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A Arbitragem no Brasil - Evolução Histórica e Conceitual - José Augusto Delgado

image0021. INTRODUÇÃO

A análise da evolução histórica e conceitual da arbitragem no ordenamento jurídico brasileiro há de ser antecedida com a visão da sua prática pelos povos antigos.

Alguns doutrinadores afirmam ser inútil procurar compreender-se a arbitragem nas civilizações do passado, em face das diferentes configurações que ela assumia, como via de solução de conflitos.

Sálvio de Figueiredo Teixeira[1], em perfeita síntese, relata o resultado de aprofundado estudo que realizou sobre a presença da arbitragem em várias ordens jurídicas dos povos antigos. Eis a sua manifestação:

“Historicamente, a arbitragem se evidenciava nas duas formas do processo romano agrupadas na ordo judiciorum privatorum: o processo das legis actiones e o processo per formulas. Em ambas as espécies, que vão desde as origens históricas de Roma, sob a Realeza (754 a.C.) ao surgimento da cognitio extraordinária sob Diocleciano (século III d.C.), o mesmo esquema procedimental arrimava o processo romano: a figura do pretor, preparando a ação, primeiro mediante o enquadramento na ação da lei e, depois, acrescentando a elaboração da fórmula, como se vê na exemplificação de Gaio, e, em seguida, o julgamento por um iudex ou arbiter, que não integrava o corpo funcional romano, mas era simples particular idôneo, incumbido de julgar, como ocorreu com Quintiliano, gramático de profissão e inúmeras vezes nomeado arbiter, tanto que veio a contar, em obra clássica, as experiências do ofício.

Esse arbitramento clássico veio a perder força na medida em que o Estado romano se publicizava, instaurando a ditadura e depois assumindo, por longos anos, poder absoluto, em nova relação de forças na concentração do poder, que os romanos não mais abandonaram até o fim do Império.

Nesse novo Estado romano, passa a atividade de composição da lide a ser completamente estatal. Suprime-se o iudex ou arbiter, e as fases in jure e apud judicem se enfeixam nas mãos do pretor, como detentor da auctoritas concedida do Imperador - donde a caracterização da cognitio como extraordinária, isto é, julgamento, pelo Imperador, por intermédio do pretor, em caráter extraordinário.

Foi nesse contexto, como visto, que surgiu a figura do juiz como órgão estatal. E com ela a jurisdição em sua feição clássica, poder-dever de dizer o Direito na solução dos litígios.

A arbitragem, que em Roma se apresentava em sua modalidade obrigatória, antecedeu, assim, à própria solução estatal jurisdicionalizada.

Com as naturais vicissitudes e variações históricas, veio ela também a decair importância no Direito europeu-continental, ou civil-law, persistindo forte a técnica de composição puramente estatal dos conflitos. Mas subsistiu como técnica, em razoável uso, paralelamente à negociação e à mediação, no âmbito do common law, o direito anglo-americano - marcado por profunda influência liberal, fincada no empirismo de Francis Bacon e de juristas do porte de Blackstone, Madison, Marshall, Holmes e Cardozo, aos quais jamais seria infensa a utilização de válida forma de solução de litígios, como o arbitramento -, até chegar aos tempos contemporâneos, em que retoma força e passa a ser verdadeiro respiradouro da jurisdição estatal, como observou com a acuidade de sempre Sidnei Agostinho Beneti, para quem "a arbitragem vem sendo largamente utilizada no âmbito do comércio internacional, que dela atualmente não poderia prescindir 'em sua modalidade contratual, à vista da inexistência de jurisdição estatal que sobrepaire sobre as relações internacionais', experimentando-se desenvolvimento extraordinário do instituto no âmbito interno de cada país.[2]

Nesse sentido as experiências de utilização da arbitragem nos Estados Unidos, bem relatadas em coletânea de estudos especialmente a ela destinados pelo The Justice System Journal (1991, vol. 14, pág. 2,), a exibir as várias formas de arbitramento, inclusive as denominadas Court-Annexed Arbitration e Court Ordered Arbitration, vale dizer, com determinação judicial de uso do arbitramento, realizada pela própria Corte, em substituição ao próprio julgamento.[3] Daí, o rental judge (‘juiz de aluguel’), a mostrar, segundo o relato norte-americano, o acerto das partes em torno da submissão do conflito ao julgamento de cidadão contratualmente investido na função de dirimir-lhes o conflito - atuando, ao que se noticia, nesses casos, profissionais respeitáveis do Direito, entre os quais advogados, promotores e juízes aposentados.

Está-se, no âmbito do Direito anglo-americano, no campo da ADR (Alternative Dispute Resolution), isto é, mecanismos paraestatais de solução de controvérsias jurídicas ou, se se quiser o encaixe na pura doutrina processual de filiação peninsular, mecanismos paraestatais de composição da lide, já se falando até mesmo na substituição da expressão ‘meios alternativos de soluções de conflitos’ por ‘meios propícios a soluções de conflitos’.[4]

Pedro A. Batista Martins[5], em exame também valioso sobre a prática da arbitragem no passado pelos povos antigos, afirma que ela foi “utilizada pelos povos desde a mais remota antigüidade, quando a desconfiança recíproca e as diferenças de raça e religião tornavam precárias as relações entre os povos.”

Do estudo que efetuou sobre a evolução histórica da arbitragem, firmou a convicção de que a arbitragem é um instituto que existiu e produziu efeitos mesmo antes que surgisse o legislador e o juiz estatal.

O referido autor identifica a presença da arbitragem, nos séculos pretéritos:

  1. a) na Grécia antiga, em face de ter constatado que o “tratado firmado entre Espanha e Atenas, em 455 a. C., já continha cláusula compromissória, o que evidencia a utilização desse instituto por aquele povo e, também, a sua eficácia como meio de solução pacífica dos conflitos de interesse”;[6]
  2. b) na Roma antiga, em razão do sistema adotado de se estimular o “iudicium privatum-judez” (lista de nomes de cidadãos idôneos), cujo objetivo era de solucionar, em campo não judicial, os litígios entre os cidadãos;
  3. c) nas relações comerciais assumidas durante o Séc. XI, pela posição dos comerciantes em resolver os seus conflitos fora dos tribunais, com base nos usos e nos costumes.

 

O autor observa, ainda, que a arbitragem não foi muito considerada durante o transcorrer dos séculos XVI e XVII, tendo, porém, retomado o seu prestígio no século XVIII, para , finalmente, ter sofrido restrições no curso do Século XIX, por haver assumido, em decorrência das reformas legais instituídas por Napoleão, forma burocratizada exagerada.

Pedro A. Batista Martins, concluindo essa parte dos seus estudos sobre o tema, afirma:

“Contudo, já no final do século XIX o interesse pela arbitragem é renovado, e sua utilização plenamente revigorada no século XX, com a ratificação de tratados sobre a matéria e a inserção do instituto na grande maioria dos sistemas jurídicos nacionais.”[7]

Na era contemporânea, a arbitragem é instituto utilizado, com êxito, em vários países.

Na Argentina, em decorrência da vigência da Lei nº 24.573, há o estabelecimento da exigência da mediação, em caráter obrigatório, antes do ingresso de qualquer ação em sede civil ou comercial.

Saliente-se que o Código Processual Civil e Comercial da Argentina, em seus arts. 736 a 773, e os Códigos de Procedimentos Civil e Comercial de cada uma das Províncias Argentinas prevêem a arbitragem.

No Paraguai, a arbitragem está inserida no seu Código de Processo Civil, por via dos arts. 774 a 835.

O Código Geral de Processo da República Oriental do Uruguai regula a arbitragem nos arts. 472 a 507.

A arbotragem, nos EE. UU., tem expansão de longo alcance.

José Maria Rossine Garcez[8], ao analisar as regras de arbitragem do “American Arbitration Association - AAA”, escreveu (pá. 170, ob. citada, no rodapé):

“A prática da arbitragem se expandiu invulgarmente nos Estados Unidos graças ao trabalho que desenvolve naquele país a American Arbitration Association - AAA, que conta com um grupo de mais de 57.000 árbitros e 35 sedes físicas que oferecem a logística adequada para o desenvolvimento dos procedimentos arbitrais em todos os estados norte-americanos. A AAA é uma instituição privada, sem fins lucrativos, que oferece serviços ao público na administração de arbitragens, em que têm sido predominantes os casos laborais e de responsabilidade civil, além das disputas em questões internacionais de natureza comercial.

