaço, 24 decisões do STJ e dos Tribunais Regionais Federais sobre a aplicação da desconsideração da pessoa jurídica na área tributária.

O leitor irá observar que, em alguns dos julgados, os elementos caracterizadores da responsabilidade tributária previstos no art.   135 do CTN foram considerados como sendo causas da referida teoria. Incide, assim, essa jurisprudência no mesmo equívoco de alguns doutrinadores, conforme assinalamos. Eis a ementa dos acórdãos que selecionamos:

I)  TRF da 4ª Região - MAS 56.396:

"ADMINISTRATIVO. PESSOA JURÍDICA. INSCRIÇÃO NO CGC. RESTRIÇÃO DA INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 112/94. INAPLICABILIDADE.

"1. Mantida a sentença que concedeu a ordem para que a Receita Federal não obstaculize a alteração no cadastro da impetrante, pois, na teoria geral referente às sociedades comerciais, a pessoa JURÍDICA tem PERSONALIDADE distinta da PERSONALIDADE de seus sócios, que, só em casos excepcionais de prática de atos fraudulentos ou abusivos, respondem pessoalmente pelas obrigações assumidas pela pessoa JURÍDICA.

"2. A Teoria da DESCONSIDERAÇÃO da Pessoa JURÍDICA não pode ser aplicada ao presente caso, pois não restou comprovado que o débito para com o Fisco é devido a ato fraudulento ou abusivo do sócio que pretende fazer parte da empresa-impetrante.

"3. A Instrução Normativa nº 112/94 contém, no seu art. 2º, evidente restrição à liberdade de exercício de atividade profissional, mas mesmo que isso seja superado, esse ato normativo não poderia ser aplicado à hipótese desses autos porque quem está em débito é a pessoa JURÍDICA, e não o seu sócio que agora tem a intenção de fazer parte do quadro de sócios da impetrante.

"4. Apelação e remessa oficial improvidas."

Há de ser observado que no julgamento referido, apelação em mandado de segurança, o Tribunal decidiu que, por não ter ficado provado a prática de fraude ou de ato abusivo do sócio, não haveria como ser aplicada a desconsideração. É de ser firmada a conclusão que, em tese, o TRF da 4ª região admitiu a aplicação da teoria ao direito tributário, desde que fique provada a fraude ou abuso do sócio.

II) PRIMEIRO TRIBUNAL DE ALÇADA DE SÃO PAULO

"Sociedade por cotas de responsabilidade limitada - Desconsideração de personalidade jurídica - Sócios que não agiram de forma fraudulenta ou desastrosa - Falência da sociedade por percalços econômico-financeiros - Solidariedade nos débitos sociais repelida.

Percalços econômico-financeiros da empresa, tão comuns na atualidade, mesmo que decorrentes da incapacidade administrativa de seus dirigentes, não se consubstanciam, por si sós, em comportamento ilícito e desvio de finalidade da entidade jurídica.

Do contrário seria banir completamente o instituto da pessoa jurídica".

(1º TACSP, 3ª Câm., Ap. 507.880-6, rel. Juiz Ferraz Nogueira, 15-9-1992, RT, 90/103).

 

III) "Sociedade por cotas de responsabilidade limitada - Desconsideração da personalidade jurídica - Aplicação que requer cautela e zelo, sob pena de destruir o instituto da pessoa jurídica o olvidar os incontestáveis direitos da pessoa física - Necessidade de que seja apoiada em fatos concretos que demonstrem o desvio da finalidade social da sociedade, com proveito ilícito dos sócios.

Embargos de terceiro. Desconsideração da pessoa jurídica. Contra-razões de apelação. Sistema de legalidade formal. Vindo o recorrido com sua contra-razões objetivando a mudança do julgado, incorre em erro grosseiro e pelo sistema de legalidade formal, '' a eficácia dos atos do processo depende, em princípio, de sua celebração segundo os cânones da lei'', não podendo, assim, serem recebidos como razões de apelação. A aplicação da disregard doctrine, a par de ser salutar meio para evitar a fraude via utilização da personalidade jurídica, há de ser aplicada com cautela e zelo, sob pena de destruir o instituto da pessoa jurídica e olvidar os incontestáveis direitos da pessoa física. Sua aplicação terá de ser apoiada em fatos concretos que demonstrem o desvio da finalidade social da pessoa jurídica, com proveito ilícito dos sócios".(TAPR, 2ª Câm., Ap. 529/90, rel. Juiz Nei Carneiro Leal, RT, 673/160).

