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"A caixa-preta", o CNJ, sua composição e os avanços do poder judiciário - Edilson Santiago

sant“É preciso um controle externo do Judiciário; é preciso saber como funciona a caixa-preta desse Poder que se considera intocável" (...) “Este país precisa voltar a recuperar o sentido da Justiça para todos e a auto-estima. As instituições foram feitas para servir às pessoas, não se servir das pessoas”, pois "Queremos que a Justiça seja igual para todos e não uma Justiça que cuida com mais carinho dos que têm alguns contos de réis, como dizia Lampião em 1927." E mais: “Nós, homens livres, temos menos privilégios do que aqueles que estão condenados.” (Declarações do Presidente Lula, em solenidade no Espírito Santo, em 2003) 

Estas foram às declarações do Presidente Lula em solenidade realizada no Espírito Santo, em 2003. Lendo tal declaração, várias interpretações se podiam tirar, prefiro: a preocupação do chefe do executivo em aproximar e  tornar o funcionamento do poder judiciário conhecido e mais  próximo da sociedade.

Depois de mais de uma década tramitando no Congresso Nacional, finalmente foi promulgada a Reforma do Judiciário, em 31 de dezembro de 2004. E dentre as modificações introduzidas pela reforma, sobressai à criação de um órgão de controle administrativo e financeiro detodos os órgãos do Poder Judiciário, denominado Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Que foi instalado em 14/06/2005.

Embora incluído na estrutura constitucional do Poder Judiciário, o CNJ se qualifica como órgão de caráter administrativo, com duas ordens básicas de competências: de um lado, o controle da  2 atividade administrativa e financeira do Judiciário e, de outro, o controle ético-disciplinar de seus membros. O poder disciplinar conferido ao CNJ, como atividade administrativa, nos termos do artigo 103-B,  § 4º, inciso III, da Constituição Federal, está assim determinado:

“III - receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder Judiciário, inclusive contra seus serviços auxiliares, serventias e órgãos prestadores de serviços notariais e de registro que atuem por delegação do poder público ou oficializado, sem prejuízo da competência disciplinar e correcional dos tribunais, podendo avocar processos disciplinares em curso e determinar a remoção, a disponibilidade ou a aposentadoria com subsídios ou proventos proporcionais ao tempo de serviço e aplicar outras sanções administrativas, assegurada ampla defesa”;

 

Os tipos de procedimentos julgados pelo CNJ e suas formalizações estão previstos em seu Regimento Interno. Alguns procedimentos são levados a efeito pela Corregedoria Nacional de  Justiça. Vejamos: Inspeção (RICNJ, art. 48); Correição (RICNJ, art. 54); Sindicância (RICNJ, art. 60); Reclamação Disciplinar (RICNJ art. 67); Representação por Excesso de Prazo (RICNJ, art. 78) Avocação de Processo Disciplinar (RICNJ, art. 79) 

Outros procedimentos são distribuídos livremente entre os seus conselheiros, que poderão submetê-los ao Plenário para julgamento ou determinar o arquivamento liminar do  processo quando a matéria for flagrantemente estranha às finalidades do CNJ, bem como a pretensão for manifestamente improcedente, despida de elementos mínimos para sua compreensão ou quando ausente interesse geral. São eles: Procedimento Administrativo Disciplinar (RICNJ, art. 73); Revisão Disciplinar (RICNJ, art. 82); Consulta (RICNJ, art. 89); Procedimento de Controle Administrativo   3 (RICNJ, art. 91); Pedido de Providências (RICNJ, art. 109); Avocação de Processo Disciplinar (RICNJ, art. 79) “CNJ. Órgão administrativo posicionado na estrutura institucional do Poder Judiciário. Outorga ao CNJ, em sede constitucional, de jurisdição censória sobre juízes e órgãos do Poder Judiciário “situados, hierarquicamente, abaixo do STF” (ADI 3.367/DF).

Possibilidade, em tese, de imposição, a eles, de sanções disciplinares, notadamente daquelas previstas no art. 103-B, § 4°, III, da Constituição, como a aposentadoria compulsória, com subsídio proporcional ao tempo de serviço.” (MS 28.712-MC, Rel. Min. Celso de Mello, decisão monocrática, julgamento em 6-5-2010, DJE de 11-5-2010.) Até recentemente, era recorrente o discurso de que  a  "caixa-preta" do Judiciário precisava ser aberta. O bordão revelava a falta de transparência desse Poder, o desconhecimento de suas práticas administrativas, incluindo aí muitas das vezes, a ausência de atuação de seus os órgãos correcionais sobre seus próprios membros e a falta de controle pela sociedade sobre  o uso dos recursos públicos nele aplicado.