As regras de arbitragem internacional da AAA foram revisadas e se encontram em vigor desde 1º de março de 1992, dispondo, em 37 artigos, sobre os procedimentos a serem adotados nessas arbitragens.

No preâmbulo, o Regulamento recomenda que as partes que queiram submeter suas controvérsias às regras administradas pela AAA introduzam em seus contratos uma cláusula cuja redação indique, simplesmente, que se aplicam à solução controvérsias deles originadas as International Arbitration Rules of the America Arbitration Association. As partes, segundo sugere a AAA, podem ainda acrescentar: a) o número de árbitros que atuarão (um a três); b) o local onde a arbitragem se realizará (cidade e/ou país); c) a língua em que a arbitragem será expressada.

Sob as regras da AAA as partes acham-se livres para adotar qualquer acordo mutuamente aceitável para a indicação futura dos árbitros ou podem, desde logo, nomear tais árbitros. Podem as partes indicar também que a controvérsia será resolvida por um árbitro único ou por um tribunal de três ou mais árbitros, sempre em número ímpar. Elas também podem preferir que a AAA designe os árbitros, ou que cada parte escolha um árbitro e que estes, entre si, nomeiem um terceiro, verificando a AAA se o tribunal arbitral assim formado está conforme as regras aplicáveis. Podem também as partes ajustar que a AAA submeta a elas uma lista de árbitros, da qual elas retirarão os nomes que lhes pareçam inaceitáveis, ou, ainda, podem delegar à AAA a escolha dos árbitros, sem exigir lhes que seja submetida qualquer lista.

De acordo com o art. 2º das Regras da AAA, os procedimentos da arbitragem começam na data em que o requerimento da parte que deseja iniciá-lo é recebido pelo administrador da AAA, o qual enviará comunicado às partes a respeito, dando-lhes ciência deste início. A defesa deverá então ser apresentada nos 45 dias seguintes. Conforme o art. 15, o tribunal arbitral tem o poder de decidir sobre a existência ou validade da Convenção de Arbitragem, ou de determinar sobre a validade do contrato no qual a cláusula arbitral tenha sido inserida, dispondo ainda tal artigo que as objeções à arbitrabilidade de uma reclamação devem ser apresentadas num prazo não superior a 45 dias do início do procedimento arbitral.

No art. 28 encontra-se prevista a regra de que o tribunal (2) exporá as razões em que se baseia a decisão, exceto se as partes houverem convencionado que tais razões não devam ser reveladas e (3) somente tornará pública a decisão arbitral se as partes convencionarem neste sentido ou caso tal providência resultar da lei.

Conforme o art. 29 (1) o tribunal arbitral aplicará a lei substantiva que as partes tenham designado para a solução da controvérsia e na hipótese de não ter sido indicada qualquer lei ou caso o tenha sido feita imperfeitamente, o tribunal poderá aplicar a lei que julgar conveniente. De acordo com o mesmo artigo, no numeral 2, nas arbitragens envolvendo contratos o tribunal decidirá de acordo com os termos do contrato, levando em consideração a feição dos negócios ao mesmo aplicáveis. O tribunal não decidirá como compositor amigável (amiable compositeur) ou ex aequo et bono (3) exceto se as partes assim o autorizem.

Na conformidade do art. 31, dentro de 30 dias da ciência da decisão, a parte poderá requerer ao tribunal que a interprete ou que corrija algum defeito decorrente da atividade da secretaria, erro tipográfico ou de computação, ou que apresente uma decisão aditiva à mesma sobre pontos requeridos mas não abrangidos pela decisão.”

Demonstrando o alto conceito atual da arbitragem nos países de maior expressão no planeta, o mesmo autor explicita (fls. 171 e 172 da obra citada):

“Além da CCI e da AAA diversas outras entidades dedicadas à organização e administração de arbitragens podem ser citadas, como a London Court of Arbitration; a Câmara de Comércio de Estocolmo; a Câmara de Comércio de Tóquio; o Tribunal Arbitral da Bolsa de Comércio de Buenos Aires; a Câmara de Comércio, Indústria e Produção da República Argentina; o Tribunal Arbitral do Colégio Público de Advogados de Buenos Aires.

No Brasil se podem contar, dentre outras, a Comissão de Arbitragem da Associação Comercial do Rio de Janeiro; a Comissão de Arbitragem da Câmara de Comércio do Paraná; a Câmara de Mediação e Arbitragem de São Paulo (FIESP); a Comissão de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional de Minas Gerais e a Comissão de Arbitragem da Câmara de Comércio Brasil-Canadá).”[9]4-5

Ao comentar, a seguir, a decisão da UNCITRAL[10] que, em 11/12/1985, pela Resolução nº 40/72, em sua Assembléia Geral na 112ª Reunião, aprovou uma Lei Modelo de Arbitragem[11], afirmou, ainda, José Maria Rossani Garcez, pág. 172, ob. citada, que:

“Além das Regras sobre Arbitragem antes referidas, a Uncitral aprovou, pela Resolução nº 40/72, em sua Assembléia Geral na 112ª Reunião Plenária, de 11 de dezembro de 1985, uma Lei-Modelo de Arbitragem, preparada em regime de consultas com entidades arbitrais e experts internacionais da área, com o objetivo de poder ser aceita e adaptada pelos Estados e assim contribuir para o desenvolvimento harmônico das relações comerciais e a criação de um framework internacional. A Lei-Modelo, em 36 artigos, se aplica à arbitragem comercial internacional, ficando esclarecido, em nota de rodapé ao numeral (1) do artigo primeiro, que ao termo ‘comercial’ é dada uma ampla interpretação, para cobrir todas as relações de natureza comercial, sejam elas contratuais ou não.

Um estudo levado a efeito pelo Professor Pieter Sanders (Professor emeritus na Universidade de Rotterdam, artigo constante do vol. II nº 1 do Arbitration International, LCIA, 1995), registra que o impacto da Lei-Modelo é tão elevado que praticamente nenhum Estado que tenha modernizado seu sistema legislativo sobre arbitragem, após a sua edição, teria, inter alia, deixado de levá-la em consideração. Alguns Estados adotaram a Lei-Modelo por inteiro, outros se adaptaram a maior parte de suas provisões, de forma que existem países que podem ser caracterizados como países da Lei-Modelo (Model Law countries). Uma lista de 14 desses países que adotaram os standards da Lei-Modelo no período compreendido entre 1986 e 1994 é apresentada nesse estudo como adiante se reproduz, com registro do ano da adoção: Canadá (1986); Chipre (1987); Bulgária e Nigéria (1988); Austrália e Hong Kong (1989); Escócia (1990); Peru (1993); Bermuda, Federação da Rússia, México e Tunísia (1993); Egito e Ucrânia (1994). Além desses países, oito Estados norte-americanos adotaram também os padrões da Lei-Modelo: Califórnia, Connecticut, Florida, Georgia, North Carolina, Ohio, Oregon e Texas.[12]

Até 1995, quando o estudo do Professor Pieter Sanders foi realizado, 22 países haviam promulgado leis internas sobre arbitragem adaptando-as, substancialmente, aos padrões da Lei-Modelo.

Uma interessante nota sobre o tema é a de que, embora a Lei-Modelo haja sido concebida para arbitragens comerciais internacionais, isto não representa qualquer obstáculo a que os países utilizem seus standards para arbitragens domésticas. A adoção da Lei-Modelo num padrão idealizado para as arbitragens internacionais e em outro para as domésticas foi feita pela Bulgária, México, e Egito. Para o Canadá, este critério também se aplica, mas somente a nível federal e para a Província de Quebec.