IV) “A jurisprudência tem aceito com provadas aquelas hipóteses em que a empresa deixa de recolher os impostos devidos, o que enseja o descumprimento de lei, bem como quando o sócio der causa ao encerramento da empresa em desacordo com a lei e seu estatuto social. Outra hipótese ocorre quando o sócio emite título de crédito em nome da sua empresa em seu próprio benefício. Outro exemplo aceito pelo Judiciário é aquele caso em que a sociedade é constituída de capital com a quase da totalidade das cotas por um sócio, sendo que o outro detém cota social mínima, às vezes, de valor desprezível. Para ilustrar a última hipótese vale transcrever uma decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: ‘‘Sociedade por cotas de responsabilidade limitada. Execução fiscal com penhora dos bens do sócio-gerente. Embargos de Terceiro. Sociedade realmente fictícia, em que o sócio-gerente é dono de 99,2% do capital, sendo o restante 0,8% de sua mãe e de um cunhado. A assertiva de que a pessoa da sociedade não se confunde com a do sócio é um princípio jurídico básico, não um tabu, e merece ser desconsiderada quando a sociedade é apenas um ‘‘alter ego’’ de seu controlador, na verdade comerciante em nome individual. Lição de Konder Comparato. Embargos de terceiros rejeitados (...)’’ (TJRS, RDM, 63/83).

V) “É impossível a penhora dos bens do sócio que jamais exerceu a gerência, a diretoria ou mesmo representasse a empresa executada. Não há de ser utilizada a teoria da desconsideração da personalidade jurídica, prevalecendo o princípio da responsabilidade subjetiva, e não a simples presunção" (STJ, R.Esp. nº 8.711-0-RS, 2a. T., Rel. Min. Peçanha Martins, ac. de 21.10.92, DJU, 17.12.92, p. 24.233).

VI) AG 2002.01.00.031070-2/BA; AGRAVO DE INSTRUMENTO DESEMBARGADORA FEDERAL MARIA DO CARMO CARDOSO  30/04/2004 DJ p.265  CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO CTN.
1. Excetuados os casos constantes do art. 135, III, do CTN, somente nas hipóteses de fraude ou má gestão empresarial, é que se permite a desconsideração da personalidade jurídica da empresa executada, atingindo dessa forma, o patrimônio do sócio gerente.
2. O mero inadimplemento das obrigações tributárias pela pessoa jurídica não se considera infração à lei, para efeito de aplicação do artigo 135 do Código tributário Nacional. 
3. Agravo de instrumento a que se nega provimento.

VII) Origem: TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Classe: AGV - AGRAVO – 81867

Processo: 2001.02.01.029332-2 UF : RJ Órgão Julgador: QUINTA TURMA .       Data Decisão: 27/05/2003 Documento: TRF200098681 DJU DATA:16/06/2003 PÁGINA: 155. RELATOR: DES. ALBERTO NOGUEIRA

Ementa:

ARTIGO 135, III, DO CTN. SOCIEDADE DE COTAS POR RESPONSABILIDADE LIMITADA PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO. FGTS. CARÁTER NÃO TRIBUTÁRIO. INAPLICABILIDADE DO.

. INFRAÇÃO DO CONTRATO SOCIAL OU LEI.
1. O patrimônio pessoal do sócio não responde pelas dívidas da sociedade, uma vez que com ele não se confunde, conforme dispõem os artigos 10 do Decreto nº 3.708 e 1.052 do novo Código Civil.
2. A contribuição para o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço não possui caráter tributário, pelo que se afasta a aplicabilidade do artigo 135, III, do Código Tributário Nacional.
3. Só haverá responsabilidade ilimitada nos casos previstos no artigo 16 do Decreto nº 3.708 de 10 de janeiro de 1919, vigente à época da ocorrência do fato gerador, isto é, quando as deliberações dos sócios infringirem o contrato social ou a lei.
4. O simples inadimplemento não se presta a configurar a situação de infração à lei descrito no citado dispositivo legal.

VIII) Origem: TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO
Classe: EIAC - EMBARGOS INFRINGENTES NA APELAÇÃO CIVEL – 32137. Processo: 92.02.07300-7 UF : RJ Órgão Julgador: SEGUNDA SEÇÃO. Data Decisão: 18/09/2003 Documento: TRF200105406.     DJU DATA:01/10/2003 PÁGINA: 139 Publicado no INFOJUR nº54 (1º a 15 de Maio/2004). Publicado no INFOJUR nº 58 - Edição Especial (1 a 15 de agosto de 2004) Publicado na Revista de Jurisprudência do TRF´2 nº 41. RELATOR: JUIZ ANTÔNIO CRUZ NETTO TRIBUTÁRIO E COMERCIAL E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA . EMPRESAS DIVERSAS MAS GERIDAS PELO MESMO SÓCIO. POSSIBILIDADE DE SE DIRECIONAR A AÇÃO CONTRA AQUELA QUE EFETIVAMENTE É IDENTIFICADA COMO A DEVEDORA. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS.
I - Em se tratando de embargos de terceiros, tem legitimidade ativa aquele que, não sendo parte nos autos, é possuidor do bem constrito judicialmente, ao passo, que a legitimidade passiva é daquele que indicou o bem à penhora. Pelo que consta dos autos, o bem teria sido indicado pela própria exeqüente, de modo que a empresa executada, MACEL DISTRIBUIDORA DE CARNES LTDA., poderia vir aos autos na qualidade de assistente litisconsorcial, mas não é necessariamente ré nos embargos de terceiros. Ausência de nulidade.
II - O escopo da "personalidade é alcançar aquele que se utilizou indevidamente diferenciação patrimonial: o sócio, seja natural ou.