Apesar das críticas, o fato é que a criação do CNJ  obrigou o Judiciário a enfrentar questões urgentes sobre sua  atribuição, composição e função no Estado Democrático de Direito.

Para o bem ou para o mal, por provocação externa ou alimentada por divergências internas, o Judiciário começa a ter suas entranhas reveladas, em boa parte pela ação do CNJ. O Judiciário, como a vida em sociedade, é imperfeito, tem falhas que devem ser corrigidas, outras devem ser suprimidas. Todavia, não para "meter a mão na decisão do julgador ou de seu convencimento", mas para mostrar aos jurisdicionados a razão de sua existência e de sua utilidade.

Afinal a formação do estado brasileiro é republicana, e numa republica ninguém está acima do bem ou mal. O próprio estado pode ser condenado. Logicamente que seus agentes assim também, e neste aspecto, é sempre bom lermos, o que reza a lei que define os crimes de responsabilidade e regula seu processamento. Vimos num passado bem próximo, um presidente da república eleito democraticamente e legitimamente pelo voto popular ser destituído do cargo por um processo de impechiment. Por oportuno e a respeito do papel do CNJ, quanto ao controle ético-disciplinar dos integrantes do judiciário. Isto é, quanto à função da fiscalização dos seus deveres funcionais. Dentre as várias razões do seu surgimento, dois foram os motivos: O primeiro, porque as corregedorias em geral não funcionam bem.

Em segundo lugar, porque os integrantes dos tribunais não se submetem a corregedoria alguma. Com o advento do CNJ, para alguns, “famigerado” órgão de controle externo do judiciário, a sociedade, no exercício de seu “controle social”, tenta: combater toda espécie de  prática corporativista, nepotista, fisiológica e clientelista dos tribunais e de seus membros; erradicar as perseguições ideológico-funcionais sofridas por magistrados em sua atuação jurisdicional; impedir o "sucateamento" do Judiciário; melhorar o gerenciamento administrativo dos tribunais para que não faltem recursos humanos e materiais para alguns órgãos e abundem para outros; e, ainda, trocar experiências visando o aumento da eficiência e da eficácia da prestação jurisdicional.

Queixam-se alguns magistrados da atuação do Conselho, que o CNJ estaria expondo o Poder Judiciário perante a população de forma indevida. Esquecem que são os poucos maus integrantes da magistratura nacional, os reais responsáveis pela exposição, que acusam de indevidas. O Conselho Nacional de Justiça compõe-se de 15 (quinze) membros com mandato de 2 (dois) anos, admitida 1 (uma) recondução, sendo: dois são cidadãos, dois são advogados, dois são membros do Ministério Público e nove são juízes, dos quais três indicados pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), três indicados pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e três indicados pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

A Constituição não define critérios nem procedimentos para essas indicações, mas apenas a obrigação de que elas ocorram entre os meses de junho e julho. Cabe aqui ressaltar, que descabe cogitar de direito subjetivo à escolha para compor o CNJ. "(MS 25.393-AgR, Rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 2-4-2009, Plenário, DJE de 8-5-2009.) De acordo com o princípio republicano, a gestão dos órgãos públicos deve guiar-se por uma razão pública e não por interesses privados. A razão pública é sempre fruto de debate entre os diversos interlocutores da sociedade.

Segundo o princípio democrático, todos os cidadãos  devem, podem e são capazes de participar dessa deliberação para a formação da razão pública. Quanto maior a participação popular, maior a legitimidade do resultado do debate.

Nesse sentido, um processo de discussão pública sobre os futuros integrantes do CNJ é o único meio de garantir que sua composição respeite os princípios republicanos e democráticos  e possa implantar um novo modelo de gestão para o Judiciário. Cabe aqui, exaltar, as associações de classe sejam  de juízes, membros do Ministério Público, advogados, ou de categorias que não trabalham diretamente com o Direito, as organizações não governamentais, os movimentos populares, a imprensa, os   6 estudantes, os professores, enfim, todos os cidadãos para desempenharem um importante papel na catalisação desse processo. Por fim, caberá ao Senado, a quem incumbe aprovar os indicados,uma aferição rigorosa que tenha em foco os projetos e ideais que inspiraram as campanhas dos indicados e que surgiram do debate público sobre o CNJ, deixando de lado as razões personalistas, corporativas e político-partidárias.