Outra possibilidade é a de que, quando tenham adaptado a Lei-Modelo, os Estado criem a possibilidade de que as partes optem por seu regime, mediante ajuste entre elas, em relação às arbitragens domésticas. Isto atua de forma que se deva reordenar as dispositivos do art. 1º (3) (c) da Lei-Modelo, que se aplicam à arbitragem internacional. A lei de arbitragem da Escócia, por exemplo, permite que as partes acordem que a Lei-Modelo possa aplicar-se, não obstante não se trate de uma arbitragem internacional comercial. A Nigéria, através do Decreto de 1988 sobre Conciliação e Arbitragem, mudou a definição "internacional" contida na Lei-Modelo e, segundo tal mudança, as partes podem expressamente ajustar que, a despeito da natureza do contrato, a arbitragem seja tratada à feição da arbitragem internacional.

Ainda outra alternativa aplicada em vários países que adotaram a Lei-Modelo é que as partes possam, contrariamente, optar por solucionar suas pendências de natureza internacional comercial de acordo com regras expressamente excludentes da Lei-Modelo, utilizando-se das regras editadas para as arbitragens domésticas. Na Austrália, que adotou a Lei-Modelo, podem as partes excluir sua aplicação a tais casos, por escrito. Nas Bermudas, o Arbitration Act de 1993 contém disposição neste sentido, ainda com maior detalhamento.”

Essa notícia bem representa a importância da arbitragem para a solução dos conflitos, o que justifica o culto que a ela está sendo devotado por quase todas as Nações.

2 – A ARBITRAGEM NO BRASIL – EVOLUÇÃO:

A doutrina brasileira identifica a presença da arbitragem em nosso sistema jurídico desde a época em que o País estava submetido à colonização portuguesa.

Em ambiente puramente brasileiro, a arbitragem surgiu, pela primeira vez, na Constituição do Império, de 22/03/1924, em seu art. 160, ao estabelecer que as partes podiam nomear juizes–árbitros para solucionar litígios cíveis e que suas decisões seriam executadas sem recurso, se as partes, no particular, assim, convencionassem.

A CF de 24 de fevereiro de 1895, a primeira Carta Republicana, não cuidou de homenagear a arbitragem entre pessoas privadas. É certo que não deixou de incentivar a sua prática como forma útil para pacificar conflito com outros Estados soberanos.

A Carta de 16 de julho de 1934 voltou a aceitar a arbitragem, assegurando à União competência para legislar sobre as regras disciplinadoras do referido instituto.

A Constituição de 1937 não valorizou essa entidade jurídica. A Carta Magna de 1946, de 18 de julho, também não fez qualquer referência à arbitragem privada, tendo o mesmo comportamento a Lei Maior de 1967.

A atual CF, de 05/10/88, referiu-se sobre a arbitragem no art. 4º, § 9º, VII, bem como no art. 114, § 1º.

Saliente-se, contudo, que a Carta de 1988, no seu preâmbulo,[13] faz, a nível de princípio fundamental, homenagem à solução dos conflitos por meio de arbitragem, no pregar a forma pacífica de serem resolvidos, quer na ordem interna, quer na ordem internacional.

Pedro A. Batista Martins revela, no artigo já mencionado, que, em âmbito infraconstitucional, a arbitragem foi, pela primeira vez, introduzida no Brasil, no ano de 1831 e, em seguida, em 1837, para solucionar litígios relativos à locação de serviços, em caráter impositivo ou obrigatório; informa, a seguir, que ela foi regulada, em 1850, pelo Decreto nº 737, de 25 de novembro, para ser aplicada em dissídios existentes entre comerciantes, para ser consagrada no Código Comercial:

“Ainda nesse mesmo ano, o Código Comercial traz em seu bojo a figura do juízo arbitral e, seguindo a tendência já delineada no passado, prescreve-o de modo obrigatório às questões (i) resultantes de contratos de locação mercantil, (ii) suscitadas pelos sócios, entre si, ou com relação à sociedade, inclusive quanto à liquidação ou partilha, (iii) de direito marítimo, no que toca a pagamento de salvados e sobre avarias, repartição ou rateio das avarias grossas e (iv) relacionadas à quebra” (fl. 43).

A arbitragem foi regulada no Código de Processo Civil de 1939, com reprodução no atual Código de 1973. Tomou uma nova feição com a Lei nº 9.307/96, a denominada Lei Marco Maciel, por ter permitido que desenvolvesse a solução dos litígios fora do âmbito do Poder Judiciário. A atuação deste Poder ficou limitada, apenas, a situações determinadas para garantir o êxito da arbitragem como solução pacífica dos conflitos, por meio da mediação, da conciliação e do pronunciamento dos árbitros, tudo na área privada.

3 – A LEI Nº 9.307/96. ASPECTOS GERAIS:

No momento contemporâneo, a arbitragem no Brasil está regulada pela Lei nº 9307, de 23 de setembro do ano 1996, publicada no DOU de 29/09/96. Entrou em vigor 60 (sessenta ) dias depois. [14]

Há um esforço doutrinário de larga escala para que esse diploma legal produza efeitos concretos e de alta intensidade na busca do seu objetivo principal, que é a solução dos conflitos patrimoniais por vias não judiciais.

A utilização da arbitragem, no Brasil, está recebendo, em progressão geométrica, preferência de vários estamentos sociais.

As denominadas Cortes de Conciliação e Arbitragem, pela eficácia e efetividade demonstrada em suas atividades, considerando-se seus resultados, têm determinado a criação de um novo panorama para a solução dos litígios.

Exemplo de grande significação é o que está ocorrendo no Estado de Goiás.

A 1ª CCA de Goiânia, instalada em 1996, funcionando na Associação Comercial e Industrial, recebeu até junho de 1998, 3.718 reclamações; a 2ª Câmara de Goiânia, que funciona no Secovi-Goiás, no mesmo período, 8.036 reclamações; a 3ª, sediada na Sociedade Goiana de Pecuária e Agricultura, atendeu 344 reclamações.

No Estado de Goiás há, ainda, Câmaras de Conciliação e Arbitragem instaladas nos Municípios de Anápolis, Caldas Novas, Catalão.

Segundo dados estatísticos fornecidos pela Revista Indústria Imobiliária, em dois anos e meio de atividades, até julho de 1998, nas Cortes instaladas no Estado de Goiás, foram atendidas mais de 15.000 reclamações.

Convém registrar que as Cortes de Conciliação e Arbitragem, no Estado de Goiás, foram instaladas com apoio integral do Poder Judiciário, especialmente, do Des. Lafaiete Silveira, Presidente do TJ na época, e do Juiz José Arlindo Lacerda.

Considere-se, também, a defesa que parte da doutrina faz, hoje, da aplicação da arbitragem para solucionar conflitos trabalhistas.

O Jornal dos Advogados, março de 99, revelou (pág. 28) os pronunciamentos que a favor da arbitragem, na Justiça do Trabalho, fizeram ilustres e conceituados doutrinadores.

Os trechos da notícia em destaque merecem ser transcritos:

“O professor Cássio disse ser muito simpático ‘à idéia da arbitragem privada, porque: "uma breve análise dos sistemas jurídicos vai mostrando que, no mundo de nossos dias, nas sociedades mais desenvolvidas, a legislação é mínima e cabe às próprias partes estabelecerem os métodos de solução dos conflitos. Na área trabalhista, a negociação, atualmente, está desempenhando um papel preponderante, e a competência da Justiça do Trabalho nesses países, quando ela existe, se limita aos conflitos de Direito, porque se acredita que os juízes estão mais preparados para resolver conflitos decorrentes de interpretação e aplicação da Lei aos casos concretos do que questões que são, na verdade, estranhas ao Direito, como salário, produtividade, conjuntura econômica etc.’.

Para ele, nessas sociedades mais desenvolvidas, há uma consciência clara de que as regras jurídicas não são mais um solução satisfatória para os conflitos sociais, que são resolvidos pelas próprias partes envolvidas. Já, nas sociedades menos desenvolvidas há uma predominância quase absoluta da lei. O campo de negociação é mínimo e a solução do conflito cabe ao Judiciário, como acontece no Brasil. Esse esquema, segundo o referido professor, não corresponde à atual dinâmica das relações de trabalho. Cássio afirmou que a Organização Internacional do Trabalho (OIT) vem, há tempos, recomendando a adoção, nos casos de conflitos trabalhistas, da conciliação, da mediação e da arbitragem em vez da justiça pública. No Brasil, os conflitos coletivos de trabalho continuam sendo resolvidos pelo Judiciário, gerando perplexidade nos países desenvolvidos. A busca de soluções, em nosso País, conduziu ao estímulo para as negociações coletivas de trabalho, com a presença do mediador. O conciliador e o mediador, na prática, continuam exercendo as mesmas funções.