III - O eg. STJ já se manifestou, em diversas ocasiões, no sentido da possibilidade de aplicação da teoria da "não apenas em relação aos sócios da empresa executada, como também em relação a empresas que pertencem aos mesmos sócios ou a um mesmo grupo, e que abusam desta condição como forma de lesarem o erário ou outros credores, transferindo patrimônio ou realizando entre si negócios que têm por finalidade simplesmente se eximirem de suas obrigações legais.            
IV - Embargos infringentes providos.

IX) Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Classe: RESP - RECURSO ESPECIAL - 436012
Processo: 200200625278 UF: RS Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA
Data da decisão: 17/06/2004 Documento: STJ000567806.  DJ DATA:27/09/2004 PÁGINA:304. RELATORA: MINISTRA ELIANA CALMON.

Ementa: PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO - INOCORRÊNCIA DE LITISCONSÓRCIO

NECESSÁRIO - VÍNCULO FAMILIAR - DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA.

1. As hipóteses de configuração de litisconsórcio necessário estão

no artigo 47 do CPC, o qual exige  imposição de lei, ou  a

existência de vínculo natural, pela natureza da relação jurídica.

2. A base fática da demanda descarta a existência de liame entre os

litisconsortes, de relevância para o desfecho da causa, sendo certo

que o fato de pertencerem os litisconsortes a uma só família não os

coloca na mesma relação jurídica discutida nos autos.

3. Examinada a lei aplicável à espécie, o CTN, o primeiro diploma do direito pátrio a  consagrar a teoria da desconsideração da pessoa jurídica, não se encontra, nas hipóteses do artigo 134 do CTN, determinação legislativa justificadora do litisconsórcio.

4. Recurso especial provido.

X) Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Classe: RESP - RECURSO ESPECIAL - 413865
Processo: 200200171511 UF: PR Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA
Data da decisão: 26/11/2002 Documento: STJ000467756. DJ DATA:19/12/2002 PÁGINA:338 RSTJ VOL.:00170. RELATOR: LUIZ FUX.

EMENTA:

PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO - ANTECIPAÇÃO DA TUTELA - PROGRAMA DE RECUPERAÇÃO FISCAL - REFIS - CONSÓRCIO DE EMPREGADORES RURAIS - ADESÃO - POSSIBILIDADE - CARÁTER SOCIAL DÚPLICE DO PROGRAMA - IMPOSSIBILIDADE DE LACUNAS NO ORDENAMENTO JURÍDICO - INTERPRETAÇÃO E INTEGRAÇÃO DA LEGISLAÇÃO TRIBUTÁRIA - CTN, ART. 108.

1. Consórcio de Produtores Rurais criado e reconhecido pelo Ministério do Trabalho como instrumento de otimização das relações com os trabalhadores rurais. Técnica que viabiliza a atividade para todos os consorciados, mercê da regularização das carteiras de trabalho dos trabalhadores. Obtenção de CEI junto ao INSS como grupo de produtores rurais pessoas físicas. A Responsabilidade do Consórcio para com as contribuições previdenciárias, implica em reconhecer-lhe aptidão para beneficiar-se do programa REFIS, muito embora não seja pessoa jurídica.

Na era da "desconsideração da pessoa jurídica" e do reconhecimento da legitimatio ad causam às entidades representativas de interesses difusos, representaria excesso de formalismo negar ao Consórcioreconhecido pelo Ministério do Trabalho a assemelhação às pessoas jurídicas para fins de admissão no REFIS, máxime porque, essa opção encerra promessa de cumprimento das obrigações tributárias.

2. Acórdão recorrido que, confirmando decisão singular, concedeu a antecipação da tutela e determinou a inclusão junto ao denominado "Programa de Recuperação Fiscal - REFIS" de consórcio de empregadores rurais, equiparando-o in casu a pessoa jurídica.

3. Possibilidade de interpretação extensiva da legislação que dispõe sobre o ingresso junto ao REFIS, permitindo aos consórcios equiparação às pessoas jurídicas.

4. Natureza dúplice das disposições que disciplinam o REFIS que fomentam o adimplemento das obrigações tributárias e permitem ao Estado o recebimento, mesmo que parcelado, de seus créditos fiscais.

5. Recurso Especial conhecido e improvido.

 

XI) Origem: STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Classe: RESP - RECURSO ESPECIAL - 28168
Processo: 199200258875 UF: SP Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA
Data da decisão: 14/06/1995 Documento: STJ000091437. DJ DATA:07/08/1995 PÁGINA:23026 RSTJ VOL.:00093 PÁGINA:152.RELATOR: MIN. ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO.

EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. FRAUDE DE EXECUÇÃO. NÃO CARACTERIZAÇÃO. C.T.N., ART. 185. APLICAÇÃO.