As atribuições do Conselho exigem que sua composição esteja orientada por razões públicas, única forma de que o CNJ possa desempenhar sua função de fortalecer o Estado Democrático de Direito. Portanto pretender levar ao órgão pessoas desafinadas ou sem o compromisso de fazer valer as determinações constitucionais da existência do órgão é tentar apequenar o estado democrático de direito, é desviar a aspiração do “controle social” que a sociedade tanto lutou junto aos legisladores para a criação do órgão. É agir fora do ordenamento jurídico.

O CNJ não é, e não pode ser considerado um “órgão repressivo máximo”, muito menos, um “tribunal administrativo de exceção” contra a atuação funcional e disciplinar dos juízes e magistrados. Não há lugar para tal “temor”, em nosso estado democrático de direito. Só se justifica a atuação do CNJ, quando houver omissão por parte das instituições que foram, legalmente e originalmente instituídas com essa finalidade. Isto é quando não agirem de “ofício” ou prevaricarem em suas atribuições.

É sabido e fato notório que a maioria dos magistrados brasileiros (juízes, desembargadores e ministros), respeitam, agem com decoro, dignificam e honram a “toga” que ostentam.  Portanto jamais se sujeitarão as “eventuais chibatadas” por  venturas emanadas do CNJ. Porém, aos que agirem com dolo ou culpa, maculando a dignidade e o decoro imposto à magistratura, determinados pela vetusta Loman ou seu Código de Ética, às “chibatadas” do CNJ! Se erros eventualmente forem cometidos na atuação do Conselho, este está submetido à apreciação dos seus atos pelo STF, órgão máximo do Poder, que com certeza tem serenidade em efetuar as correções que sentir prudentes e necessárias.  A respeitabilidade da magistratura e o seu conceito ante a sociedade somente se darão quanto mais transparentes forem os dados revelados ao contribuinte que os mantém com uma carga tributária superior a 40% dos seus rendimentos. Vale aqui lembrar, que quem paga toda essa estrutura judiciária, e muitas das vezes não tão eficiente é o cidadão. O governo só tem sido eficaz ao espremer, até o bagaço, o contribuinte. Portanto, defender a atuação do Conselho Nacional de Justiça, na  esteira das atribuições e competências constitucionais que lhe foram conferidas, é assegurar que o Poder Judiciário adote providências transformadoras em prol da sociedade passíveis de garantir a prestação de bons e eficientes serviços públicos. O CNJ vem se afirmando como instituição, é um espaço para manifestações da cidadania e de operadores do direito.

O CNJ merece aplausos quando age contra decisões arbitrárias dos Tribunais e de suas Corregedorias.

O CNJ não pode se furtar de sua competência disciplinar e correcional em relação aos integrantes da magistratura. Ao contrário, como órgão administrativo de cúpula do Poder

Judiciário, deve dá-se respeito e servir de exemplo a todos os seus demais integrantes, agindo de forma pontual em casos concretos, ou mesmo editando normas. 

O CNJ atuará tanto menos quanto mais atuarem os tribunais em suas respectivas competências. E atuar significa dar andamento aos procedimentos, que devem ter começo, meio e fim. Hoje como cidadão, vejo a evidente mudança que sofre o poder judiciário, através do CNJ. Hoje o poder judiciário tem missão, visão e diretrizes administrativas e correcionais. E nesta toada, hoje temos como Corregedora Nacional de Justiça, a Ministra do STJ, Dra. Eliana Calmon, uma mulher que com seu jeito franco, destemido, corajoso e direto diz: “A credibilidade da Justiça não se consegue escondendo o que está errado embaixo do tapete”. “Só com o CNJ foi possível ter números, contar, calcular os custos e saber efetivamente o que está acontecendo. Quando se dizia que o Judiciário  é uma caixa preta, todos nós ficávamos muito zangados. Mas era, sim, uma caixa preta, inclusive para nós, porque não sabíamos quanto custava um processo. Nós não tínhamos dados comparativos porque os tribunais eram absolutamente independentes, como ilhas isoladas. Sem comparar, não há como saber o que é bom e o que é ruim. A gente só consegue mensurar comparando, principalmente quando se trata de trabalho intelectual”. (Em entrevista a Revista Consultor Jurídico de 17/10/2010).

Portanto, o Conselho Nacional de Justiça é a novidade mais importante que ocorreu na República Brasileira. É vitória da cidadania na busca da Justiça plena.

BEM VINDO O C.N.J. ! DEFENDAMOS O C.N.J. !

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