A arbitragem, que é privada e facultativa, segundo a Constituição, afirma: frustradas as negociações coletivas, as partes poderão eleger árbitros e, não alcançando essa conciliação, poderão instaurar o dissídio coletivo. "A nosso ver, parte considerável do processo civil e todo o Direito Comercial pode ser resolvida por meio da arbitragem que, por ser privada, tem inúmeras vantagens. A questão é saber se a Lei nº 9.307/96 , como ela está, é aplicável ao Direito do Trabalho?" Perguntou o professor. Ele se disse favorável a essa aplicação, citando o exemplo espanhol, que já inclui a possibilidade de existência da arbitragem, em caso de conflito, quando da celebração dos contratos de trabalho.

O segundo expositor foi o Professor Renato Rua, que também é advogado do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo. Rua fez um histórico dos princípios do Direito do Trabalho, iniciando pela Revolução Francesa e indo até a Comuna de Paris, passando pelo “Manifesto Comunista”, de Marx e Engels, até o fortalecimento dos sindicatos, principalmente após a 2a. Guerra Mundial e, finalmente, a atual globalização da Economia. Tudo isso , para chegar à atual primeira preocupação dos trabalhadores, que é a manutenção do emprego e a flexibilização das normas trabalhistas. Ele disse que existem duas vertentes, atualmente, para solucionar os conflitos trabalhistas: uma é a jurisdicional, por meio da Justiça do Trabalho; a outra é o entendimento entre as partes, por meio de conciliação, mediação ou arbitragem. Segundo o professor Rua, a conciliação pode se dar por duas maneiras: negociação direta ou atuação de um conciliador, que vai aproximar as partes. Não resolvido o conflito pela conciliação, se estabelece o mediador, que vai apresentar uma proposta. Ainda desta vez, não se conseguindo um acordo, vem a solução da arbitragem, por meio de um laudo arbitral.”

Mais adiante, o articulista registra:

“O terceiro expositor; professor Octávio Bueno Magano, que começou sua explanação com um poema de Camões, para ilustrar o tempo excessivo para que um trabalhador receba o veredicto de seu litígio trabalhista, disse que, para haver solução para esse problema, existiriam dois caminhos: a adoção da Súmula Vinculante ou a arbitragem. No caso da Súmula Vinculante, ele considera essa saída inconstitucional, pois o Judiciário estaria usurpando ‘poderes’ do Legislativo. Restando, assim, a arbitragem. Para Magano, a arbitragem não deve ser confundida com o arbitramento. Arbitragem é a decisão, a respeito de um litígio, tomada por pessoa ou pessoas, que hajam sido escolhidas pelos litigantes, enquanto arbitramento é a fixação de valores de determinado litígio, realizado por perito. A arbitragem tem três momentos bem distintos: a cláusula compromissória; o compromisso; e o laudo arbitral. Ela pode ser voluntária ou compulsória. Nos Estados Unidos existem entidades especializadas em arbitragem e os contratos de trabalho prevendo que, em caso de litígio, haverá a atuação de uma delas.

O Professor falou dos empecilhos que existiam para a adoção da arbitragem no Brasil, um deles era o costume brasileiro querer uma solução governamental para todo e qualquer problema, o outro era a falta de força coercitiva do laudo do árbitro que, para se tornar obrigatório, tinha de ser homologado, não valendo como título executório e, de qualquer forma, sujeito a recurso. Para ele, essas inconveniências foram sanadas pela Lei nº 9.307/96, que dispôs que cláusula compromissória vale como compromisso. Outro tópico que precisa ser registrado é que o laudo dispensa homologação e não cabe recurso. Magano discutiu, ainda, a constitucionalidade da aplicação da arbitragem no campo trabalhista, dizendo que, se foi objeto de convenção ou acordo coletivo, ela pode ser utilizada.”

Cláudio Viana de Lima, em artigo publicado no Jornal do Comércio – RJ, de 29/05/98, noticia que a Medida Provisória nº 1.619/42, de 13/03/98 (DOU de 14/03/98), que dispõe sobre a participação dos trabalhadores nos lucros ou resultados da empresa, regulamentando o art. 7º, XI, da CF, assegurou, em seu art. 4º, a prática da arbitragem. Transcrevo o comentário do autor: “ A Medida Provisória nº 1.619, de 13.03.98 (DOU de 14/03/98, pág. 3), “dispõe sobre a participação dos trabalhadores nos lucros ou resultados da empresa e dá outras providências”, convalidando os atos praticados com base na Medida Provisória nº 1.619-41, de 12/02/98 e a revogando. É regulamentação do art. 7º, XI, da Constituição Federal. Deseja-se focalizar, neste texto, o art. 4º da Medida Provisória referida, que vem sendo reproduzido das antecedentes. Está assim escrito: “Art. 4º: Caso a negociação visando à participação nos lucros ou resultados da empresa resulte em impasse, as partes poderão utilizar-se dos seguintes mecanismos de solução do litígio: I. mediação – II. arbitragem de ofertas finais.” O artigo define em seu § 1º: “Considera-se arbitragem de ofertas finais aquela em que o árbitro deve restringir-se a optar pela proposta apresentada, em caráter definitivo, por uma das partes.” Dispõe mais, o art. 4º, em exame, sobre a liberdade de escolha (por comum acordo entre as partes) do mediador ou do árbitro (§ 2º), a inadmissibilidade da desistência unilateral de qualquer das partes (§ 3º) e a força normativa , independentemente de homologação judicial, do laudo dos árbitros (§ 4º).”

Abre-se, portanto, na lei uma oportunidade para que os litígios decorrentes da participação dos trabalhadores nos lucros das empresas sejam resolvidos por meio da arbitragem.

4. – A ARBITRAGEM E A EVOLUÇÃO DO DIREITO FUNDAMENTAL

Em artigo anterior que escrevi sobre o tema, denominado “Arbitragem: um direito da cidadania”, afirmei o que transcrevo:

“O Direito Processual Civil , no decorrer dos últimos cem anos, alcançou o seu apogeu científico, especialmente, neste final de Século. Não se pode deixar sem reconhecimento a fortaleza dos princípios que o regem, tudo em decorrência dos resultados obtidos pelas investigações científicas na busca de encontrar a melhor estrutura para o seu funcionamento.

Estarrecedor , porém, é a constatação , especialmente, no Brasil, de um fato que causa profundas preocupações ao jurista. Tal se caracteriza pelo retrato de que quanto mais avançou a Ciência do Direito Processual mais ela se afastou dos anseios do cidadão. O seu envolvimento com princípios burocráticos levou-a a se afastar da adoção de uma metodologia de caráter gerencial e com resultados compatíveis com as reais necessidades de urgência impostas pelo mundo contemporâneo no referente a solução dos conflitos.

O Direito Processual Civil , na verdade, esqueceu-se de que ele é instrumento para servir ao cidadão na busca de se identificar com a paz. É apenas caminho e que necessita ser trilhado com segurança e rapidez.

As idéias de Noberto Bobbio não chamaram atenção desse campo do direito formal. O seu apego aos rigores da Ciência, o que se justifica pela necessidade de sua afirmação, afastou a sua preocupação de que, neste final de Século XX, o jurista há de se preocupar, de modo intenso, com o respeito aos direitos do homem.

Considere-se, em razão do afirmado, o registro de que Noberto Bobbio, na obra intitulada "A Era dos Direitos", Tradução de Carlos Nelson Coutinho, observa com absoluta precisão, por dominar inteiramente o campo explorado pela sua inteligência, que o homem do mundo atual está a exigir maior consciência da justiça, por aumentarem as situações em que os Direitos dos Homens são desrespeitados.