I   - EMBORA INTEGRANTES DO MESMO GRUPO EMPRESARIAL, AS EMPRESAS ALIENANTE E EXECUTADA TEM PERSONALIDADE JURÍDICA PRÓPRIA. NA ESPÉCIE, NÃO HÁ NOTÍCIA DE QUE PENDESSE, EM RELAÇÃO A ALIENANTE, EXECUÇÃO FISCAL COM CRÉDITO REGULARMENTE INSCRITO  QUANDO DA ALIENAÇÃO ORA QUESTIONADA. ADEMAIS, NÃO SE COGITA DE CRÉDITO

SOLIDÁRIO PELO SIMPLES FATO DE AMBAS AS EMPRESAS ALIENANTE E EXECUTADA PERTENCEREM AO MESMO GRUPO ECONÔMICO. TAMPOUCO TEM A APLICAÇÃO A TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA, POIS, NO CASO, NÃO SE AFIRMOU QUE, ANTES DA ALIENAÇÃO QUESTIONADA, TIVESSE A EXECUTADA ALIENADO O BEM PENHORADO A ALIENANTE. HA DE CONSIDERAR-SE, AINDA, QUE A ALIENAÇÃO QUESTIONADA FOI PRECEDIDA DE ALVARÁ JUDICIAL EXPEDIDO PELO JUÍZO DA CONCORDATA, O QUE TORNA INACEITÁVEL RESPONSABILIZAR EMPRESA OUTRA QUE NÃO A EXECUTADA PELO DÉBITO COBRADO.

II - INAPLICAÇÃO A ESPÉCIE DO ART. 185 DO C.T.N.

III - RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO.

XII) Origem: TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Classe: AG - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 200909
Processo: 200403000106267 UF: SP Órgão Julgador: SEXTA TURMA
Data da decisão: 13/10/2004 Documento: TRF300087164.  DJU DATA:05/11/2004 PÁGINA: 342. Relator: JUIZ LAZARANO NETO.

AGRAVO DE INSTRUMENTO - EXECUÇÃO FISCAL - INCLUSÃO DE SÓCIO DA EMPRESA EXECUTADA NO PÓLO PASSIVO - DISSOLUÇÃO IRREGULAR DA SOCIEDADE.

1 - Dispõe o artigo 135, inciso III, do Código Tributário Nacional que os diretores, gerentes ou representantes das pessoas jurídicas são pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei.

2 - Gestão com excesso de poderes ou infração à lei ou contrato, é a gestão fraudulenta com intuito de lesar o credor tributário deliberadamente, ou a dissolução irregular da sociedade, sem a devida quitação dos tributos pelos representantes legais da empresa.

3 - Demonstrado nos autos que a sociedade foi dissolvida irregularmente, fica autorizada a desconsideração da pessoa jurídica e a conseqüente substituição da responsabilidade tributária, impondo-se a inclusão do sócio no pólo passivo da execução fiscal.

4 - Agravo de instrumento a que se dá provimento.

XIII) Origem: TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Classe: AG - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 184589
Processo: 200303000445367 UF: SP Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA. Data da decisão: 24/08/2004 Documento: TRF300085847. DJU DATA:01/10/2004 PÁGINA: 554. JUIZA CECILIA MELLO.

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO: RESPONSABILIDADE DIRETA DOS SÓCIOS PELOS DÉBITOS TRIBUTÁRIOS DA SOCIEDADE. ADMISSIBILIDADE. EXECUÇÃO ANTIGA. BENS EMPRESARIAIS INÁBEIS AO ADIMPLEMENTO DO CREDOR.

AUSÊNCIA DE PROVA SOBRE A INEXISTÊNCIA DE PODERES DE GERÊNCIA.

I - A responsabilidade direta dos sócios pelos débitos tributários empresariais só ocorre caso a sociedade seja irregular ou por atos praticados com infração à lei ou com excesso de poderes, nos termosdo artigo 135, do CTN.

II - Os sócios respondem, nos demais casos, com seu patrimônio pessoal de forma subsidiária, seja qual for o tipo societário, se não houver patrimônio suficiente da sociedade para arcar com os débitos, ante a ocorrência de atos tendentes a fraudar os credores ou a própria execução, os quais devem resultar na desconsideração da pessoa jurídica.

III - Ausência de elementos probantes hábeis ao reconhecimento da

irresponsabilidade dos sócios pelos débitos empresariais.

IV - Execução que já remonta dez anos, sem a penhora de bens da empresa, suficientes à garantia do juízo.

V - Falta de indícios a indicar que os sócios não compunham o quadro societário à época de ocorrência do fato imponível, bem como da ausência do exercício dos poderes de gerência a ensejar aexclusão dos nomes dos sócios do pólo passivo da execução fiscal.

VII - Agravo improvido.

XIV) Origem: TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Classe: AG - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 176496
Processo: 200303000173896 UF: SP Órgão Julgador: QUINTA TURMA
Data da decisão: 09/08/2004 Documento: TRF300085472. DJU DATA:24/09/2004 PÁGINA: 428.  JUIZA RAMZA TARTUCE. PROCESSUAL CIVIL - EXECUÇÃO FISCAL - INCLUSÃO DE EX-SÓCIO DO PÓLO PASSIVO DA EXECUÇÃO - CABIMENTO - EMBARGOS À EXECUÇÃO – AGRAVO PROVIDO.