As novas dimensões do direito que são perseguidas por Noberto Bobbio, na obra referida, foram examinadas pelo Professor Vicente Barreto, da Universidade Gama Filho e da UERJ, em campo de filosofia política, em artigo publicado no Caderno/Idéias, pelo Jornal do Brasil de 21/03/92, de onde destaco a afirmação de que:

"A leitura do livro do professor Bobbio permite que se possa redimensionar o significado e a abrangência dos direitos fundamentais da pessoa humana, passados mais de 200 anos das primeiras declarações de direitos do homem e do cidadão. Nesses dois séculos, ocorreu um processo de explicitação de valores morais da humanidade, que para Bobbio faz com que o atual debate sobre os direitos do homem possa ser interpretado como um "sinal premonitório" desse progresso moral. Bobbio sustenta que, independentemente da discussão sobre o que se entende por moral, houve na doutrina dos direitos do homem uma grande evolução, ainda que submetida a negações e limitações."

A leitura vagarosa da obra de Bobbio revela, o que é bem destacado por Vicente Barreto, no artigo já citado, que a palavra "direitos" vem sendo usada somente com o efeito de se atribuir dignidade a ideais que, na prática, não são respeitados. Suficiente para se confirmar quanto irrepreensível é essa afirmação, basta ver o quadro levantado por Vicente Barreto, no curso do artigo citado, de Países que, atualmente, se encontram desrespeitando flagrantemente os direitos humanos.

A arbitragem, como meio processual para a solução dos conflitos, sem a presença do Poder Judiciário, visa consolidar os anseios daqueles que estão insatisfeitos com a demora na entrega da prestação jurisdicional, não só porque contribui para aumentar o grau de discórdia com o seu semelhante, mas, também, pelo fato de lhe ser negado o direito constitucional de ver o seu direito reconhecido em tempo razoável de ser possível o seu gozo e a sua fruição.

Tenho que a arbitragem é um direito processual de quarta geração. Ele se contrapõe aos sistemas até então adotados para solução de conflitos, onde a presença do Poder Judiciário era considerada indispensável.

O Direito Processual de primeira geração caracteriza-se pelo profundo apego ao formalismo, com regras inspiradas em aumentar o grau da segurança jurídica, porém, possibilitadoras de manobras processuais que favoreciam, especialmente, ao litigante de maior poder aquisitivo e que tinha interesse em fazer demorar o resultado da demanda.

O Direito Processual de segunda geração é representado pelo sistema que tentou, embora não tenha conseguido, romper com a burocracia processual. O seu mérito consiste em ter abolido determinadas formalidades processuais inúteis e ter consagrada a figura do Juiz ativo, isto é, comprometido com o apanhado das provas e com a justiça da decisão.

O Direito Processual de terceira geração é o que enfatiza a necessidade de se prestigiar as ações coletivas, especialmente, na proteção dos direitos difusos, estes voltados à proteção do meio ambiente, paisagístico, do consumidor, etc.

Por fim, vive-se, na época contemporânea, o Direito Processual de quarta geração, onde a arbitragem se situa. É a utilização de um instrumento voltado para a solução dos litígios sem a presença obrigatória do Poder Judiciário. É a própria sociedade, de modo organizado, aplicando o direito , utilizando-se das associações que a compõem. É uma nova era do Direito Processual que necessita evoluir até alcançar os denominados Tribunais de Vizinhança. É a busca de intensificação de outros meios de acesso do cidadão ao encontro da Justiça, por essa reivindicação se constituir em um direito constitucional de natureza subjetiva.

 Em “ACESSO À JUSTIÇA - DIREITO CONSTITUCIONAL DO CIDADÃO”, de minha autoria, escrevi:

“Cristaliza-se, no âmbito do moderno Direito Constitucional, a idéia de que o acesso à Justiça pelo cidadão se constitui um direito fundamental a ser protegido pelo Estado.

Fiel a essa evolução garantidora da cidadania, a nossa Carta Magna de 1988, seguindo tradição anterior, consagrou o acesso à Justiça, com esse teor axiológico, de modo explícito, ao determinar que "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito" (art. 5º, XXXV) e que "O Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos" (art. 5º, LXXIV).

O final do Século XX tem revelado uma constante preocupação da comunidade jurídica com o direito do cidadão de buscar, no âmbito do Poder Judiciário, a solução para a entrega rápida da prestação jurisdicional, hoje erigida, em nosso ordenamento legal, como direito substancial de caráter individual ou coletivo. A eficácia da prestação jurisdicional, ao lado da rapidez, tem sido, também, uma garantia do cidadão que se consagra como de natureza elevada no corpo de qualquer Carta Magna.

O legislador ordinário, preocupado em aprimorar o acesso à Justiça, pela constante reivindicação que em tal sentido é feita pela sociedade, tem criado ambiente de proteção à exeqüibilidade desse direito fundamental. Destaque merece, no particular, a conduta legislativa posta, como princípio, nos artigos 2º e 9º, da Lei nº 7.244/84 e nos artigos 5º, IV e 6º, VII, da Lei nº 8.078/90, visando facilitar o ingresso das partes na via judiciária e a rápida solução dos litígios.

O denominado direito constitucional à jurisdição tem sido defendido, no campo doutrinário, como sendo o mais "fundamental das obrigações estatais, cujo relevo é inconteste para que o indivíduo veja garantidos todos os seus direitos reconhecidos normativamente".

Essa a razão pela qual a doutrina contemporânea tem se preocupado, com forte intensidade, em abordar o tema e a difundir as idéias construídas a respeito, no sentido de sensibilizar o Estado para o cumprimento dessa suprema garantia do direito do cidadão.

Releva notar que a publicação de "Acess to Justice, Milão, Giuffré, 1978, em seis volumes, da autoria de Mauro Cappelletti e outros, representa um marco inovador na abordagem do assunto, a se considerar a mensagem fixada na obra de serem estabelecidas regras jurídicas, a partir da Constituição Federal de cada Nação, que contenham real efetividade no garantir o acesso à Justiça.

Não se pode deixar de registrar que o tema já tinha sido tratado por outros autores. Não obstante o valor das idéias plantadas e as reivindicações apresentadas para se buscar um aperfeiçoamento no tocante ao ingresso do jurisdicionado à Justiça, tenho que, só a partir dos últimos três decênios deste século, com o aumento da preocupação das Constituições Modernas com o cidadão, é que se formou uma conscientização metodológica sobre tal direito.

Nas meditações de Carmen Lúcia Antunes, a garantia do alcance aos órgãos jurisdicionais tem merecido uma abordagem constante, o que a levou a afirmar, com absoluta propriedade que "O primeiro passo para que a jurisdição seja um direito vivo é a garantia plena, facilitada e desembaraçada do acesso de todos aos órgãos competentes para prestá-la. A jurisdição é direito de todos e dever do Estado, à maneira de outros serviços públicos que neste final de século se tornaram obrigação positiva de prestação afirmativa necessária da pessoa estatal. A sua negativa ou a sua oferta insuficiente quanto ao objeto da prestação ou ao tempo de seu desempenho é descumprimento do dever positivo de que se não pode escusar a pessoa estatal, acarretando a sua responsabilidade integral."

Inspirado em tais ensinamentos, ouso firmar o entendimento de que qualquer dificuldade imposta pelo Estado ou surgida de sua atuação ineficiente no campo da entrega da prestação jurisdicional, quer ocorra no momento inicial do acesso à Justiça, quer ocorra na demora em decidir a causa, desde que ocasione dano ao jurisdicionado, gera responsabilidade civil.

O Estado, na época contemporânea, não pode amesquinhar a natureza da função jurisdicional. Consciente dessa realidade, afirmei, no ano de 1983, em trabalho identificado na nota abaixo[15], que "Não há, portanto, que se polemizar, na atualidade, sobre a responsabilidade potencializada do Estado em assegurar aos indivíduos as condições necessárias para a consecução do bem comum.