1.     As pessoas constantes da certidão da dívida ativa, a empresa devedora e seus sócios, estão legitimadas para figurar no pólo passivo da execução, nos termos do art. 4º da Lei de Execução Fiscal.

2.     Consoante o parágrafo único do art. 13 da Lei 8.620/93, o acionista é solidariamente responsável pelos débitos previdenciários contraídos pela sociedade anônima, sendo que esta solidariedade não comporta benefício de ordem (parágrafo único do artigo 124 do CTN), de modo que não há que se falar em desconsideração da pessoa jurídica, pois o fisco poderá cobrar a dívida de qualquer pessoa constante do título executivo.

3.     A inclusão dos acionistas no pólo passivo da demanda é medida que se impõe, cabendo-lhe deduzir sua defesa em sede de embargos à execução.

4. A exceção de pré-executividade não se presta a tal mister, vez que a pretensão exige dilação probatória com a finalidade de afastar a responsabilidade tributária do ex-sócio pela dívida da empresa.

5. Agravo provido.

XV) Origem: TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Classe: AG - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 162209
Processo: 200203000363942 UF: SP Órgão Julgador: QUINTA TURMA
Data da decisão: 24/05/2004 Documento: TRF300085199. DJU DATA:17/09/2004 PÁGINA: 629. JUIZA RAMZA TARTUCE.

PROCESSUAL CIVIL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - EXECUÇÃO FISCAL – DÉBITO PREVIDENCIÁRIO - SOCIEDADE POR COTAS DE RESPONSABILIDADE LIMITADA - SOLIDARIEDADE - ARTIGO 13 DA LEI 8620/93 - ART. 124 E PARÁGRAFO ÚNICO DO CTN - 135 DO CTN - INCLUSÃO DOS SÓCIOS NO POLO PASSIVO DA DEMANDA - ADMISSIBILIDADE. AGRAVO PROVIDO.

1.Evidenciada a tempestividade do presente agravo, porquanto a jurisprudência admite embargos de declaração contra decisão interlocutória, não se podendo aceitar a tese de que se tratou de mero pedido de reconsideração, que não teria o condão de suspender o prazo para a interposição do recurso.

2. As pessoas constantes da certidão da dívida ativa,  a empresa devedora e seus sócios, estão legitimadas para figurar no pólo passivo da execução,  nos termos do art. 4º da Lei de Execução Fiscal.

3. Consoante o art. 13 da Lei 8.620/93, o sócio é solidariamente responsável pelos débitos previdenciários contraídos pela sociedade por cotas de responsabilidade limitada, sendo que esta solidariedade não comporta benefício de ordem (parágrafo único do artigo 124 do CTN), de modo que não há que se falar em desconsideração da pessoa jurídica, pois o fisco poderá cobrar a dívida de qualquer pessoa constante do título executivo.

4. A inclusão dos sócios no pólo passivo da demanda é medida que se impõe, cabendo-lhe deduzir sua defesa em sede de embargos à execução.

5. Agravo provido.

 

XVI) Origem: TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Classe: AG - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 188999
Processo: 200303000575652 UF: SP Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA. Data da decisão: 16/03/2004 Documento: TRF300081360. DJU DATA:02/04/2004 PÁGINA: 258.      JUIZA CECILIA MELLO.

EMENTA:

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO: RESPONSABILIDADE DIRETA DOS SÓCIOS PELOS DÉBITOS TRIBUTÁRIOS DA SOCIEDADE. EXCEPCIONALIDADE.

I     -     A responsabilidade direta dos sócios pelos débitos tributários empresariais só ocorre caso a sociedade seja irregular ou por atos praticados com infração à lei ou com excesso de poderes, nos termos do artigo 135, do CTN.

II     -      Os sócios respondem, nos demais casos, com seu patrimônio pessoal de forma subsidiária, seja qual for o tipo societário, se não houver patrimônio suficiente da sociedade para arcar com os débitos, ante a ocorrência de atos tendentes a fraudar os credores ou a própria execução, os quais devem resultar na desconsideração da pessoa jurídica.

III     -     A responsabilidade dos sócios frente aos débitos empresariais junto ao INSS, descrita no artigo 13, da Lei 8620/93, somente será solidária por dolo ou culpa, consoante o preceito do parágrafo único.

IV     -     Agravo improvido.

 

XVII) Origem: TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Classe: AG - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 171346
Processo: 200303000017424 UF: SP Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA
Data da decisão: 09/03/2004 Documento: TRF300081239. DJU DATA:26/03/2004 PÁGINA: 404. JUIZA CECILIA MELLO.

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO: RESPONSABILIDADE DIRETA DOS SÓCIOS PELOS DÉBITOS TRIBUTÁRIOS DA SOCIEDADE. EXCEPCIONALIDADE. BENS PENHORADOS INÁBEIS À GARANTIA DO JUÍZO. ARTIGO 620 DO CPC.