Para tanto, entre outras atividades que desenvolve, há de ser elencada a de entregar a prestação jurisdicional dentro dos prazos e limites que o sistema jurídico positivo instituiu. No particular, destaque-se que tal dever surge como conseqüência do princípio da legalidade, dogma a que está vinculada toda a ação estatal, por ser certo o axioma de direito de que a lei deve ser suportada, em primeiro plano, por aquele que a fez. Sendo a lei uma regra de conduta genérica oriunda do Estado, a este cabe o dever do seu integral cumprimento."

Mais adiante, no mesmo trabalho, acrescentei:

“A essência da atividade jurisdicional é ‘aplicar contenciosamente a lei a casos particulares", no dizer conhecido de Pedro Lessa. Acrescento, apenas: visando estabilizar o conflito através de uma solução de efeito pacificador. No contexto do que seja bem comum, não é possível afastar a exigência de uma convivência pacífica entre os indivíduos, situação a que o Estado está obrigado a garantir, quer aplicando fisicamente a lei, em o contraditório jurisdicional, função do Executivo, quer contenciosamente, modo pelo qual atua o Poder Judiciário.’

Mário Carlos Velloso, Ministro do Supremo Tribunal Federal, no trabalho "Princípios Constitucionais do Processo", escrito em memória do Ministro Carlos Coqueijo Torreão Costa, enfatiza que "Mauro Cappelletti e B. Garth acentuam que os países ocidentais têm-se não só se esforçado no sentido de afastar os óbices ao acesso à Justiça, como, também, procurado estimular esse acesso, proporcionando, principalmente, serviços jurídicos para os necessitados que, 'na maior parte das modernas sociedades, o auxílio de um advogado é essencial, senão indispensável para decifrar leis cada vez mais complexas e procedimentos misteriosos, necessários para ajuizar uma causa. Os métodos para proporcionar a assistência judiciária àqueles que não a podem custear são, por isso mesmo, vitais.” (Em nota de pé de página registra a fonte da citação: "Cappelletti, Mauro, Garth, B. Acesso à Justiça. Trad. de Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Sérgio Fabris, 1988, pág. 31-32).

Ao Estado não é permitido criar nenhuma barreira que dificulte o trânsito do cidadão ao Judiciário. Deve facilitar a atividade daqueles que procuram o órgão julgador, considerado, na atualidade, como a última trincheira a ser ocupada para que se possa , com o uso dos instrumentos que a compõem, solucionar os ataques aos direitos individuais e coletivos.

A garantia desse direito se constitui em forma expressiva de se valorizar a cidadania, fato que, em todas as civilizações, está sendo reconhecido como uma das grandes conquistas em benefício do homem a ser cultivada, de modo profundo, no próximo Século XXI.

Os fluidos dessas idéias levaram a Convenção Européia para Proteção dos Direitos Humanos e Liberdades Fundamentais a reconhecer, de modo explícito, no texto do art. 6º, § 1º, que a Justiça que não cumpre suas funções dentro de um prazo razoável é, para muitas pessoas, uma justiça inacessível.”

A arbitragem busca valorizar o princípio constitucional acima destacado. Ela, na atualidade brasileira, de acordo com o que dispõe a Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, preenche vazio cultural jurídico até então existente em nosso sistema processual. Caracteriza-se como instrumento processual constituído de princípios que se harmonizam com as exigências de desenvolvimento econômico, financeiro e social presentes neste final de Século XX, onde o tempo passou a ser fator considerado na realização dos negócios por exercer influência positiva ou negativa em seus resultados.

Dada a sua importância no cenário institucional processual, há de ser cultuada com intensa profundidade, a fim de se firmar uma cultura que leve os variados setores da sociedade a aceitá-la e nela confiar.

Com absoluta razão, a respeito da necessidade de ser criada uma cultura da arbitragem no País, as observações feitas por Cláudio Vianna de Lima,[16] em artigo publicado no Correio Braziliense, Caderno “Direito & Justiça”, de 27 de julho de 1998, no sentido de que:

“Até o advento da Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, a arbitragem foi, notoriamente, maltratada pelo Direito Positivo no Brasil. A conseqüência é a falta de uma prática do instituto e de uma “cultura arbitral” em nosso país. Não se acredita na arbitragem. Só se admite a justiça feita pelo Estado, nada obstante a crise universal, do Judiciário, a delonga das decisões judiciais, a injustiça manifesta que representam as decisões retardadas, a conseqüente inocuidade, na maioria das vezes, dessas sentenças e a impunidade freqüente de infrações penais.

Os ensinamentos colhidos no exterior sinalizam na direção de uma pesada campanha de marketing para mudanças de mentalidade geral e garantia de que, com a nova lei, se vá, efetivamente, alcançar a série de benéficos efeitos de arbitragem, à semelhança de outros países.

Assim, foi recomendado em recente encontro em Barcelona (designado Euramer), promovido pela Associação Ibero-Americana de Câmaras (ou associações) Comerciais - AICO, e se instituiu em encontros preparatórios e no próprio Congresso da Comissão Interamericana de Arbitragem Comercial - CIAC, organizado pela Associação Comercial do Rio de Janeiro, em maio de 1997.”

O fortalecimento da arbitragem, no Brasil, depende, unicamente, ao meu entender, da formação de uma cultura para a sua prática. Para tanto, há necessidade da divulgação dos propósitos da Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, enfatizando-se os seus princípios e regras nas Universidades, nos Sindicatos, nas Associações Comerciais, nas Associações de Bairros e demais órgãos públicos e privados da sociedade.

Há, também, de se educar a população para o atual estágio da denominada entrega da prestação jurisdicional, quando não mais se constitui privilégio absoluto do Estado a responsabilidade pelo seu manejo.

Há de se ter em consideração que os direitos e garantias fundamentais vistos na era contemporânea não podem receber interpretação idêntica a que se fazia em épocas passadas. Vivencia-se, na atualidade, uma transformação do modelo até então adotado para o Estado, buscando-se novas estruturas para o seu funcionamento.

O juízo arbitral, na forma concebida pela Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, não vai de encontro aos princípios da jurisdição única ou da inafastabilidade da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV), da essencialidade do juiz natural, com banimento do Juízo ou Tribunal de Exceção (CF, art. 5º, XXXVII ) e da ampla defesa (CF, art. 5º, LIV e LV).

Tais direitos e garantias são fundamentais para o cidadão . Eles continuam sendo respeitados pela arbitragem em sua total integridade, haja vista que ela é, apenas, caminho encontrado, com apoio na lei, pela vontade das partes, expressando com liberdade o seu querer, de solucionar os conflitos.

Não se pode deixar sem consideração que a solução dos conflitos é o objetivo maior a ser alcançado pelo Estado Brasileiro, conforme disposto está no Preâmbulo da Constituição Federal de 1988, ao assim dispor:

“Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e contemporânea, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.”

Ora, no preâmbulo da Constituição Federal de 1988, está a síntese dos objetivos fundamentais a serem alcançados pelo Estado Brasileiro, entre eles o de proporcionar aos administrados uma convivência baseada na harmonia social e na solução pacífica das controvérsias. Evidente que, em face de tal posicionamento do constituinte brasileiro, não se confiou, de modo exclusivo, ao Poder Judiciário, a entrega da prestação jurisdicional.

O art. 5º, inciso XXXV, da CF/88, ao dispor que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito” não invalida o disposto no art. 1º, da Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, ao determinar que “As pessoas capazes de contratar poderão valer-se de arbitragem para dirimir litígios relativos a direitos patrimoniais disponíveis.” No dispositivo em apreço há uma faculdade outorgada ao cidadão capaz de contratar e de dispor a respeito do seu patrimônio. Não consta qualquer impedimento do litígio deixar de ser apreciado pelo Poder Judiciário.

O artigo comentado respeita, conseqüentemente, a manifestação da vontade do cidadão, valorizando a sua dignidade humana, em face do que dispõe o art. 1º, incisos II e III, da Constituição Federal, cuja redação transcrevo:

“Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos:

I - ................;

II - a cidadania;

III - a dignidade da pessoa humana;

IV - ...............;

V - o pluralismo político.”

A solução dos conflitos por meios alternativos processuais, como é o caso da arbitragem, que atua, apenas, no campo patrimonial, constitui, portanto, um direito subjetivo fundamental do cidadão e que merece o apoio de toda a comunidade jurídica. Esse entendimento decorre da interpretação sistêmica da Constituição Federal, quando vincula-se à mensagem contida em seu preâmbulo, na parte que prega a harmonia social e a solução pacífica dos conflitos, com os arts. 1º, II e III, e 5º, inciso XXXV, da mesma Carta Magna.

Há plena liberdade do homem, em situação de conflito patrimonial, optar pela solução via arbitragem. Esta, por sua vez, se ofender, na sua prática, a quaisquer princípios garantidores dos direitos e garantias fundamentais do indivíduo, poderá ser anulada, pela via do Poder Judiciário, conforme dispõe o art. 33, da Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996.

A arbitragem, na forma instituída no Brasil, atende, conseqüentemente, aos propósitos fundamentais veiculados na Carta Magna e se aproxima dos anseios do povo de conviver com uma justiça rápida, segura, desburocratizada e de fácil acesso, especialmente, por não exigir maiores despesas financeiras.”

A minha convicção cada vez mais está fortalecida pela necessidade de se fazer aplicar, no Brasil, a arbitragem como meio de solução dos litígios, expandindo-a para o âmbito das controvérsias trabalhistas. Há necessidade, porém, que o Estado estimule a criação de órgãos arbitrais, facilitando o seu funcionamento e criando condições materiais para que cumpram a missão a que estão destinados.

5 – CONCLUSÕES:

Formulo, finalmente, alguns enunciados que, no trato do tema arbitragem, merecem ser sempre considerados, para que bem possa se compreender a sua evolução histórica e conceitual, especialmente, a sua estrutura atual no ordenamento jurídico nacional.

Os enunciados abaixo registrados são sínteses do que tenho como pacificadas a respeito da arbitragem no campo doutrinário.

Enunciado 1 - Um tribunal arbitral nunca age com plena independência perante a justiça estatal, em face de determinadas medidas estarem reservadas ao Poder Judiciário.

Enunciado 2 - Em regra, conforme legislação da maioria dos países, o tribunal arbitral não pode expedir medidas coercitivas. O nosso sistema segue essa linha: ver art. 22, § 4º, da Lei nº 9.307, de 23/09/96 “... havendo necessidade de medidas coercitivas ou cautelares, os árbitros poderão solicitá-las ao órgão do Poder Judiciário que seria, originariamente, competente para julgar a causa.”

Enunciado 3 - As partes, podem, contudo, quando acertarem o procedimento arbitral, permitir a adoção de medidas cautelares.

Enunciado 4 - A tendência moderna, em vários países, é seguir a Lei Modelo da United Nations Commission on International Trade Law (UNCITRAL), de 21/06/1985: Canadá, Chipre, Austrália, Bulgária, México, Escócia, Federação Russa, Peru, Nigéria, Tunísia, Hong Kong, Ucrânia, Hungria, Egito, Cingapura e vários Estados dos Estados Unidos incorporaram a Lei Modelo da UNCITRAL, na sua íntegra ou pelo menos em grande parte, na sua legislação interna.

Enunciado 5 - A Lei Modelo da UNCITRAL é aplicável, tão-somente, à arbitragem comercial internacional. Foi aprovada pela Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional, visando maior uniformidade para essa espécie de arbitragem.

Enunciado 6 - Os mentores da Lei nº 9.307, de 23/09/96, foram inspirados pelo trabalho elaborado pela UNCITRAL, sem se deixar de anotar que, também, receberam influências da Convenção de Nova Iorque de 10/06/1958 sobre o Reconhecimento e a Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras, como também a Convenção Interamericana sobre Arbitragem Comercial Internacional do Panamá de 30/01/1975, conforme anota Pedro Batista Martins, in Anotações sobre a Arbitragem no Brasil e o Projeto de Lei do Senado nº 78/92, Revista de Processo, 77;1995, pág. 58-59.

Enunciado 7 – O reconhecimento e execução de sentenças arbitrais estrangeiras, no Brasil, obedecem às regras seguintes:

- o tema é regulado pelos arts. 34 a 40, da Lei nº 9.307, de 23/09/1996;

- princípios a serem obedecidos: a) só será reconhecida e executada no Brasil se se apresentar conforme com os tratados internacionais com eficácia no ordenamento jurídico interno; b) na ausência de tratados só se estiverem de acordo com os termos da Lei nº 9.307, de 23/09/1996; 

- ser homologada pelo Supremo Tribunal Federal; 

- a homologação pelo STF obedece, no que couber, aos arts. 483 e 484, do CPC, e ao regimento Interno daquela Corte; 

-          há necessidade de ser requerida pela parte, em petição (art. 282, do CPC), acompanhada de: a) original da sentença arbitral ou cópia devidamente certificada, autenticada pelo consulado brasileiro e acompanhada de tradução oficial; b) - o original da convenção de arbitragem ou cópia devidamente certificada, acompanhada de tradução oficial. 

 

Enunciado 8 - A homologação de sentença estrangeira somente será negada se o réu comprovar:

- a incapacidade das partes em face do nosso C. Civil ou conforme fixado em tratados;

- invalidade da convenção da arbitragem segundo a lei à qual as partes a submeteram, ou, na falta de indicação, em virtude da lei do país onde a sentença arbitral foi proferida; 

- que não foi notificado da designação do árbitro ou do procedimento da arbitragem, ou tenha sido violado o princípio do contraditório, impossibilitando a ampla defesa; 

- que a sentença tenha extrapolado os limites da convenção e haja impossibilidade de se separar a parte excedente do que foi convencionado ser submetido ao procedimento de arbitragem; 

- a não obrigatoriedade, ainda, da sentença arbitral, ou que tenha sido anulada ou suspensa por órgão judicial do país onde a sentença arbitral foi prolatada; 

- que o objeto do litígio não é suscetível de ser resolvido por arbitragem; 

- que a decisão ofende a ordem pública nacional. 

Enunciado 9 - Se o vício formal existente for corrigido, novo pedido de homologação pode ser formulado.

Enunciado 10 – A Convenção Interamericana. O Dec. Legislativo nº 93/95 (DOU de 23/06/1995, pág. 9197), aprovou o texto da Convenção Interamericana sobre Eficácia Extraterritorial das Sentenças e Laudos Arbitrais Estrangeiros, concluído em Montevidéu, em 08/05/1970. O texto integral da convenção encontra-se publicado no Diário do Congresso Nacional (Seção II, de 23/06/1995).

Enunciado 11 - O Decreto nº 1476/95 (DOU de 03/05/1995, pág. 6153) promulgou o Tratado Relativo à Cooperação Judiciária e ao Reconhecimento e Execução de Sentenças em Matéria Civil, entre a República Federativa do Brasil e a República Italiana, de 17/10/1989. O procedimento para o reconhecimento, homologação e execução da sentença italiana no Brasil está previsto no Decreto nº 1476/95, arts. 18 a 21.

Enunciado 12 – A homologação de sentença estrangeira é atividade privativa do STF, sendo via de expressão da soberania( CF. art. 102, I, h. RISTF, arts. 217 a 224).

Enunciado 13 – A execução da sentença estrangeira obedece às linhas do art. 484, CPC - A execução far-se-á por carta de sentença, extraída dos autos da homologação e obedecerá às regras estabelecidas para a execução da sentença nacional da mesma natureza.

Enunciado 14 - É da justiça federal comum de primeiro grau a competência para a execução. CF, art. 109, X. Procedimento de homologação no STF. Ver arts. 215 a 224, do RISTF. 

Por fim, enumero os Tratados multilaterais mais importantes sobre a arbitragem privada . São:

1. - Protocolo de Genebra sobre Cláusulas Arbitrais de 24/09/1923 (Protocolo de Genebra). Ele reconhece a validade da cláusula compromissória como juridicamente válida quando a arbitragem for internacional. O Brasil ratificou-o em 22/03/1932, pelo Dec. nº 21.187, de 22/03/1932.

2. - Convenção de Genebra concernente à Execução de Laudos Arbitrais Estrangeiros de 26/09/1927. Cuidou da execução de laudos arbitrais estrangeiros e que foram elaborados conforme o Protocolo de Genebra sobre Cláusulas Arbitrais de 24/09/1923. O Brasil não o ratificou. 