PRINCÍPIO DA MENOR ONEROSIDADE. ALCANCE EFINALIDADE.INADMISSIBILIDADE.

I - A responsabilidade direta dos sócios pelos débitos tributários empresariais só ocorre caso a sociedade seja irregular ou por atos praticados com infração à lei ou com excesso de poderes, nos termos do artigo 135, do CTN.

II - Os sócios respondem, nos demais casos, com seu patrimônio pessoal de forma subsidiária, seja qual for o tipo societário, se não houver patrimônio suficiente da sociedade para arcar com os débitos, ante a ocorrência de atos tendentes a fraudar os credores ou a própria execução, os quais devem resultar na desconsideração da pessoa jurídica.

III - A responsabilidade dos sócios frente aos débitos empresariais junto ao INSS, descrita no artigo 13, da Lei 8620/93, somente será solidária por dolo ou culpa, consoante o preceito do parágrafo único.

IV - O artigo 620 do CPC, que consagra o princípio da menor onerosidade, não visa proteger o devedor, cuja única preocupação é privar o credor daquilo que lhe é devido, atentando contra a efetividade do processo.

V - A finalidade precípua do princípio da menor onerosidade é assegurar a defesa do patrimônio do executado de boa-fé, possibilitando a satisfação do débito de forma menos gravosa e, conseqüentemente, mais justa.

VI - Inadmissível a aceitação dos bens oferecidos conquanto não haja, no caso concreto, demonstração de que estes viabilizarão a satisfação do crédito do exeqüente.

VII - Agravo parcialmente provido.

 

XVIII) Origem: TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Classe: AG - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 168139
Processo: 200203000489676 UF: SP Órgão Julgador: QUINTA TURMA
Data da decisão: 04/08/2003 Documento: TRF300077540. DJU DATA:18/11/2003 PÁGINA: 371. JUIZA RAMZA TARTUCE.

AGRAVO DE INSTRUMENTO -  EXECUÇÃO FISCAL - SOCIEDADE POR COTAS DE RESPONSABILIDADE LIMITADA - SOLIDARIEDADE - ARTIGO 13 DA LEI 8620/93 - ART. 124 E § ÚNICO DO CTN - 135 DO CTN - INCLUSÃO DOSSÓCIOS NO POLO PASSIVO DA DEMANDA - ADMISSIBILIDADE - QUEBRA DO SIGILO FISCAL - NORMA DE EXCEÇÃO - NÃO LOCALIZAÇÃO DE BENS - EXPEDIÇÃO DE OFÍCIOS - ADMISSIBILIDADE - AGRAVO REGIMENTAL PREJUDICADO - AGRAVO IMPROVIDO.

1. Resta prejudicado o agravo regimental, onde se discute os efeitos em que o recurso foi recebido, em face do julgamento do agravo de instrumento.

2. Consoante o art. 13 da Lei 8.620/93, o sócio é solidariamente responsável pelos débitos previdenciários contraídos pela sociedade por cotas de responsabilidade limitada, sendo que esta solidariedade não comporta benefício de ordem (parágrafo único do artigo 124 do CTN), de modo que não há que se falar em desconsideração da pessoa jurídica, pois o fisco poderá cobrar adívida de qualquer pessoa constante do título executivo.

3. A inclusão dos sócios no pólo passivo da demanda é medida que se impõe, cabendo-lhe deduzir sua defesa em sede de embargos à execução.

4. A quebra do sigilo fiscal constitui norma de exceção, porquanto assegurado pela Constituição Federal o caráter sigiloso das informações (artigo 5º, inciso X da Constituição Federal).

5. A expedição de ofícios à Receita Federal, com o objetivo de investigar a existência de bens que possam garantir a execução, depende de autorização judicial e somente se justifica na hipótese de ter o exeqüente esgotado os meios dos quais pode dispor para localizar o devedor e ou bens para garantia da execução.

6. O credor não está obrigado a aceitar bens localizados em foro diverso da Comarca onde tramita a execução fiscal, ainda mais quando não restar comprovada a propriedade dos bens imóveis indicados. (art. 656, incisos III e IV do Código de Processo Civil).

7. Restando, demonstrado, nos autos, que até a presente data a exeqüente  não logrou êxito na localização de bens, resta plenamente justificada a quebra do sigilo fiscal.

8. Agravo improvido.

 

 

XIX) Origem: TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Classe: AG - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 156579
Processo: 200203000263741 UF: SP Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA. Data da decisão: 29/04/2003 Documento: TRF300072397. DJU DATA:04/06/2003 PÁGINA: 237. JUIZ ARICE AMARAL.

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RESPONSABILIDADE DIRETA DOS SÓCIOS PELOS DÉBITOS TRIBUTÁRIOS DA SOCIEDADE. EXCEPCIONALIDADE.

I-A responsabilidade direta dos sócios pelos débitos tributários empresariais só ocorre caso a sociedade seja irregular ou por atos praticados com infração à lei ou com excesso de poderes, nos termos do artigo 135, do CTN.