3. - Convenção de Nova Iorque de 10/06/1958 sobre o Reconhecimento e Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras. Elaborada sob o patrocínio das Nações Unidas. Substituiu a Convenção de Genebra acima noticiada. Mais de cem países de todos os continentes. É o tratado multilateral mais significativo (Ratificado em 01/01/1995). 

4. - A Convenção Européia sobre Arbitragem Comercial Internacional de 10/04/1961 (Convenção de Genebra de 1961) destinava-se a facilitar o comércio entre os países da Europa Ocidental e do Leste Europeu. 

5. - A Convenção de Washington de 18/03/1965 para a Solução das Lides concernentes a Investimentos entre Estados e Nacionais de outros Estados levou à constituição do Centro Internacional para a Solução das Lides em Relação a Investimentos. 

6. - Convenção Interamericana sobre Arbitragem Comercial Internacional do Panamá de 30/01/1975 - ratificada pelo Brasil pelo Dec. nº 1.902, de 09/05/1996. 

7. - No Brasil, cumpre realçar a Convenção de Cooperação Judiciária, em Matéria Civil, Comercial, Trabalhista e Administrativa, celebrada com a França em 30/01/1981 e promulgada no país pelo Dec. nº 91.207, de 29/04/1985, aplicável, expressamente, à sentença arbitral, sendo esse aspecto de suma importância prática com relação aos laudos proferidos no âmbito da Câmara Internacional do Comércio de Paris (CCI), quando a sede do tribunal arbitral tem localização dentro do território da França.

 

O culto que a doutrina brasileira promove, na época contemporânea à arbitragem, decorre das transformações vividas pela cidadania brasileira. A sua consagração como meio alternativo de solução de conflitos deve ser considerada como passo importante para o aperfeiçoamento dos direitos do homem na busca de encontrar a paz com a solução dos seus conflitos.


[1] Sálvio de Figueiredo Teixeira, in “A arbitragem no Sistema Jurídico Brasileiro”, trabalho apresentado na obra coletiva “A Arbitragem na Era da Globalização”, coordenação de José Maria Rossini Garcez, Forense, pág. 25.

[2] O autor cita, na nota de rodapé de nº 2, o trabalho de Sidnei Agostinho Beneti, de onde extraiu a referência: “A arbitragem: Panorama e Evolução”, JTACSP, Lex, vol. 138, pág. 6.

[3] Em nota de rodapé, nº 3, esclarece o autor: “Sobre suas principais características e sucesso, por todos”, Beneti, ob. cit., págs. 10-11.

[4] Em nota de rodapé, a de nº 4, o autor esclarece: “Judicial Reform Roundtable II”, Williamsburg, Va., Estados Unidos, maio, 1996.

[5] Pedro A. Batista Martins, Prof. de Direito Comercial na Faculdade Cândido Mendes, in “Arbitragem Através dos Tempos. Obstáculos e Preconceitos à sua Implementação no Brasil”, artigo publicado na obra coletiva “A arbitragem na Era da Globalização”, já citada, págs. 35 e segs.

[6] Idem, pág. 36.

[7] Ibidem, pág. 37.

[8] José Maria Rossini Garcez, em trabalho intitulado “Arbitragem Internacional”, publicado na obra por ele coordenada “A Arbitragem na Era da Globalização”, Forense, págs. 162 e segs.

[9] José Maria Rossani Garcez, nas notas de rodapé de nºs 4 e 5, pág. 172, ob. cit., explicita: “O Prof. Guido F. S. Silva, na obra acima referida, comenta que a Comissão de Arbitragem da Câmara de Comércio Brasil-Canadá foi a primeira entidade tipicamente do gênero criada no Brasil, em 1978, na cidade de São Paulo, ficando aberta a qualquer pessoa interessada pela solução arbitral de seus litígios, de ordem interna ou internacional (inclusive, nas relações comerciais além Canadá).” A seguir, na nota 5: “Ob. cit. pág. 68. O Prof. Guido Soares acrescenta que os procedimentos arbitrais dessa Câmara fazem lembrar os mecanismos da CCI, adaptados às exigências à época de nosso Código de Processo Civil.”

[10] UNCITRAL – United Nations Comission for International Trade Law (Comissão das Nações Unidas para a Legislação Comercial Internacional)

[11] Essa lei modelo é conhecida como LEI-MODELO UNCITRAL.

[12] Em nota de rodapé, a de nº 7, pág. 173, José Maria Rossani Garcez, in art. já citado, registra: “O Prof. Pieter Sanders acrescenta em seu estudo que alguns Estados têm promulgado uma nova lei sobre arbitragem comercial internacional simplesmente copiando a Lei-Modelo ou seguindo-a em todos os seus termos, enquanto outros a tem adaptado com maior ou menor modificação. A lei de Chipre de 1987 reproduz praticamente os 36 artigos da Lei-Modelo, somente rearranjando os seis primeiros numa maneira diferente. O Estado norte-americano de Connecticut incorporou integralmente o texto da Lei-Modelo adicionando ao mesmo simplesmente um artigo, de nº 37, que dispõe: “Esta lei pode ser citada como o Modelo de Lei da Uncitral sobre arbitragem comercial internacional".

[13]O inteiro teor do Preâmbulo da CF: “Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.” Significativo o propósito do Constituinte, no preâmbulo, haver registrado que ... “para instituir um Estado democrático... fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias...”

[14] A história recente registra que a Lei nº 9.307, de 23 de setembro de 1996, teve origem no Projeto de Lei do Senado de nº 78, de 1992. Antes, três projetos tinham sido apresentados e foram arquivados. A aprovação da lei resultou de um movimento iniciado pela denominada operação Arbiter, comandada pelo Instituto Liberal de Pernambuco, tudo coordenado pelo Dr. Petrônio Muniz, advogado. O Projeto em referência foi apresentado pelo então Senador Marco Maciel. Contribuíram para o aperfeiçoamento do texto da Lei, valiosas sugestões, de juristas estudiosos do tema, incluindo-se os Drs. Carlos Alberto Camona e Pedro Batista Martins, bem como, a Dra. Selma M. Ferreira Lemes. O autor do projeto, na exposição de motivos, esclareceu que a proposta legislativa apresentada levava em conta diretrizes da comunidade internacional, especialmente as fixadas pela ONU na Lei-Modelo sobre Arbitragem Comercial Internacional formulada pela UNCITRAL.

[15] Responsabilidade do Estado pela Demora na Entrega da Prestação Jurisdicional. Este trabalho está publicado em várias revistas jurídicas.

[16] Cláudio Vianna de Lima, Desembargador aposentado do TJ/RN e membro da Comissão de Arbitragem da Associação Comercial do Rio de Janeiro.

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José Augusto Delgado – Advogado. Professor. Parecerista. Ministro aposentado do STJ. Ex-Ministro do TSE (mandato até abril de 2008). Especialista em Direito Civil. Professor de Direito Público (Administrativo, Tributário e Processual Civil). Professor UFRN (aposentado). Doutor HONORIS-CAUSA pela Universidade Estadual do Rio Grande do Norte. Doutor Honoris-Causa pela Universidade Potiguar. Titular da Cadeira n. 1 da Academia Brasileira de Direito Tributário (São Paulo). Acadêmico da Academia Brasileira de Letras Jurídicas. Acadêmico da Academia Norte-Riograndense do Norte. Integrante da Academia Tributária das Américas. Professor convidado dos Cursos de Pós-Graduação, área de Especialização, do Centro Universitário de Brasília. Ex-professor da Universidade Católica de Pernambuco. Sócio Honorário da Academia Brasileira de Direito Tributário. Sócio Benemérito do Instituto Nacional de Direito Público. Conselheiro Consultivo do Conselho Nacional das Instituições de Mediação e Arbitragem. Integrante do Grupo Brasileiro da Sociedade Internacional do Direito Penal Militar e Direito Humanitário. Sócio Honorário do Instituto Brasileiro de Estudos Jurídicos. Sócio Fundador do Instituto de Direito Privado (São Paulo). Integrante do Instituto dos Advogados do Distrito Federal.

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