II- Os sócios respondem, nos demais casos, com seu patrimônio pessoal de forma subsidiária, seja qual foi o tipo societário, se não houver patrimônio suficiente da sociedade para arcar com os débitos, ante a ocorrência de atos tendentes a fraudar os credores ou a própria execução, os quais devem resultar na desconsideração da pessoa jurídica.

III-A responsabilidade dos sócios frente aos débitos empresariais junto ao INSS, descrita no artigo 13, da Lei 8620/93, somente será solidária por dolo ou culpa, consoante o preceito do parágrafo único.

IV-Agravo improvido.

 

XX) Origem: TRIBUNAL - TERCEIRA REGIÃO
Classe: AG - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 128623
Processo: 200103000098981 UF: SP Órgão Julgador: SEGUNDA TURMA. Data da decisão: 01/04/2003 Documento: TRF300072110. DJU DATA:21/05/2003 PÁGINA: 268. JUIZ ARICE AMARAL.

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RESPONSABILIDADE DIRETA DOS SÓCIOS PELOS DÉBITOS TRIBUTÁRIOS DA SOCIEDADE. EXCEPCIONALIDADE.

I-A responsabilidade direta dos sócios pelos débitos tributários empresariais só ocorre caso a sociedade seja irregular ou por atos praticados com infração à lei ou com excesso de poderes, nos termos do artigo 135, do CTN.

II- Os sócios respondem, nos demais casos, com seu patrimônio pessoal de forma subsidiária, seja qual foi o tipo societário, se não houver patrimônio suficiente da sociedade para arcar com os débitos, ante a ocorrência de atos tendentes a fraudar os credores ou a própria execução, os quais devem resultar na desconsideração da pessoa jurídica.

III-A responsabilidade dos sócios frente aos débitos empresariais junto ao INSS, descrita no artigo 13, da Lei 8620/93, somente será solidária por dolo ou culpa, consoante o preceito do parágrafo único.

IV-Agravo improvido.

XXI) Origem: TRIBUNAL - QUARTA REGIÃO
Classe: AC - APELAÇÃO CIVEL - 195588
Processo: 9704395817 UF: SC Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA
Data da decisão: 03/08/2000 Documento: TRF400077220. DJU DATA:06/09/2000 PÁGINA: 120 DJU DATA:06/09/2000. JUIZ GUILHERME BELTRAMI.

PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS DE TERCEIRO. EXTINÇÃO DE UMA EMPRESA E CONSTITUIÇÃO DE OUTRA. DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA JURÍDICA.

Caracterizado que a constituição da pessoa jurídica se deu para substituir pessoa jurídica que se extinguiu com o fim de fraudar credores, desvirtuada a finalidade do instituto, que seria agregar vontades e meios para consecução de um fim societário, é caso de desconsiderar a pessoa jurídica nova e considerar todos os atos praticados, seja em face da pessoa jurídica anterior seja da nova, como praticados perante a mesma pessoa, prosseguindo-se na execução com a penhora sobre bem da nova empresa.

Cabível a condenação em litigância de má-fé na hipótese da pessoa jurídica que, constituída com ânimo de fraudar credores, vem embargar de terceiro a execução.

XXII) Origem: TRIBUNAL - QUARTA REGIÃO
Classe: AMS - APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA - 56396
Processo: 199904010020570 UF: RS Órgão Julgador: TERCEIRA TURMA
Data da decisão: 27/09/1999 Documento: TRF400073781. DJU DATA:27/10/1999 PÁGINA: 112. JUIZA MARGA INGE BARTH TESSLER.

ADMINISTRATIVO. PESSOA JURÍDICA.  INSCRIÇÃO NO CGC.  RESTRIÇÃO DAINSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 112/94.  INAPLICABILIDADE.

1. Mantida a sentença que concedeu a ordem para que a Receita Federal não obstaculize a alteração no cadastro da impetrante, pois, na teoria geral referente às sociedades comerciais, a pessoa jurídica tem personalidade distinta da personalidade de seus sócios,  que, só em casos excepcionais de prática de atos fraudulentos ou abusivos, respondem pessoalmente pelas obrigações assumidas pela   pessoa jurídica. 2. A Teoria da Desconsideração da Pessoa Jurídica não pode ser aplicada ao presente caso, pois não restou comprovado que o débito para com o Fisco é devido a ato fraudulento ou abusivo do sócio que   pretende fazer parte da empresa-impetrante.3. A Instrução Normativa nº 112/94 contém, no seu art. 2º, evidente restrição à liberdade de exercício de atividade profissional, mas mesmo que isso seja superado, esse ato normativo não poderia ser       aplicado à hipótese desses autos porque quem está em débito é a pessoa jurídica, e não o seu sócio que agora tem a intenção de fazer parte do quadro de sócios da impetrante.4. Apelação e remessa oficial improvidas.

XXIII) Origem: TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
Classe: AC - Apelação Cível - 303964
Processo: 200205000235397 UF: PB Órgão Julgador: Primeira Turma
Data da decisão: 07/10/2004 Documento: TRF500087163   DJ - Data::10/11/2004 - Página::1045 - Nº::216. Desembargador Federal Francisco Wildo.

TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE TERCEIRO. RESPONSABILIDADE DE EX-SÓCIO. INCIDÊNCIA DO ART. 135, III, DO CTN.

- A doutrina da desconsideração da pessoa jurídica, em matéria tributária, só se dá nas hipóteses de dissolução irregular da sociedade ou quando se comprova infração à lei praticada pelo sócio-gerente, administrador, diretor ou equivalente nos termos do art. 135, III, do CTN. Se o embargante sofreu constrição judicial em bem de sua posse, sem que fosse parte em processo de execução, plenamente cabíveis os embargos de terceiro, para salvaguardar sua posse, não havendo razão jurídica para que permaneça o bem em constrição judicial.

- Apelação improvida.

XIV) Origem: TRIBUNAL - QUINTA REGIAO
Classe: AC - Apelação Cível - 302285
Processo: 200082000059272 UF: PB Órgão Julgador: Primeira Turma
Data da decisão: 30/09/2004 Documento: TRF500087161. DJ - Data::10/11/2004 - Página::1020 - Nº::216. Desembargador Federal Francisco Wildo.

 

TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. RESPONSABILIDADE DE EX-SÓCIO. ART. 133 DO CTN. APLICABILIDADE. INCIDÊNCIA DO ART. 135, III, DO CTN.

- A responsabilidade tributária do adquirente de fundo de comércio é integral, quando o alienante cessa a exploração da atividade, sendo, no máximo, subsidiária quando aquele prossegue no exercício da sua atividade empresarial, ou inicia nova atividade no prazo de seis meses (Art. 133, I do CTN).

- A doutrina da desconsideração da pessoa jurídica, em matéria tributária, só se dá nas hipóteses de dissolução irregular da sociedade ou quando se comprova infração à lei praticada pelo sócio-gerente, administrador, diretor ou equivalente nos termos do art. 135, III, do CTN.

- O simples inadimplemento não caracteriza infração legal. Inexistindo prova de que se tenha agido com excesso de poderes, ou infração de contrato social ou estatutos, não há falar-se em responsabilidade tributária do ex-sócio a esse título ou a título de infração legal.

- Apelação provida.

5. CONCLUSÕES

No estudo do tema não podemos afastar o entendimento de que a pessoa jurídica constitui mera ficção legal, que só passa a ser concretizada, no mundo jurídico, na pessoa de seus sócios.

Há de se considerar que a personalidade da pessoa jurídica não goza do privilégio de ser regida por um direito absoluto. Em conseqüência, ela encontra-se sujeita às teorias  da fraude contra credores e do abuso de direito.

Com a finalidade de evitar os efeitos da excessiva personalização das pessoas jurídicas, quando acobertadoras dos abusos e irregularidades perpetradas pelas pessoas dos sócios, os juristas criaram a teoria da desconsideração ou despersonalização da pessoa jurídica.

Essa postura doutrinária do Direito tem uma função objetiva: “superar a debilidade das forças humanas e a brevidade de suas vidas, possibilitando a conjugação de esforços, com vistas a propiciar a execução de ideais comunitários que os homens não lograram alcançar isoladamente”.

Com absoluta fidelidade às características da entidade, registra Maria Helena Diniz que "ante sua grande independência e autonomia devido ao fato da exclusão da responsabilidade dos sócios, a pessoa jurídica, às vezes, tem-se desviado de seus princípios e fins, cometendo fraudes e desonestidades, provocando reações doutrinárias e jurisprudenciais que visam coibir tais abusos: surge a figura da "desconsideração ou desestimação da pessoa jurídica".

Na verdade, a teoria da desconsideração da pessoa jurídica abre espaço para que o magistrado “considere os efeitos da personificação ou da autonomia jurídica da sociedade para atingir e vincular a responsabilidade dos sócios, com o intuito de impedir a consumação de fraude e abuso de direito cometidos, por meio da personalidade jurídica, que causem prejuízos ou danos a terceiros”.

Com razão, portanto, Domingos Afonso Krigerilho quando afirma: "A desconsideração da pessoa jurídica significa tornar ineficaz, para o caso concreto, a personificação societária, atribuindo-se ao sócio ou sociedade condutas que, se não fosse a superação, seriam imputadas à sociedade ou ao sócio respectivamente. Afasta a regra geral não por inexistir determinação legal, mas porque a subsunção, do concreto ao abstrato, previsto em lei, resultaria indesejável ou pernicioso aos olhos da sociedade."

Os princípios fundamentais que dominam a referida teoria são:

“a) não atribuição à pessoa dos sócios das condutas praticadas pela sociedade;

b) distinção entre patrimônio da sociedade e patrimônio dos sócios - quod debet universitas non debet singuli;

c) vida própria e distinta da de seus membros”.

1 NCC : novo Código Civil.

Anexos